De Pueblos Indígenas en Brasil
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Noticias
PLs do Congresso podem legalizar mineração em territórios indígenas
04/09/2025
Autor: Felipe Medeiros
Fonte: Amazonia Real - https://amazoniareal.com.br
Boa Vista (RR) - Os Yanomami afetados por invasores enfrentam da fome ao crime organizado em seus territórios. De suas matas invadidas e destruídas por garimpeiros ao mercúrio despejado nos rios. Agora, uma nova e avassaladora ameaça se consolida, porém a quilômetros de distância. Em Brasília, um parlamento majoritariamente anti-ambiental avança com projetos de lei (PLs) que legalizam a mineração e outras atividades em Terras Indígenas (TI).
"Nossa cultura não permite destruir a mãe natureza. Não se pode vender a mãe", diz o vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), Dário Kopenawa, filho do grande xamã Davi Kopenawa. Se aprovados, projetos de lei em tramitação no Congresso vão abrir as TIs para a mineração legalizada, passando por cima da vontade das lideranças indígenas. "É como se estivessem nos dizendo que nossos territórios valem, mas apenas para destruí-los, não para respeitá-los", afirma Mariazinha Baré, coordenadora da Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (Apiam).
A HAY e a Apiam não estão sozinhas. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) lutam para que os PLs pró-mineração sejam arquivados ou considerados inconstitucionais.
Em 20 de agosto, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado aprovou o PL 1.331 com parecer favorável da presidente, Damares Alves (PL-DF). De autoria de Mecias de Jesus (Republicanos-RR), o texto "dispõe sobre a pesquisa e a lavra de recursos minerais em terras indígenas homologadas ou em processo de demarcação". Parlamentares de oposição manifestaram preocupação com a aprovação. O texto está desde 27 de agosto na Comissão de Meio Ambiente aguardando designação de um relator.
A senadora Damares Alves foi ministra do ex-presidente Jair Bolsonaro (que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado). O réu na Ação Penal 2668 nunca escondeu sua vontade de liberar a mineração na Amazônia. A própria CDH, em 13 de agosto, já havia aprovado, após parecer favorável do relator, senador Márcio Bittar (União Brasil-AC), o PL 6.050. Derivado da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Não Governamentais (ONGs), este projeto de lei viabiliza "atividades econômicas em terras indígenas" de forma geral, incluindo atividade de mineração industrial.
O PL 6.050/2023 está sob relatoria do senador Jaime Bagattoli (PL-SC) na Comissão de Serviços e Infraestrutura. Em seguida, a matéria deve passar pelas comissões de Meio Ambiente e de Constituição, Justiça e Cidadania. Depois de serem validados, os dois PLs pró-mineração serão votados em plenário e, se aprovados, seguem para sanção presidencial.
Com as duas matérias, os parlamentares querem legalizar a atividade garimpeira já em curso, exploração minerária industrial, pesquisa, permitir extração de petróleo e gás, construção de hidrelétricas e até o ecoturismo - tudo sem consulta prévia às comunidades tradicionais. A mineração em terra indígena, conforme a Constituição, só é permitida com autorização do Congresso, desde que haja consulta aos povos.
Para Toya Manchineri, coordenador-geral da Coiab, os projetos "vão contra os direitos territoriais indígenas estabelecidos na Constituição e o direito ao consentimento prévio, livre e informado [convenção 169 da OIT]". Mariazinha Baré é taxativa ao dizer que as matérias dos parlamentares pró-mineração abrem "brecha legal para atividades que ameaçam profundamente os territórios".
Para organizações indígenas e juristas, os projetos têm o objetivo de enfraquecer as garantias constitucionais. Esses políticos insistem no discurso de que a regulamentação dessas atividades pode trazer desenvolvimento econômico e segurança jurídica mas, na prática, segundo a oposição e lideranças, causará impactos sociais e ambientais irreversíveis. "Não pedimos regulamentação. Nossa luta é pela proteção da terra, da água e dos parentes", disse Dário Kopenawa.
Não é de hoje que tentativas de autoridades públicas, sejam governos ou parlamentares, tentam abrir os territórios indígenas para a atividade minerária. Entre as alegações dadas é que a mineração, entre eles o garimpo ilegal, já ocorre dentro desses territórios, e é preciso legalizar a atividade. Os exemplos da extração ilegal de ouro nos territórios Yanomami, em Roraima, e Munduruku, no Pará, são os mais conhecidos. Mas a mineração das grandes indústrias, com exploração de potássio, no Amazonas, e de gás e petróleo, no Amapá, também é outra reivindicação que há anos transita entre os políticos.
Ameaças reais
Os PLs que mais preocupam as lideranças indígenas são justamente aqueles que têm maior probabilidade de avançar no Congresso por pressões políticas e interesses econômicos: a exploração de petróleo na foz do Amazonas, a mineração da Potássio do Brasil no território Mura e a atividade minerária nas terras do povo Cinta Larga.
Em julho de 2025, representantes do povo Cinta Larga, de Rondônia e Mato Grosso, participaram de reuniões técnicas em Porto Velho, convocadas pelo STF, para preparar uma escuta inédita às comunidades indígenas sobre a possibilidade de mineração em uma faixa de 10 quilômetros no entorno da TI Roosevelt, onde há forte pressão do garimpo ilegal de diamantes e ouro. A decisão tomada pelo ministro Flávio Dino busca ouvir os indígenas nas aldeias antes de qualquer definição. A disputa judicial sobre a exploração mineral na região se arrasta desde 2005.
A empresa Potássio do Brasil se articula em todas as frentes, no Legislativo e Judiciário, para iniciar suas atividades na comunidade Lago do Soares. A pressão dos empresários, com apoio de políticos do Amazonas, causou divisão entre os Mura, com uma ala do povo favorável.
Para Caroline Nogueira, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), que presta assessoria jurídica aos indígenas Mura, contrários à mineração, há "um lobby no Parlamento para que se regulamente" a exploração mineral. A mestre em Direito Ambiental destaca que desde os 1990 existe essa pressão. "A Amazônia é vista como uma das últimas fronteiras do capital da América Latina", diz a defensora. "Há muito interesse em diversos aspectos de bens naturais, madeireiros, mineração, recursos hídricos, terras", diz Caroline Nogueira, que em 2024, por apoiar os Mura, foi ameaçada de sofrer uma retaliação da então reitoria da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
Mariazinha Baré destaca que uma exploração de ouro e outros minérios legalizada pode aumentar significativamente na Amazônia o uso do mercúrio, usado para extração do metal, e causar sérios impactos. "É um dos problemas mais urgentes, pois causa doenças e leva à morte dos peixes que são a principal fonte de alimentação."
Dário Kopenawa, além de seu povo (Yanomami), menciona, assim como Mariazinha, os Munduruku e Kayapó como os mais afetados e prejudicados pela mineração e outras explorações ilegais já existentes. "E também tem madeireiros, agronegócio. É uma situação muito preocupante."
Oposição no Congresso
O deputado Chico Alencar (PSol-RJ), que integra as comissões da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, criticou os projetos pró-mineração em tramitação no Congresso. À Amazônia Real, ele disse que apesar do chamado "PL da Devastação" ter sofrido uma "redução de danos" com os vetos do presidente Lula (PT), "eles têm maioria".
"A ofensiva não para", admitiu Chico Alencar. "Eles estão, inclusive nas diferentes comissões do Senado e da Câmara, querendo garantir mineração em terras indígenas. Eles são incansáveis no seu afã ganancioso de sugar tudo que a terra brasileira dá generosamente."
O PL 1.331 impõe uma lógica empresarial sobre territórios indígenas. Promete compensações financeiras que variam de 2% a 4% do faturamento bruto do minério e a possibilidade de contratar indígenas como mão de obra. Para Mariazinha Baré, a proposta fere o direito constitucional ao usufruto exclusivo dos recursos, descaracteriza o regime especial de proteção. "Nos empurra para dentro de um modelo que nunca foi o nosso", disse. "Quem realmente vai ser beneficiado serão os grandes empresários do ouro, políticos aliados ao setor e redes criminosas que já controlam a mineração ilegal."
Mecias de Jesus faz uma interpretação distorcida de notícias, estudos e pesquisas. "Merece destaque o relatório da HAY (Hutukara Associação Yanomami) que descreve relatos de indígenas que deixaram de cultivar os próprios alimentos e passaram a trabalhar como carregadores para os garimpeiros em busca de dinheiro ou ouro, para comprar comida nas cantinas dos acampamentos de garimpo", cita o documento do senador.
Dário classificou o texto como uma "justificativa mal feita" e enfatiza que o senador "não deveria usar o nome da Hutukara" para tal propósito. Ele reitera que a organização se dedica à "proteção do seu território" e o senador nunca procurou a HAY, mesmo diante da crise humanitária em um momento mais crítico.
A liderança da Apiam, Mariazinha Baré, aponta como preocupante um projeto como este sair de um senador de um estado da região Norte. "Isso mostra um completo descompromisso com os povos originários e com a Amazônia. O que esperamos de representantes da nossa região é que defendam o direito dos povos indígenas que são garantidos na constituição e não que coloquem nossos territórios à disposição de interesses econômicos que só trazem violência, doença e morte", afirmou.
Dário Kopenawa denuncia que a proposta do senador Mecias "vai matar o povo Yanomami". Segundo ele, abrirá caminho para mais mortes, violência, prostituição, drogas e contaminação. "É uma porta de entrada para o sangue do nosso povo". O vice-presidente da HAY ressalta também que o ouro extraído ilegalmente segue para países como China, Suíça e Inglaterra. "O ouro não fica no Brasil. É um sistema internacional de exploração criminosa".
"Genocídio não se legisla. Resistiremos em todas as frentes", afirmou a Coiab, em nota técnica. As análises sobre os PLs, 1.331 e 6.050, alertam que as propostas abrem espaço para a remoção compulsória de comunidades em favor de interesses políticos e econômicos. Segundo a organização trata-se de uma violação direta ao artigo 231 (assegura os direitos históricos dos povos indígenas sobre seus territórios de ocupação tradicional) da Constituição e a tratados internacionais de proteção aos povos originários.
Sem salvaguardas
Proposto durante o governo Bolsonaro, o PL 191/2020 visava autorizar mineração, hidrelétricas, exploração de petróleo e gás, além de agronegócio em larga escala em terras indígenas. A matéria foi retirada de tramitação em maio de 2023, após forte crítica de organizações indígenas com pareceres que apontavam sua inconstitucionalidade e um pedido do presidente Lula ao Congresso.
Não satisfeitos, a base pró-mineração do Congresso reaproveitou conceitos do sepultado PL no texto do PL 6.050. Segundo nota técnica da Apib, é a tentativa de revogar proteções históricas às terras indígenas. O projeto propõe eliminar a proibição expressa de mineração em Terras Indígenas, prevista na Lei 7.805/1989, além de alterar dispositivos do Estatuto dos Povos Indígenas (Lei 6.001/1973), que ainda permanecem em vigor em várias de suas disposições, enfraquecendo marcos legais fundamentais.
Para Toya Manchineri, que também é membro do Comitê Indígena de Mudanças Climáticas (CIMC), esse desenho é perigoso. "Se este PL (6.050) avançar, não há garantias nem salvaguardas. As comunidades ficam vulneráveis à violências já conhecidas, desmatamento, contaminação por mercúrio, exploração sexual, insegurança alimentar", disse.
Dário se preocupa porque, conforme o monitoramento da HAY, "o garimpo não acabou". Helicópteros e barcos continuam entrando em regiões como Mucajaí, Catrimani, Apiaú, Papiú e Uraricoera. Ele destaca a divisão de esforços em meio ao debate dos PLs pró-mineração. Segundo ele, as matérias no Senado são "porta de entrada para o sangue Yanomami".
A Apib divulgou nota alertando que os projetos "representam riscos graves com desdobramentos prejudiciais à vida dos povos indígenas", além de serem inconstitucionais, "violam o direito à integridade física e cultural das comunidades" permitindo a exploração de terceiros nos territórios.
Contradição
Mariazinha Baré descreveu o atual cenário como "uma profunda contradição". Ela explica que, enquanto projetos abrem territórios indígenas à mineração e exploração avançam com rapidez, os processos que reconhecem e protegem os direitos territoriais enfrentam bloqueios constantes e lentidão. "É um golpe nos nossos direitos. É preciso denunciar esse desequilíbrio e lutar para que nossos territórios sejam protegidos, não vendidos."
A resistência indígena se articula na pressão ao parlamentares, mas também em outras frentes. No Judiciário, ações já foram levadas ao Ministério Público Federal e às instâncias internacionais. "Estamos recorrendo à ONU [Organização das Nações Unidas], à OEA [Organização dos Estados Americanos] e à Justiça brasileira para denunciar a violação dos nossos direitos. Se esse projeto avançar, vamos ocupar espaços de decisão e mostrar que não aceitaremos a legalização da destruição dos nossos territórios", afirmou Mariazinha Baré.
O que dizem os políticos
O senador Mecias de Jesus foi questionado, via assessoria de imprensa, sobre os motivos para a criação e defesa do PL 1331 e se em algum momento dialogou com a Hutukara. A reportagem não teve retorno até a publicação desta reportagem.
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) reconheceu, em nota enviada à reportagem, os riscos dos dois projetos. "É importante que o Congresso Nacional respeite a consulta aos povos indígenas durante a tramitação das propostas e que aprove legislações alinhadas à proteção do meio ambiente e dos direitos indígenas e de outros povos e comunidades tradicionais". O MPI não informou quais e se tomará medidas para barrar os dois projetos.
https://amazoniareal.com.br/pls-pro-mineracao/
"Nossa cultura não permite destruir a mãe natureza. Não se pode vender a mãe", diz o vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), Dário Kopenawa, filho do grande xamã Davi Kopenawa. Se aprovados, projetos de lei em tramitação no Congresso vão abrir as TIs para a mineração legalizada, passando por cima da vontade das lideranças indígenas. "É como se estivessem nos dizendo que nossos territórios valem, mas apenas para destruí-los, não para respeitá-los", afirma Mariazinha Baré, coordenadora da Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (Apiam).
A HAY e a Apiam não estão sozinhas. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) lutam para que os PLs pró-mineração sejam arquivados ou considerados inconstitucionais.
Em 20 de agosto, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado aprovou o PL 1.331 com parecer favorável da presidente, Damares Alves (PL-DF). De autoria de Mecias de Jesus (Republicanos-RR), o texto "dispõe sobre a pesquisa e a lavra de recursos minerais em terras indígenas homologadas ou em processo de demarcação". Parlamentares de oposição manifestaram preocupação com a aprovação. O texto está desde 27 de agosto na Comissão de Meio Ambiente aguardando designação de um relator.
A senadora Damares Alves foi ministra do ex-presidente Jair Bolsonaro (que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado). O réu na Ação Penal 2668 nunca escondeu sua vontade de liberar a mineração na Amazônia. A própria CDH, em 13 de agosto, já havia aprovado, após parecer favorável do relator, senador Márcio Bittar (União Brasil-AC), o PL 6.050. Derivado da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Não Governamentais (ONGs), este projeto de lei viabiliza "atividades econômicas em terras indígenas" de forma geral, incluindo atividade de mineração industrial.
O PL 6.050/2023 está sob relatoria do senador Jaime Bagattoli (PL-SC) na Comissão de Serviços e Infraestrutura. Em seguida, a matéria deve passar pelas comissões de Meio Ambiente e de Constituição, Justiça e Cidadania. Depois de serem validados, os dois PLs pró-mineração serão votados em plenário e, se aprovados, seguem para sanção presidencial.
Com as duas matérias, os parlamentares querem legalizar a atividade garimpeira já em curso, exploração minerária industrial, pesquisa, permitir extração de petróleo e gás, construção de hidrelétricas e até o ecoturismo - tudo sem consulta prévia às comunidades tradicionais. A mineração em terra indígena, conforme a Constituição, só é permitida com autorização do Congresso, desde que haja consulta aos povos.
Para Toya Manchineri, coordenador-geral da Coiab, os projetos "vão contra os direitos territoriais indígenas estabelecidos na Constituição e o direito ao consentimento prévio, livre e informado [convenção 169 da OIT]". Mariazinha Baré é taxativa ao dizer que as matérias dos parlamentares pró-mineração abrem "brecha legal para atividades que ameaçam profundamente os territórios".
Para organizações indígenas e juristas, os projetos têm o objetivo de enfraquecer as garantias constitucionais. Esses políticos insistem no discurso de que a regulamentação dessas atividades pode trazer desenvolvimento econômico e segurança jurídica mas, na prática, segundo a oposição e lideranças, causará impactos sociais e ambientais irreversíveis. "Não pedimos regulamentação. Nossa luta é pela proteção da terra, da água e dos parentes", disse Dário Kopenawa.
Não é de hoje que tentativas de autoridades públicas, sejam governos ou parlamentares, tentam abrir os territórios indígenas para a atividade minerária. Entre as alegações dadas é que a mineração, entre eles o garimpo ilegal, já ocorre dentro desses territórios, e é preciso legalizar a atividade. Os exemplos da extração ilegal de ouro nos territórios Yanomami, em Roraima, e Munduruku, no Pará, são os mais conhecidos. Mas a mineração das grandes indústrias, com exploração de potássio, no Amazonas, e de gás e petróleo, no Amapá, também é outra reivindicação que há anos transita entre os políticos.
Ameaças reais
Os PLs que mais preocupam as lideranças indígenas são justamente aqueles que têm maior probabilidade de avançar no Congresso por pressões políticas e interesses econômicos: a exploração de petróleo na foz do Amazonas, a mineração da Potássio do Brasil no território Mura e a atividade minerária nas terras do povo Cinta Larga.
Em julho de 2025, representantes do povo Cinta Larga, de Rondônia e Mato Grosso, participaram de reuniões técnicas em Porto Velho, convocadas pelo STF, para preparar uma escuta inédita às comunidades indígenas sobre a possibilidade de mineração em uma faixa de 10 quilômetros no entorno da TI Roosevelt, onde há forte pressão do garimpo ilegal de diamantes e ouro. A decisão tomada pelo ministro Flávio Dino busca ouvir os indígenas nas aldeias antes de qualquer definição. A disputa judicial sobre a exploração mineral na região se arrasta desde 2005.
A empresa Potássio do Brasil se articula em todas as frentes, no Legislativo e Judiciário, para iniciar suas atividades na comunidade Lago do Soares. A pressão dos empresários, com apoio de políticos do Amazonas, causou divisão entre os Mura, com uma ala do povo favorável.
Para Caroline Nogueira, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), que presta assessoria jurídica aos indígenas Mura, contrários à mineração, há "um lobby no Parlamento para que se regulamente" a exploração mineral. A mestre em Direito Ambiental destaca que desde os 1990 existe essa pressão. "A Amazônia é vista como uma das últimas fronteiras do capital da América Latina", diz a defensora. "Há muito interesse em diversos aspectos de bens naturais, madeireiros, mineração, recursos hídricos, terras", diz Caroline Nogueira, que em 2024, por apoiar os Mura, foi ameaçada de sofrer uma retaliação da então reitoria da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
Mariazinha Baré destaca que uma exploração de ouro e outros minérios legalizada pode aumentar significativamente na Amazônia o uso do mercúrio, usado para extração do metal, e causar sérios impactos. "É um dos problemas mais urgentes, pois causa doenças e leva à morte dos peixes que são a principal fonte de alimentação."
Dário Kopenawa, além de seu povo (Yanomami), menciona, assim como Mariazinha, os Munduruku e Kayapó como os mais afetados e prejudicados pela mineração e outras explorações ilegais já existentes. "E também tem madeireiros, agronegócio. É uma situação muito preocupante."
Oposição no Congresso
O deputado Chico Alencar (PSol-RJ), que integra as comissões da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, criticou os projetos pró-mineração em tramitação no Congresso. À Amazônia Real, ele disse que apesar do chamado "PL da Devastação" ter sofrido uma "redução de danos" com os vetos do presidente Lula (PT), "eles têm maioria".
"A ofensiva não para", admitiu Chico Alencar. "Eles estão, inclusive nas diferentes comissões do Senado e da Câmara, querendo garantir mineração em terras indígenas. Eles são incansáveis no seu afã ganancioso de sugar tudo que a terra brasileira dá generosamente."
O PL 1.331 impõe uma lógica empresarial sobre territórios indígenas. Promete compensações financeiras que variam de 2% a 4% do faturamento bruto do minério e a possibilidade de contratar indígenas como mão de obra. Para Mariazinha Baré, a proposta fere o direito constitucional ao usufruto exclusivo dos recursos, descaracteriza o regime especial de proteção. "Nos empurra para dentro de um modelo que nunca foi o nosso", disse. "Quem realmente vai ser beneficiado serão os grandes empresários do ouro, políticos aliados ao setor e redes criminosas que já controlam a mineração ilegal."
Mecias de Jesus faz uma interpretação distorcida de notícias, estudos e pesquisas. "Merece destaque o relatório da HAY (Hutukara Associação Yanomami) que descreve relatos de indígenas que deixaram de cultivar os próprios alimentos e passaram a trabalhar como carregadores para os garimpeiros em busca de dinheiro ou ouro, para comprar comida nas cantinas dos acampamentos de garimpo", cita o documento do senador.
Dário classificou o texto como uma "justificativa mal feita" e enfatiza que o senador "não deveria usar o nome da Hutukara" para tal propósito. Ele reitera que a organização se dedica à "proteção do seu território" e o senador nunca procurou a HAY, mesmo diante da crise humanitária em um momento mais crítico.
A liderança da Apiam, Mariazinha Baré, aponta como preocupante um projeto como este sair de um senador de um estado da região Norte. "Isso mostra um completo descompromisso com os povos originários e com a Amazônia. O que esperamos de representantes da nossa região é que defendam o direito dos povos indígenas que são garantidos na constituição e não que coloquem nossos territórios à disposição de interesses econômicos que só trazem violência, doença e morte", afirmou.
Dário Kopenawa denuncia que a proposta do senador Mecias "vai matar o povo Yanomami". Segundo ele, abrirá caminho para mais mortes, violência, prostituição, drogas e contaminação. "É uma porta de entrada para o sangue do nosso povo". O vice-presidente da HAY ressalta também que o ouro extraído ilegalmente segue para países como China, Suíça e Inglaterra. "O ouro não fica no Brasil. É um sistema internacional de exploração criminosa".
"Genocídio não se legisla. Resistiremos em todas as frentes", afirmou a Coiab, em nota técnica. As análises sobre os PLs, 1.331 e 6.050, alertam que as propostas abrem espaço para a remoção compulsória de comunidades em favor de interesses políticos e econômicos. Segundo a organização trata-se de uma violação direta ao artigo 231 (assegura os direitos históricos dos povos indígenas sobre seus territórios de ocupação tradicional) da Constituição e a tratados internacionais de proteção aos povos originários.
Sem salvaguardas
Proposto durante o governo Bolsonaro, o PL 191/2020 visava autorizar mineração, hidrelétricas, exploração de petróleo e gás, além de agronegócio em larga escala em terras indígenas. A matéria foi retirada de tramitação em maio de 2023, após forte crítica de organizações indígenas com pareceres que apontavam sua inconstitucionalidade e um pedido do presidente Lula ao Congresso.
Não satisfeitos, a base pró-mineração do Congresso reaproveitou conceitos do sepultado PL no texto do PL 6.050. Segundo nota técnica da Apib, é a tentativa de revogar proteções históricas às terras indígenas. O projeto propõe eliminar a proibição expressa de mineração em Terras Indígenas, prevista na Lei 7.805/1989, além de alterar dispositivos do Estatuto dos Povos Indígenas (Lei 6.001/1973), que ainda permanecem em vigor em várias de suas disposições, enfraquecendo marcos legais fundamentais.
Para Toya Manchineri, que também é membro do Comitê Indígena de Mudanças Climáticas (CIMC), esse desenho é perigoso. "Se este PL (6.050) avançar, não há garantias nem salvaguardas. As comunidades ficam vulneráveis à violências já conhecidas, desmatamento, contaminação por mercúrio, exploração sexual, insegurança alimentar", disse.
Dário se preocupa porque, conforme o monitoramento da HAY, "o garimpo não acabou". Helicópteros e barcos continuam entrando em regiões como Mucajaí, Catrimani, Apiaú, Papiú e Uraricoera. Ele destaca a divisão de esforços em meio ao debate dos PLs pró-mineração. Segundo ele, as matérias no Senado são "porta de entrada para o sangue Yanomami".
A Apib divulgou nota alertando que os projetos "representam riscos graves com desdobramentos prejudiciais à vida dos povos indígenas", além de serem inconstitucionais, "violam o direito à integridade física e cultural das comunidades" permitindo a exploração de terceiros nos territórios.
Contradição
Mariazinha Baré descreveu o atual cenário como "uma profunda contradição". Ela explica que, enquanto projetos abrem territórios indígenas à mineração e exploração avançam com rapidez, os processos que reconhecem e protegem os direitos territoriais enfrentam bloqueios constantes e lentidão. "É um golpe nos nossos direitos. É preciso denunciar esse desequilíbrio e lutar para que nossos territórios sejam protegidos, não vendidos."
A resistência indígena se articula na pressão ao parlamentares, mas também em outras frentes. No Judiciário, ações já foram levadas ao Ministério Público Federal e às instâncias internacionais. "Estamos recorrendo à ONU [Organização das Nações Unidas], à OEA [Organização dos Estados Americanos] e à Justiça brasileira para denunciar a violação dos nossos direitos. Se esse projeto avançar, vamos ocupar espaços de decisão e mostrar que não aceitaremos a legalização da destruição dos nossos territórios", afirmou Mariazinha Baré.
O que dizem os políticos
O senador Mecias de Jesus foi questionado, via assessoria de imprensa, sobre os motivos para a criação e defesa do PL 1331 e se em algum momento dialogou com a Hutukara. A reportagem não teve retorno até a publicação desta reportagem.
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) reconheceu, em nota enviada à reportagem, os riscos dos dois projetos. "É importante que o Congresso Nacional respeite a consulta aos povos indígenas durante a tramitação das propostas e que aprove legislações alinhadas à proteção do meio ambiente e dos direitos indígenas e de outros povos e comunidades tradicionais". O MPI não informou quais e se tomará medidas para barrar os dois projetos.
https://amazoniareal.com.br/pls-pro-mineracao/
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