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A MORTE DAS ÁGUAS NO OESTE DA BAHIA

06/12/2024

Fonte: CPT - cptnacional.org.br



"É possível caminhar pelo fundo dos rios que morreram, eles ficam secos o ano todinho. Só se vê água neles quando escorre por cima em dias de chuva. Acabou as chuvas, tornam a secar novamente"

Por Comunicação CPT Bahia

O resultado de um trabalho de mapeamento realizado a muitas mãos, ao longo de 2023 e 2024, nas sub-bacias hidrográficas dos rios Corrente e Carinhanha, identificou 3.050 trechos de águas já secos, entre córregos, riachos, nascentes e cabeceiras de rios, num total de 7.120 km de extensão de águas mortas. Foram mapeados trechos do alto e médio Corrente contemplando os rios Guará, do Meio, Santo Antônio, Correntina, Arrojado e Formoso; e as sub-bacias do rio Carinhanha, na margem esquerda, na Bahia, contemplando os rios Riacho do Meio e Itaguari. Estes pequenos cursos d'água ligados um ao outro alcançariam uma distância equivalente à distância entre Brasil e México.

Além das águas mortas, o mapa apresenta outros 580 trechos de águas classificadas como em estado crítico, o que corresponde a 3.837 km de extensão, com destaque às grandes calhas dos rios das bacias apresentadas no mapa. Consta também uma legenda com identificação de trechos de áreas desmatadas, pivôs centrais, piscinões e outras informações complementares. As comunidades testemunham que todas as águas identificadas passaram a secar a partir da década de 1980, cerca de 15 anos após a instalação dos primeiros projetos de "desenvolvimento" na região, com o desmatamento de grandes áreas para plantio de pinus e eucalipto nos Cerrados do Oeste.

As bacias dos rios Corrente e Carinhanha estão localizadas na região Oeste da Bahia, nas fronteiras do estado, e no extremo norte de Minas Gerais. Estas bacias resguardam um vasto patrimônio hídrico e a riqueza socioambiental da região, incluindo diferentes ecossistemas e paisagens de Cerrado, manchas de florestas e fragmentos de Caatinga, campos úmidos, veredas, riachos, compondo importantes áreas de recarga que alimentam grandes aquíferos subterrâneos, como o Urucuia e o Bambuí, responsáveis pela segurança hídrica desta e de outras regiões do Brasil. Sua morfologia é marcada por duas principais formações de relevo - as áreas de chapadões e os vales - por onde inúmeras comunidades camponesas e tradicionais desenvolvem historicamente seu modo de vida, sempre integrado às águas e à vegetação nativa.

A base de sua economia é pautada na agricultura familiar, com a produção de alimentos nas veredas, no fundo dos vales, ou no sequeiro; no extrativismo, através da coleta da grande variedade de frutos e plantas medicinais nativas; e na criação tradicional e coletiva de animais nos chamados Gerais, onde é comum o manejo de animais à solta, como caprinos e bovinos, em meio ao Cerrado preservado. Todas essas atividades dependem e prezam o uso sustentável dos Cerrados e de suas águas, e têm garantido historicamente a soberania e segurança alimentares das comunidades que ali vivem e trabalham.

Esses modos de vida tradicionais têm encontrado no agronegócio, na grilagem de terras e na instalação de barragens e empreendimentos semelhantes, um palco de conflitos e violências, marcado pelo avanço do desmatamento e pela apropriação abusiva e contaminação das águas. Investimentos em infraestrutura, logística e estímulo das políticas governamentais e agentes do grande capital agrário têm focado na produção e exportação, em grandes monocultivos, de soja, milho, batata, algodão e produção em larga escala de leite e carne bovina. Esta dinâmica tem resultado no esgotamento das águas das bacias, destruição de vegetação nativa, assoreamento de corpos d'água, alteração dos ciclos das chuvas, erosão e contaminação de águas e solos por agrotóxicos.

POR QUE AS ÁGUAS ESTÃO MORRENDO?
O Oeste da Bahia é considerado pelo Estado brasileiro como um polo nacional de agricultura irrigada, sendo uma das últimas fronteiras agrícolas do Brasil. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), o agronegócio consome 78.3% da água no país. Nas últimas três décadas, os latifúndios vêm se expandindo de forma avassaladora sobre o Cerrado do Oeste baiano, utilizando método de captação de água em larga escala, tais como piscinões e pivôs centrais, negligenciando as dinâmicas de recarga dos aquíferos e o cotidiano de vida dos povos e comunidades que ali vivem.

Grande parte dessa água é controlada por agentes do agronegócio da região representados em entidades como a Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (AIBA) e a Associação Baiana dos Produtores de Algodão (ABAPA). Seus associados conseguem com facilidade outorgas de água concedidas pelo Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos - INEMA, do governo estadual. Segundo dados do INEMA levantados pela Agência Pública, 1,8 bilhão de litros de água por dia é o que o estado da Bahia concedeu em outorgas a mais de duas dezenas de diretores e conselheiros da AIBA e da ABAPA e a familiares e empresas ligadas a eles no ano de 2021.

Um único CPF detém a maior autorização para captação de água, com 466,8 milhões de litros por dia. Considerando que a média de consumo de um brasileiro, segundo o Sistema Nacional de Informações sobre o Saneamento - SNIS, é de 148 litros por dia, somente esta outorga abasteceria a população de 97 Correntinas, 226 Coribes e 340 Jaborandis, municípios situados dentro da área mapeada.

Diante desse cenário, moradores e entidades populares passaram a denunciar a situação dos rios, riachos e veredas perdidas. "Como pode o rio que banhou sua vida e de seus antepassados secar diante de seus próprios olhos?". Desse clamor e alerta veio a necessidade de mapear a situação das águas para servir como instrumento de denúncia e de mobilização de uma rede de vigilância popular das águas nas referidas bacias.

O PROCESSO DE MAPEAMENTO

A Pastoral do Meio Ambiente - PMA, a Comissão Pastoral da Terra - CPT e os pesquisadores Thiago Damas, da Universidade Federal Fluminense - UFF, e Eduardo Barcelos, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano, campus Valença - IFBaiano / Valença, em parceria com diversas organizações da região e as comunidades, articularam oficinas de mapeamento nos municípios da área mapeada e visitas in loco nas comunidades, garantido uma ampla representatividade dos diferentes grupos sociais, com a participação de pessoas de diversas faixas etárias, gêneros, etnias e modos de vida.

Foi utilizado como base um mapa hidrográfico virgem da área, elaborado em programa de geoprocessamento a partir de arquivos shapefile, com informações da ANA e do Cadastro Ambiental Rural - CAR. Ao realizar a sobreposição desses shapes, chegou-se a um grande nível de detalhamento das águas que foi prontamente identificado pelos participantes que realizaram o reconhecimento das águas no mapa virgem (com auxílio de imagens de satélite quando necessário), visitas a áreas e intervenções desenhadas, utilizando cores e construindo legendas para o diagnóstico das águas.Os dados coletados durante as atividades de mapeamento foram sistematizados com o apoio dos pesquisadores em programas de geoprocessamento, prezando as informações coletadas e indicadas pelas comunidades nas oficinas e visitas. Além dos desenhos indicados nos mapas, os relatos foram muito importantes para a formulação de verbetes e informações adicionais no layoutdo mapa.

https://www.cptnacional.org.br/publicacoes-2/noticias-2/7002-a-morte-das-aguas-no-oeste-da-bahia
 

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