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Povos tradicionais sentem efeitos do clima e querem ter voz na COP
09/05/2025
Fonte: Valor Econômico - https://valor.globo.com/brasil/
Povos tradicionais sentem efeitos do clima e querem ter voz na COP
Ministra Sonia Guajajara quer inscrever número recorde de indígenas para que tenham acesso à área de discussão na conferência de Belém
09/05/2025
Carin Petti
Com presença confirmada na COP30, a conferência do clima da ONU em Belém, em novembro, os líderes indígenas Kleber Karipuna e Angela Kaxuyana e também a representante de comunidades extrativistas Letícia Moraes sentem na pele os efeitos das mudanças climáticas. Há mais de seis meses, o rio está seco no território indígena Kaxuyana Tunayana, no extremo norte do Pará. "Nunca houve estiagens tão extremas, o que aumentou nossa insegurança alimentar", conta Ângela Kaxuyana, nascida ali e representante da Bacia Amazônica na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). "Sem chuva, cresceu a quantidade de crianças com diarreia e desnutrição por conta da troca do peixe e dos alimentos da roça por produtos industrializados."
Em terras do Oiapoque, no Amapá, é a mandioca que tem faltado nos últimos anos. "A culpa é de uma praga que surgiu com o aumento das temperaturas e a escassez de chuvas", afirma Kleber Karipuna, da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
A 600 quilômetros dali, comunidades extrativistas do município de Curralinho, na Ilha de Marajó, enfrentam, dependendo da estação, enchentes ou incêndios. "Estou com medo da chegada do verão", diz Letícia Moraes, vice-presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), a organização à qual pertenceu Chico Mendes. Segundo ela, com o calor cada vez maior, dispara focos de incêndio, que comprometem a produção de alimentos e reduzem em até 40% a renda das famílias que vivem da venda de produtos da floresta, como açaí e biojoias feitas com sementes.
Na COP30, o CNS faz parte da Comissão Internacional. A Apib e a Coiab integram a Comissão Internacional Indígena. Ambas estão no chamado Círculo dos Povos da conferência, grupo comandado pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) com o objetivo de ampliar a representação de indígenas, comunidades tradicionais e afrodescendentes na conferência do clima.
"As comissões vão trazer seus debates, temas e as contribuições para os documentos que serão discutidos ali no espaço dos negociadores", diz a ministra Sonia Guajajara, do MPI.
Segundo ela, a meta é conseguir o credenciamento recorde de mil indígenas - metade deles do Brasil - para ter acesso à zona azul da COP, reservada às negociações oficiais.
No topo das demandas das três organizações estão a demarcação e a regulamentação de territórios. "Já é reconhecido em nível global que demarcar terras indígenas e áreas de conservação, assim como titular territórios quilombolas, é uma política concreta e efetiva de enfrentamento à crise climática", diz Karipuna. Ela defende o direcionamento dos recursos a fundos geridos pela população beneficiada.
O raciocínio de Moraes é semelhante. "Áreas com titulação coletiva de territórios extrativistas são zonas conservadas, o que é especialmente significativo, considerando que 13% da floresta da Amazônia Legal está sob tutela de povos e comunidades tradicionais extrativistas", afirma.
Outra prioridade são os financiamentos. Apib e Coiab reivindicam o repasse direto a fundos indígenas de recursos globais destinados a territórios afetados pelas mudanças climáticas. "Com essas verbas, poderíamos ampliar ações de proteção, recuperação e fomento às atividades produtivas", diz Karipuna.
Segundo Guajajara, na trajetória do financiamento climático os povos indígenas só receberam diretamente 1% do volume disponibilizado pelos doadores. No caso das áreas extrativistas, os recursos pleiteados têm como objetivo tanto a regularização das áreas quanto a geração de renda. "Existem comunidades com áreas titularizadas desde 2005 que ainda não receberam a concessão do direito real de uso porque o governo alega não ter recursos para fazer o georreferenciamento", diz Moraes.
Ela também pleiteia obtenção direta de recursos, sem intermediários, para agregar valor à produção, como a aquisição de máquinas para o processamento de frutas como o açaí.
Para emplacar as demandas na COP, a Apib e Coiab querem vê-las incorporadas pelo governo federal como um anexo à Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, as ações e metas climáticas assumidas por cada país participante).
A inclusão das propostas indígenas à NDC brasileira tem apoio do MPI. Mas Guajajara ressalta que ainda há um caminho pela frente até sua eventual aprovação pela comunidade internacional. O primeiro passo é, após o aval do ministério, conseguir o sinal verde do Conselho Interministerial de Mudança do Clima. Na segunda etapa, é necessária a validação pelos outros países.
Outro desafio será a aproximação das comitivas governamentais. "Ao longo destes anos de COP, percebemos que, por mais que se tenha presença indígena, a gente não conseguia chegar diretamente aos negociadores", diz Guajajara. "Então, tivemos a ideia de fazer uma formação para preparar indígenas para acompanhar diretamente os temas que serão discutidos e decididos."
No ano passado, o MPI e os ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e de Relações Exteriores (MRE) lançaram o programa Kuntari Katu, projeto de 18 meses para formação de jovens líderes em negociações políticas globais, conduzido por diplomatas. Entre os 33 participantes, está Kuty Kaingang, nascida na Terra Indígena Guarita, no Rio Grande do Sul.
Ela conta que, nas aulas e seminários presenciais e on-line, diplomatas, outros especialistas e indígenas com experiência em COPs anteriores falam sobre o funcionamento da conferência, estratégias de negociação e temas como mitigação e adaptação às mudanças climáticas, biodiversidade, sustentabilidade dos sistemas alimentares, financiamento climático e governança ambiental. Entre outros tópicos, está o mercado de carbono, cujo acesso é demandado tanto por indígenas da Coiab quanto por extrativistas do CNS.
"A qualificação é fundamental para chegarmos a Belém mais preparados para acompanhar, dialogar e, sempre que possível, integrar rodadas de negociação, painéis ou outros espaços", afirma ela.
Ainda assim, algumas barreiras persistem. "Uma das principais dificuldades é o idioma, o que reforça a necessidade de aprendermos inglês para conseguir acompanhar os debates, participar ativamente e defender com firmeza os direitos dos nossos povos", diz.
Tunayana também tem ressalvas. "Existem muitos discursos sobre a participação dos povos indígenas, mas não temos garantia de que as autoridades vão estar no mesmo pé de condições nos espaços de debate e mesas de negociações", diz. Segundo ela, o distanciamento começa na hospedagem. "Nós, do movimento indígena, possivelmente ficaremos acampados na universidade, pois as autoridades dos governos já bloquearam todos hotéis em Belém."
Para Moraes, o entrave é outro. "Queremos ter o mesmo espaço que os indígenas na mesa de negociações, mas para isso precisamos de um assento na LCIPP", diz ela, referindo-se à Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas, mecanismo criado Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) para reforçar o papel dessas populações nas ações climáticas.
https://valor.globo.com/brasil/cop30-amazonia/noticia/2025/05/09/povos-tradicionais-sentem-efeitos-do-clima-e-querem-ter-voz-na-cop.ghtml
Ministra Sonia Guajajara quer inscrever número recorde de indígenas para que tenham acesso à área de discussão na conferência de Belém
09/05/2025
Carin Petti
Com presença confirmada na COP30, a conferência do clima da ONU em Belém, em novembro, os líderes indígenas Kleber Karipuna e Angela Kaxuyana e também a representante de comunidades extrativistas Letícia Moraes sentem na pele os efeitos das mudanças climáticas. Há mais de seis meses, o rio está seco no território indígena Kaxuyana Tunayana, no extremo norte do Pará. "Nunca houve estiagens tão extremas, o que aumentou nossa insegurança alimentar", conta Ângela Kaxuyana, nascida ali e representante da Bacia Amazônica na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). "Sem chuva, cresceu a quantidade de crianças com diarreia e desnutrição por conta da troca do peixe e dos alimentos da roça por produtos industrializados."
Em terras do Oiapoque, no Amapá, é a mandioca que tem faltado nos últimos anos. "A culpa é de uma praga que surgiu com o aumento das temperaturas e a escassez de chuvas", afirma Kleber Karipuna, da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
A 600 quilômetros dali, comunidades extrativistas do município de Curralinho, na Ilha de Marajó, enfrentam, dependendo da estação, enchentes ou incêndios. "Estou com medo da chegada do verão", diz Letícia Moraes, vice-presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), a organização à qual pertenceu Chico Mendes. Segundo ela, com o calor cada vez maior, dispara focos de incêndio, que comprometem a produção de alimentos e reduzem em até 40% a renda das famílias que vivem da venda de produtos da floresta, como açaí e biojoias feitas com sementes.
Na COP30, o CNS faz parte da Comissão Internacional. A Apib e a Coiab integram a Comissão Internacional Indígena. Ambas estão no chamado Círculo dos Povos da conferência, grupo comandado pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) com o objetivo de ampliar a representação de indígenas, comunidades tradicionais e afrodescendentes na conferência do clima.
"As comissões vão trazer seus debates, temas e as contribuições para os documentos que serão discutidos ali no espaço dos negociadores", diz a ministra Sonia Guajajara, do MPI.
Segundo ela, a meta é conseguir o credenciamento recorde de mil indígenas - metade deles do Brasil - para ter acesso à zona azul da COP, reservada às negociações oficiais.
No topo das demandas das três organizações estão a demarcação e a regulamentação de territórios. "Já é reconhecido em nível global que demarcar terras indígenas e áreas de conservação, assim como titular territórios quilombolas, é uma política concreta e efetiva de enfrentamento à crise climática", diz Karipuna. Ela defende o direcionamento dos recursos a fundos geridos pela população beneficiada.
O raciocínio de Moraes é semelhante. "Áreas com titulação coletiva de territórios extrativistas são zonas conservadas, o que é especialmente significativo, considerando que 13% da floresta da Amazônia Legal está sob tutela de povos e comunidades tradicionais extrativistas", afirma.
Outra prioridade são os financiamentos. Apib e Coiab reivindicam o repasse direto a fundos indígenas de recursos globais destinados a territórios afetados pelas mudanças climáticas. "Com essas verbas, poderíamos ampliar ações de proteção, recuperação e fomento às atividades produtivas", diz Karipuna.
Segundo Guajajara, na trajetória do financiamento climático os povos indígenas só receberam diretamente 1% do volume disponibilizado pelos doadores. No caso das áreas extrativistas, os recursos pleiteados têm como objetivo tanto a regularização das áreas quanto a geração de renda. "Existem comunidades com áreas titularizadas desde 2005 que ainda não receberam a concessão do direito real de uso porque o governo alega não ter recursos para fazer o georreferenciamento", diz Moraes.
Ela também pleiteia obtenção direta de recursos, sem intermediários, para agregar valor à produção, como a aquisição de máquinas para o processamento de frutas como o açaí.
Para emplacar as demandas na COP, a Apib e Coiab querem vê-las incorporadas pelo governo federal como um anexo à Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, as ações e metas climáticas assumidas por cada país participante).
A inclusão das propostas indígenas à NDC brasileira tem apoio do MPI. Mas Guajajara ressalta que ainda há um caminho pela frente até sua eventual aprovação pela comunidade internacional. O primeiro passo é, após o aval do ministério, conseguir o sinal verde do Conselho Interministerial de Mudança do Clima. Na segunda etapa, é necessária a validação pelos outros países.
Outro desafio será a aproximação das comitivas governamentais. "Ao longo destes anos de COP, percebemos que, por mais que se tenha presença indígena, a gente não conseguia chegar diretamente aos negociadores", diz Guajajara. "Então, tivemos a ideia de fazer uma formação para preparar indígenas para acompanhar diretamente os temas que serão discutidos e decididos."
No ano passado, o MPI e os ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e de Relações Exteriores (MRE) lançaram o programa Kuntari Katu, projeto de 18 meses para formação de jovens líderes em negociações políticas globais, conduzido por diplomatas. Entre os 33 participantes, está Kuty Kaingang, nascida na Terra Indígena Guarita, no Rio Grande do Sul.
Ela conta que, nas aulas e seminários presenciais e on-line, diplomatas, outros especialistas e indígenas com experiência em COPs anteriores falam sobre o funcionamento da conferência, estratégias de negociação e temas como mitigação e adaptação às mudanças climáticas, biodiversidade, sustentabilidade dos sistemas alimentares, financiamento climático e governança ambiental. Entre outros tópicos, está o mercado de carbono, cujo acesso é demandado tanto por indígenas da Coiab quanto por extrativistas do CNS.
"A qualificação é fundamental para chegarmos a Belém mais preparados para acompanhar, dialogar e, sempre que possível, integrar rodadas de negociação, painéis ou outros espaços", afirma ela.
Ainda assim, algumas barreiras persistem. "Uma das principais dificuldades é o idioma, o que reforça a necessidade de aprendermos inglês para conseguir acompanhar os debates, participar ativamente e defender com firmeza os direitos dos nossos povos", diz.
Tunayana também tem ressalvas. "Existem muitos discursos sobre a participação dos povos indígenas, mas não temos garantia de que as autoridades vão estar no mesmo pé de condições nos espaços de debate e mesas de negociações", diz. Segundo ela, o distanciamento começa na hospedagem. "Nós, do movimento indígena, possivelmente ficaremos acampados na universidade, pois as autoridades dos governos já bloquearam todos hotéis em Belém."
Para Moraes, o entrave é outro. "Queremos ter o mesmo espaço que os indígenas na mesa de negociações, mas para isso precisamos de um assento na LCIPP", diz ela, referindo-se à Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas, mecanismo criado Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) para reforçar o papel dessas populações nas ações climáticas.
https://valor.globo.com/brasil/cop30-amazonia/noticia/2025/05/09/povos-tradicionais-sentem-efeitos-do-clima-e-querem-ter-voz-na-cop.ghtml
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