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Mineração: Desafio Socioambiental e Oportunidade Econômica e Geopolítica
05/06/2025
Fonte: Fundação FHC - https://fundacaofhc.org.br/debate/mineracao-desafio-socioambiental-e-oportunidade-eco
Mineração: Desafio Socioambiental e Oportunidade Econômica e Geopolítica
Promovido pela Fundação FHC e pelo IBRAM, o debate discutiu como os desafios socioambientais, as oportunidades econômicas e as dinâmicas geopolíticas estão moldando os caminhos da mineração do futuro.
05 de junho de 2025
"A questão climática trouxe a mineração para um outro patamar e, pela primeira vez, o setor de mineração passa a ter importância na agenda climática mundial. Com importantes reservas de minerais estratégicos para a descarbonização, o Brasil tem a oportunidade de sair do green wishing (desejo de se tornar verde, em tradução livre) e se tornar um player importante nesse processo vital para o futuro do planeta. Não se avança na transição energética sem o setor de mineração na sala", disse a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira no primeiro painel deste seminário realizado pela Fundação Fernando Henrique Cardoso em parceria com o IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração).
Co-Chair do Painel Internacional de Recursos Naturais da ONU Meio Ambiente (IRP/UNEP), Teixeira disse que, se o Brasil souber explorar suas reservas de minerais estratégicos e críticos de maneira sustentável, com respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos das comunidades impactadas, pode contribuir significativamente para a "segurança mineral de um mundo em transição". Outro importante desafio será desenvolver uma nova indústria nacional que agregue valor a esses minérios raros, ou continuaremos a ser somente exportadores de commodities.
Segundo Izabella, membro do Conselho da Fundação FHC, é preciso construir urgentemente uma governança do setor de mineração brasileiro. "Temos um Ministério das Minas e Energia míope, que só fala de energia e quase nada de mineração. Para atingir seu potencial, a mineração brasileira necessita avançar 50 anos em 5 anos. Será fundamental conectar as agendas (ambiental, climática e de desenvolvimento socioeconômico), assim como as cadeias produtivas e consumidoras globais."
"Estamos no início da era dos minerais de terras raras, críticos e estratégicos. O interesse recente das grandes potências por esses minerais nos coloca no topo da nova geopolítica mundial. A disputa por garantir o acesso a esses minerais deve se intensificar nos próximos anos, mas o Brasil, embora tenha importantes reservas, não está preparado para aproveitar as oportunidades que surgirão", disse o ex-ministro da Defesa Raul Jungmann.
Raul Jungmann, Lígia Pinto e Christianne Canavero em debate na Fundação FHC -
Foto: Vinicius Doti
Os minerais estratégicos e críticos são essenciais para a transição energética porque são insumos indispensáveis para a produção de equipamentos necessários à descarbonização, como baterias para veículos elétricos, turbinas eólicas e painéis solares. Minerais como lítio, níquel, cobalto, manganês, grafite e terras raras são cruciais para o desempenho e durabilidade de baterias, ímãs permanentes e outras aplicações. Além disso, o cobre e o alumínio são usados em larga escala em linhas de transmissão de energia. Eles também são considerados essenciais para as indústrias de tecnologia, defesa e para a agricultura (potássio).
Já os minerais de terras raras são minerais que contêm um ou mais elementos das terras raras, um grupo de 17 elementos químicos que inclui os lantanídeos (do lantânio ao lutécio), o escândio e o ítrio. Apesar do nome, eles não são necessariamente raros na natureza, mas sim difíceis de serem encontrados em concentrações economicamente viáveis para extração.
O Brasil possui importantes reservas de nióbio, ferro, alumínio, cobre, grafite, manganês, ouro e urânio. Além dessas, o país também possui reservas significativas de lítio, cobalto e níquel, assim como de monazita (no grupo das terras raras).
"O potencial é enorme, mas atualmente a diversidade da produção mineral brasileira é muito limitada. Quase 60% das nossas exportações são de ferro. Produzimos poucos minerais críticos estratégicos para a segurança alimentar, a transição energética, a inovação tecnológica e a defesa", disse Jungmann.
Passaporte para o futuro ou para o passado?
"A exploração desses minerais pode ser um passaporte para o futuro ou para o passado, porque se decidirmos exportá-los apenas como matéria prima, sem o devido processamento industrial e tecnológico, voltaremos aos tempos coloniais", afirmou Jungmann, que atualmente preside o IBRAM. O Projeto de Lei 2780/2024, que institui a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos, está em tramitação na Câmara dos Deputados.
De acordo com Jungmann, o país não conhece seu verdadeiro potencial geológico: "Apesar de nossa história colonial ser fortemente vinculada à exploração do ouro, o Brasil independente nunca deu a devida atenção à dimensão e ao potencial da mineração exercida de maneira legal. O Serviço Geológico Brasileiro tem apenas 27% do território mapeado. A Agência Nacional de Mineração só foi criada em 2017, 25 anos depois das primeiras agências reguladoras. Não tem orçamento, recuros humanos nem infraestrutura para dar conta do desafio que temos pela frente."
O IBRAM (fundado em 1976) está produzindo o Primeiro Censo Mineral do Brasil: "O que é o setor mineral brasileiro? Atualmente apenas três empresas mineradoras estão listadas na B3 (Bolsa do Brasil, sediada em São Paulo), enquanto a Bolsa de Valores de Toronto (Canadá) tem 42 empresas listadas. Cerca de 80% da produção mineral brasileira é feita por multinacionais e não existe um financiamento adequado ao setor de mineração no país. Os bancos brasileiros não conhecem as especificidades e as necessidades da atividade mineradora", disse o ex-ministro.
O debate "Mineração: Desafio Socioambiental e Oportunidade Econômica e Geopolítica" faz parte do ciclo Meio Ambiente e Desenvolvimento, um dos pilares da atuação da Fundação FHC. Além de Izabella Teixeira e Raul Jungmann, participaram três executivas de empresas do setor de mineração e dois ambientalistas com larga experiência na Amazônia. Do diálogo entre os participantes, pode-se concluir que a mineração feita dentro de padrões elevados de sustentabilidade socioambiental pode ser uma aliada da preservação da Floresta Amazônica.
Izabella Teixeira em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Empresa brasileira explora nióbio há 70 anos em Araxá (MG)
A CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração), fundada em 1955, é líder mundial na produção de nióbio e busca desenvolver toda a cadeia produtiva de maneira integrada em um só lugar, a cidade mineira de Araxá, onde tem 2.000 funcionários.
"Tradicionalmente o nióbio é utilizado para melhorar a qualidade das ligas de aço, tornando-as mais resistentes e duráveis, com aplicações em setores como as indústrias eólica, aeroespacial, médica e eletrônica. Atualmente o ferro nióbio é o carro-chefe da nossa produção, chegando a quase 80% das vendas", disse Christianne Canavero, Head de ESG, Responsabilidade Social e Relações com a Comunidade na CBMM.
"Mas o óxido de nióbio, que também produzimos, está sendo cada vez mais demandado mundialmente para a produção de baterias de veículos elétricos. Recentemente testamos em nossa fábrica uma bateria para ônibus elétrico que carrega cem por cento em apenas dez minutos. Quando chega ao ponto final, o ônibus está pronto para reiniciar o trajeto em questão de minutos", disse a engenheira química.
Controlada pelo Grupo Moreira Salles, a CBMM tem 15% do capital nas mãos de um consórcio japonês e sul-coreano e outros 15% com um grupo de empresas chinesas. Da planta da CBMM em Araxá, saem 80% do nióbio produzido no mundo. A empresa comercializa para mais de 50 países . A China e outros países da Ásia são os maiores mercados consumidores.
"O Brasil tem muitas reservas de nióbio e já é protagonista deste mercado no mundo. Os 70 anos de história da CBMM, e o seu compromisso com o meio ambiente e a comunidade local em Araxá, são bons exemplos de como o país e a sociedade podem se beneficiar da exploração sustentável e profissional de suas reservas de minerais estratégicos", disse Canavero. A empresa tem o compromisso de zerar suas emissões de CO2 até 2040.
Lígia Pinto, Christianne Canavero e Izabella Teixeira em debate na Fundação FHC -
Foto: Vinicius Doti
Sigma Lithium fez Brasil sair do zero para se tornar 5o produtor mundial de lítio
"Não é pouca coisa. A empresa foi fundada em 2011, mas a produção de lítio em escala comercial começou em 2023 e já passamos na frente da Itália e do Canadá, que estão no mercado há mais tempo", disse Lígia Pinto, vice-presidente de Relações Institucionais, Governamentais e de Comunicação da Sigma Lithium.
Entrante no mercado de extração e processamento de lítio no Brasil, a Sigma produz atualmente 260 mil toneladas de concentrado de lítio por ano nos municípios de Araçuaí e Itinga, no Vale do Jequitinhonha (MG). Com a construção de uma nova planta, orçada em R$ 486,7 milhões e financiada pelo Novo Fundo Clima do BNDES, a meta é chegar a 600 mil toneladas em um ano.
O concentrado de lítio, ou minério de lítio, é usado principalmente na produção de baterias de íon-lítio, utilizadas em dispositivos eletrônicos e veículos elétricos, entre outras aplicações. "A demanda é crescente, mas nosso plano de negócio não visa o curto prazo nem grandes ganhos ou picos. O objetivo é de fato construir uma empresa brasileira de lítio, proposta alinhada ao plano do governo federal de desenvolvimento de uma indústria verde cada vez mais sólida no país", disse Lígia.
A Sigma ainda não realiza a segunda etapa do refino do lítio, que acontece na China. O minério é crucial para a produção de baterias de veículos elétricos, mercado também dominado pela China atualmente: "Existe um gargalo geopolítico."
De acordo com Lígia, a Sigma tem como meta produzir lítio "quíntuplo zero": sem emissão de carbono, sem barragens de rejeitos, sem uso de água potável, sem uso de produtos químicos tóxicos e com uso de energia renovável. "Existe lítio garimpado de maneira artesanal no mercado global, mas nosso diferencial é que somos cem por cento auditáveis, respeitamos o meio ambiente, os direitos trabalhistas e os direitos humanos das comunidades do Jequitinhonha", concluiu.
"O Vale do Jequitinhonha é culturalmente rico e diverso. Temos comunidades indígenas, quilombolas e buscamos um diálogo permanente com elas. Parte da nossa mão-de-obra, sobretudo os engenheiros, vêm de outras partes do país, mas mais de 85% da nossa mão-de-obra é originária do próprio Vale, após passarem por cursos de formação oferecidos pela empresa."
Lígia Pinto e Christianne Canavero em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Vale utiliza a mineração legal para manter a Floresta Amazônica em pé
"No Mosaico de Carajás, a exploração de minérios pela Vale ocupa apenas 3% de uma área de 800.000 hectares, sendo que todo o restante do território abriga florestas nacionais, unidades de conservação, parques e terras indígenas. A gestão e conservação deste enorme patrimônio é feita pela Vale em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
A Vale atua na Amazônia há cerca de 40 anos e 60% de sua produção de minério de ferro sai da região. "Os rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho fizeram com que a Vale se transformasse. Na Amazônia, não temos barragens e utilizamos várias técnicas para reduzir a quantidade de rejeitos. Buscamos desenvolver o conceito de mineração circular, em que tudo o que é gerado como resultado do processo de mineração possa ter valor econômico e não seja simplesmente descartado", disse Camilla Lott, vice-presidente Executiva Interina de Sustentabilidade da Vale.
"É possível compatibilizar a mineração industrial e a preservação do meio ambiente. Carajás é um exemplo de como usar a força da mineração legal para manter a floresta em pé. Fazemos isso em rede com os povos que lá vivem e as organizações. Para nós, é interessante que o território seja ocupado e organizado. A Amazônia é importante para a Vale e vice-versa."
Amazônia vive momento crítico com avanço da ilegalidade e do crime organizado
"Onde não há alternativas econômicas viáveis, as atividades ilegais prosperam. Na Amazônia, o que era informal se tornou ilegal e criminoso. Diante do avanço do crime organizado, cada vez mais imbricado com o garimpo ilegal e a grilagem de terras, todas as atividades econômicas legais encontram cenário adverso. É muito difícil desenvolver negócios legais e sustentáveis na Amazônia", disse Beto Veríssimo, cofundador do Imazon.
"A Amazônia brasileira é formada por nove estados e mais de 600 municípios. Há muitas amazônias diferentes, com problemas, necessidades e interesses diversos, e é fundamental formar uma aliança com todos os setores que se propõem a atuar legalmente, de maneira sustentável, incluindo a mineração industrial, cujos impostos e royalties podem gerar melhorias sociais, se bem utilizados", disse o coordenador da iniciativa Amazônia 2030.
Veríssimo também criticou a ausência de um projeto nacional para a Amazônia: "O Brasil não tem um projeto nacional para a Amazônia, não tem uma agenda de desenvolvimento real e factível. E nos estados e municípios da região as forças progressistas estão perdendo espaço político, com graves consequências para a agenda sustentável."
Segundo o pesquisador, diferentemente de outras partes do país, a região amazônica ainda vive uma fase de bônus demográfico, com muitos jovens entrando em idade produtiva. "A década de ouro será a partir de 2030, mas a Amazônia não tem hoje uma economia capaz de absorver esses jovens. O resultado é que eles estão sendo cooptados pelo crime organizado e o bônus está virando ônus", disse Veríssimo, que atualmente é diretor do Índice de Progresso Social (IPS Brasil), que pretende fazer um retrato da situação social em 200 municípios estratégicos do país, com 57 indicadores.
Márcio Santilli em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Flexibilização da Lei Ambiental e mineração em terras indígenas são ameaças
"A regulamentação da mineração em terras indígenas está prevista na Constituição de 1988, mas não foi feita pelo Congresso desde então e é um bode na sala que ameaça a Amazônia, assim como o projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental", disse Márcio Santilli, presidente do Instituto Socioambiental (ISA) e ex-presidente da Funai.
Em maio deste ano, as comissões de Meio Ambiente (CMA) e de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovaram, por votação simbólica, o PL 2.159/2021 que cria novo marco para o licenciamento ambiental no Brasil, com a flexibilização de regras para empreendimentos com impactos sobre o meio ambiente.O texto deve ser votado no plenário do Senado e, se aprovado, volta para análise da Câmara dos Deputados.
"O Congresso Nacional tem se mostrado incapaz de fazer a mediação política necessária para chegar a um consenso razoável sobre estas e outras questões que impactam a Amazônia e o Brasil como um todo. Em tese, seria possível avançar rumo a um consenso, como já ocorreu no passado em relação a outros temas. Mas ninguém acredita na capacidade do Congresso de conduzir esse processo e, no final, tudo vai parar no Supremo Tribunal Federal", afirmou Santilli.
O ambientalista propôs um pacto nacional envolvendo os setores público, privado e o terceiro setor para a defesa e preservação da Amazônia: "O problema é que não há atualmente espaço político e institucional para discutir essas questões profundamente. Se o país fecha os olhos para as atividades predatórias, não é a sustentabilidade que vai vencer. As atividades ilegais são muito mais baratas e rentáveis."
Faça o download gratuito do artigo "O cenário do crime organizado e dos mercados ilícitos no bioma amazônico", escrito por Leandro Piquet Carneiro e Adriano Bastos Rosas (série Conexão América Latina, publicada pela Plataforma Democrática e Fundação FHC).
Saiba mais:
A um ano da COP30, quais são os desafios fundamentais?
Meio ambiente e desenvolvimento: as oportunidades da descarbonização e como aproveitá-las
Mineração na Amazônia: desafios do desenvolvimento sustentável
Otávio Dias é editor de conteúdo da Fundação FHC. Jornalista especializado em política e assuntos internacionais, foi correspondente da Folha em Londres e editor do site esta
https://fundacaofhc.org.br/debate/mineracao-desafio-socioambiental-e-oportunidade-economica-e-geopolitica/
Promovido pela Fundação FHC e pelo IBRAM, o debate discutiu como os desafios socioambientais, as oportunidades econômicas e as dinâmicas geopolíticas estão moldando os caminhos da mineração do futuro.
05 de junho de 2025
"A questão climática trouxe a mineração para um outro patamar e, pela primeira vez, o setor de mineração passa a ter importância na agenda climática mundial. Com importantes reservas de minerais estratégicos para a descarbonização, o Brasil tem a oportunidade de sair do green wishing (desejo de se tornar verde, em tradução livre) e se tornar um player importante nesse processo vital para o futuro do planeta. Não se avança na transição energética sem o setor de mineração na sala", disse a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira no primeiro painel deste seminário realizado pela Fundação Fernando Henrique Cardoso em parceria com o IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração).
Co-Chair do Painel Internacional de Recursos Naturais da ONU Meio Ambiente (IRP/UNEP), Teixeira disse que, se o Brasil souber explorar suas reservas de minerais estratégicos e críticos de maneira sustentável, com respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos das comunidades impactadas, pode contribuir significativamente para a "segurança mineral de um mundo em transição". Outro importante desafio será desenvolver uma nova indústria nacional que agregue valor a esses minérios raros, ou continuaremos a ser somente exportadores de commodities.
Segundo Izabella, membro do Conselho da Fundação FHC, é preciso construir urgentemente uma governança do setor de mineração brasileiro. "Temos um Ministério das Minas e Energia míope, que só fala de energia e quase nada de mineração. Para atingir seu potencial, a mineração brasileira necessita avançar 50 anos em 5 anos. Será fundamental conectar as agendas (ambiental, climática e de desenvolvimento socioeconômico), assim como as cadeias produtivas e consumidoras globais."
"Estamos no início da era dos minerais de terras raras, críticos e estratégicos. O interesse recente das grandes potências por esses minerais nos coloca no topo da nova geopolítica mundial. A disputa por garantir o acesso a esses minerais deve se intensificar nos próximos anos, mas o Brasil, embora tenha importantes reservas, não está preparado para aproveitar as oportunidades que surgirão", disse o ex-ministro da Defesa Raul Jungmann.
Raul Jungmann, Lígia Pinto e Christianne Canavero em debate na Fundação FHC -
Foto: Vinicius Doti
Os minerais estratégicos e críticos são essenciais para a transição energética porque são insumos indispensáveis para a produção de equipamentos necessários à descarbonização, como baterias para veículos elétricos, turbinas eólicas e painéis solares. Minerais como lítio, níquel, cobalto, manganês, grafite e terras raras são cruciais para o desempenho e durabilidade de baterias, ímãs permanentes e outras aplicações. Além disso, o cobre e o alumínio são usados em larga escala em linhas de transmissão de energia. Eles também são considerados essenciais para as indústrias de tecnologia, defesa e para a agricultura (potássio).
Já os minerais de terras raras são minerais que contêm um ou mais elementos das terras raras, um grupo de 17 elementos químicos que inclui os lantanídeos (do lantânio ao lutécio), o escândio e o ítrio. Apesar do nome, eles não são necessariamente raros na natureza, mas sim difíceis de serem encontrados em concentrações economicamente viáveis para extração.
O Brasil possui importantes reservas de nióbio, ferro, alumínio, cobre, grafite, manganês, ouro e urânio. Além dessas, o país também possui reservas significativas de lítio, cobalto e níquel, assim como de monazita (no grupo das terras raras).
"O potencial é enorme, mas atualmente a diversidade da produção mineral brasileira é muito limitada. Quase 60% das nossas exportações são de ferro. Produzimos poucos minerais críticos estratégicos para a segurança alimentar, a transição energética, a inovação tecnológica e a defesa", disse Jungmann.
Passaporte para o futuro ou para o passado?
"A exploração desses minerais pode ser um passaporte para o futuro ou para o passado, porque se decidirmos exportá-los apenas como matéria prima, sem o devido processamento industrial e tecnológico, voltaremos aos tempos coloniais", afirmou Jungmann, que atualmente preside o IBRAM. O Projeto de Lei 2780/2024, que institui a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos, está em tramitação na Câmara dos Deputados.
De acordo com Jungmann, o país não conhece seu verdadeiro potencial geológico: "Apesar de nossa história colonial ser fortemente vinculada à exploração do ouro, o Brasil independente nunca deu a devida atenção à dimensão e ao potencial da mineração exercida de maneira legal. O Serviço Geológico Brasileiro tem apenas 27% do território mapeado. A Agência Nacional de Mineração só foi criada em 2017, 25 anos depois das primeiras agências reguladoras. Não tem orçamento, recuros humanos nem infraestrutura para dar conta do desafio que temos pela frente."
O IBRAM (fundado em 1976) está produzindo o Primeiro Censo Mineral do Brasil: "O que é o setor mineral brasileiro? Atualmente apenas três empresas mineradoras estão listadas na B3 (Bolsa do Brasil, sediada em São Paulo), enquanto a Bolsa de Valores de Toronto (Canadá) tem 42 empresas listadas. Cerca de 80% da produção mineral brasileira é feita por multinacionais e não existe um financiamento adequado ao setor de mineração no país. Os bancos brasileiros não conhecem as especificidades e as necessidades da atividade mineradora", disse o ex-ministro.
O debate "Mineração: Desafio Socioambiental e Oportunidade Econômica e Geopolítica" faz parte do ciclo Meio Ambiente e Desenvolvimento, um dos pilares da atuação da Fundação FHC. Além de Izabella Teixeira e Raul Jungmann, participaram três executivas de empresas do setor de mineração e dois ambientalistas com larga experiência na Amazônia. Do diálogo entre os participantes, pode-se concluir que a mineração feita dentro de padrões elevados de sustentabilidade socioambiental pode ser uma aliada da preservação da Floresta Amazônica.
Izabella Teixeira em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Empresa brasileira explora nióbio há 70 anos em Araxá (MG)
A CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração), fundada em 1955, é líder mundial na produção de nióbio e busca desenvolver toda a cadeia produtiva de maneira integrada em um só lugar, a cidade mineira de Araxá, onde tem 2.000 funcionários.
"Tradicionalmente o nióbio é utilizado para melhorar a qualidade das ligas de aço, tornando-as mais resistentes e duráveis, com aplicações em setores como as indústrias eólica, aeroespacial, médica e eletrônica. Atualmente o ferro nióbio é o carro-chefe da nossa produção, chegando a quase 80% das vendas", disse Christianne Canavero, Head de ESG, Responsabilidade Social e Relações com a Comunidade na CBMM.
"Mas o óxido de nióbio, que também produzimos, está sendo cada vez mais demandado mundialmente para a produção de baterias de veículos elétricos. Recentemente testamos em nossa fábrica uma bateria para ônibus elétrico que carrega cem por cento em apenas dez minutos. Quando chega ao ponto final, o ônibus está pronto para reiniciar o trajeto em questão de minutos", disse a engenheira química.
Controlada pelo Grupo Moreira Salles, a CBMM tem 15% do capital nas mãos de um consórcio japonês e sul-coreano e outros 15% com um grupo de empresas chinesas. Da planta da CBMM em Araxá, saem 80% do nióbio produzido no mundo. A empresa comercializa para mais de 50 países . A China e outros países da Ásia são os maiores mercados consumidores.
"O Brasil tem muitas reservas de nióbio e já é protagonista deste mercado no mundo. Os 70 anos de história da CBMM, e o seu compromisso com o meio ambiente e a comunidade local em Araxá, são bons exemplos de como o país e a sociedade podem se beneficiar da exploração sustentável e profissional de suas reservas de minerais estratégicos", disse Canavero. A empresa tem o compromisso de zerar suas emissões de CO2 até 2040.
Lígia Pinto, Christianne Canavero e Izabella Teixeira em debate na Fundação FHC -
Foto: Vinicius Doti
Sigma Lithium fez Brasil sair do zero para se tornar 5o produtor mundial de lítio
"Não é pouca coisa. A empresa foi fundada em 2011, mas a produção de lítio em escala comercial começou em 2023 e já passamos na frente da Itália e do Canadá, que estão no mercado há mais tempo", disse Lígia Pinto, vice-presidente de Relações Institucionais, Governamentais e de Comunicação da Sigma Lithium.
Entrante no mercado de extração e processamento de lítio no Brasil, a Sigma produz atualmente 260 mil toneladas de concentrado de lítio por ano nos municípios de Araçuaí e Itinga, no Vale do Jequitinhonha (MG). Com a construção de uma nova planta, orçada em R$ 486,7 milhões e financiada pelo Novo Fundo Clima do BNDES, a meta é chegar a 600 mil toneladas em um ano.
O concentrado de lítio, ou minério de lítio, é usado principalmente na produção de baterias de íon-lítio, utilizadas em dispositivos eletrônicos e veículos elétricos, entre outras aplicações. "A demanda é crescente, mas nosso plano de negócio não visa o curto prazo nem grandes ganhos ou picos. O objetivo é de fato construir uma empresa brasileira de lítio, proposta alinhada ao plano do governo federal de desenvolvimento de uma indústria verde cada vez mais sólida no país", disse Lígia.
A Sigma ainda não realiza a segunda etapa do refino do lítio, que acontece na China. O minério é crucial para a produção de baterias de veículos elétricos, mercado também dominado pela China atualmente: "Existe um gargalo geopolítico."
De acordo com Lígia, a Sigma tem como meta produzir lítio "quíntuplo zero": sem emissão de carbono, sem barragens de rejeitos, sem uso de água potável, sem uso de produtos químicos tóxicos e com uso de energia renovável. "Existe lítio garimpado de maneira artesanal no mercado global, mas nosso diferencial é que somos cem por cento auditáveis, respeitamos o meio ambiente, os direitos trabalhistas e os direitos humanos das comunidades do Jequitinhonha", concluiu.
"O Vale do Jequitinhonha é culturalmente rico e diverso. Temos comunidades indígenas, quilombolas e buscamos um diálogo permanente com elas. Parte da nossa mão-de-obra, sobretudo os engenheiros, vêm de outras partes do país, mas mais de 85% da nossa mão-de-obra é originária do próprio Vale, após passarem por cursos de formação oferecidos pela empresa."
Lígia Pinto e Christianne Canavero em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Vale utiliza a mineração legal para manter a Floresta Amazônica em pé
"No Mosaico de Carajás, a exploração de minérios pela Vale ocupa apenas 3% de uma área de 800.000 hectares, sendo que todo o restante do território abriga florestas nacionais, unidades de conservação, parques e terras indígenas. A gestão e conservação deste enorme patrimônio é feita pela Vale em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
A Vale atua na Amazônia há cerca de 40 anos e 60% de sua produção de minério de ferro sai da região. "Os rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho fizeram com que a Vale se transformasse. Na Amazônia, não temos barragens e utilizamos várias técnicas para reduzir a quantidade de rejeitos. Buscamos desenvolver o conceito de mineração circular, em que tudo o que é gerado como resultado do processo de mineração possa ter valor econômico e não seja simplesmente descartado", disse Camilla Lott, vice-presidente Executiva Interina de Sustentabilidade da Vale.
"É possível compatibilizar a mineração industrial e a preservação do meio ambiente. Carajás é um exemplo de como usar a força da mineração legal para manter a floresta em pé. Fazemos isso em rede com os povos que lá vivem e as organizações. Para nós, é interessante que o território seja ocupado e organizado. A Amazônia é importante para a Vale e vice-versa."
Amazônia vive momento crítico com avanço da ilegalidade e do crime organizado
"Onde não há alternativas econômicas viáveis, as atividades ilegais prosperam. Na Amazônia, o que era informal se tornou ilegal e criminoso. Diante do avanço do crime organizado, cada vez mais imbricado com o garimpo ilegal e a grilagem de terras, todas as atividades econômicas legais encontram cenário adverso. É muito difícil desenvolver negócios legais e sustentáveis na Amazônia", disse Beto Veríssimo, cofundador do Imazon.
"A Amazônia brasileira é formada por nove estados e mais de 600 municípios. Há muitas amazônias diferentes, com problemas, necessidades e interesses diversos, e é fundamental formar uma aliança com todos os setores que se propõem a atuar legalmente, de maneira sustentável, incluindo a mineração industrial, cujos impostos e royalties podem gerar melhorias sociais, se bem utilizados", disse o coordenador da iniciativa Amazônia 2030.
Veríssimo também criticou a ausência de um projeto nacional para a Amazônia: "O Brasil não tem um projeto nacional para a Amazônia, não tem uma agenda de desenvolvimento real e factível. E nos estados e municípios da região as forças progressistas estão perdendo espaço político, com graves consequências para a agenda sustentável."
Segundo o pesquisador, diferentemente de outras partes do país, a região amazônica ainda vive uma fase de bônus demográfico, com muitos jovens entrando em idade produtiva. "A década de ouro será a partir de 2030, mas a Amazônia não tem hoje uma economia capaz de absorver esses jovens. O resultado é que eles estão sendo cooptados pelo crime organizado e o bônus está virando ônus", disse Veríssimo, que atualmente é diretor do Índice de Progresso Social (IPS Brasil), que pretende fazer um retrato da situação social em 200 municípios estratégicos do país, com 57 indicadores.
Márcio Santilli em debate na Fundação FHC - Foto: Vinicius Doti
Flexibilização da Lei Ambiental e mineração em terras indígenas são ameaças
"A regulamentação da mineração em terras indígenas está prevista na Constituição de 1988, mas não foi feita pelo Congresso desde então e é um bode na sala que ameaça a Amazônia, assim como o projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental", disse Márcio Santilli, presidente do Instituto Socioambiental (ISA) e ex-presidente da Funai.
Em maio deste ano, as comissões de Meio Ambiente (CMA) e de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovaram, por votação simbólica, o PL 2.159/2021 que cria novo marco para o licenciamento ambiental no Brasil, com a flexibilização de regras para empreendimentos com impactos sobre o meio ambiente.O texto deve ser votado no plenário do Senado e, se aprovado, volta para análise da Câmara dos Deputados.
"O Congresso Nacional tem se mostrado incapaz de fazer a mediação política necessária para chegar a um consenso razoável sobre estas e outras questões que impactam a Amazônia e o Brasil como um todo. Em tese, seria possível avançar rumo a um consenso, como já ocorreu no passado em relação a outros temas. Mas ninguém acredita na capacidade do Congresso de conduzir esse processo e, no final, tudo vai parar no Supremo Tribunal Federal", afirmou Santilli.
O ambientalista propôs um pacto nacional envolvendo os setores público, privado e o terceiro setor para a defesa e preservação da Amazônia: "O problema é que não há atualmente espaço político e institucional para discutir essas questões profundamente. Se o país fecha os olhos para as atividades predatórias, não é a sustentabilidade que vai vencer. As atividades ilegais são muito mais baratas e rentáveis."
Faça o download gratuito do artigo "O cenário do crime organizado e dos mercados ilícitos no bioma amazônico", escrito por Leandro Piquet Carneiro e Adriano Bastos Rosas (série Conexão América Latina, publicada pela Plataforma Democrática e Fundação FHC).
Saiba mais:
A um ano da COP30, quais são os desafios fundamentais?
Meio ambiente e desenvolvimento: as oportunidades da descarbonização e como aproveitá-las
Mineração na Amazônia: desafios do desenvolvimento sustentável
Otávio Dias é editor de conteúdo da Fundação FHC. Jornalista especializado em política e assuntos internacionais, foi correspondente da Folha em Londres e editor do site esta
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