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Em 2014, O GLOBO acompanhou Sebastião Salgado em expedição às terras dos ianomâmi
23/05/2025
Fonte: O Globo - https://oglobo.globo.com/cultura/noticia/2025/05/23/em-2014-o-globo-acompanhou-sebastiao-s
Em 2014, O GLOBO acompanhou Sebastião Salgado em expedição às terras dos ianomâmi
O repórter Arnaldo Bloch e o fotógrafo, morto esta sexta-feira, foram alguns dos raros brancos a testemunhar cerimônia fúnebre do ameaçado povo originário
Por O GLOBO - Rio de Janeiro
23/05/2025
m março de 2014, o repórter Arnaldo Bloch, de O GLOBO, acompanhou o fotógrafo Sebastião Salgado (morto esta sexta-feira, em Paris, aos 81 anos) em uma expedição às terras dos ianomâmi no Amazonas, ba divisa com Roraima, entre as bacias do Rio Negro e do Rio Branco. Os dois foram autorizados a presenciar uma cerimônia fúnebre raramente vista por pessoas de fora.
Os receios em relação ao contato com os brancos tinham razão de ser: desde o contato no fim do século XIX a população ianomâmi no país tinha sido reduzida a 20%, segundo indigenistas e antropólogos, o Instituto Socioambiental (ISA) e a Frente de Proteção Ianomâmi, então ligada à Funai. Em 2014, eles eram 23 mil, dos 40 mil que havia no Brasil e na Venezuela - a maior população humana em alto grau de isolamento na mais extensa área indígena no planeta na floresta tropical.
O extermínio do povo ianomâmi também tinha atingido sua terra, riquíssima em reservas minerais, invadida, na década de 1980, pelo garimpo e por mineradoras, numa corrida do ouro estimulada pelo presidente da Funai à época. O número de garimpeiros chegou a ser cinco vezes o de ianomâmis. O reconhecimento, em 1992, dos 9,6 milhões de hectares, maior área demarcada do Brasil, de alta relevância para a proteção da biodiversidade amazônica, estancou a sangria.
Salgado é considerado um dos maiores talentos da fotografia mundial.
"Os brancos chegaram", traduziu Davi Kopenawa, chefe da aldeia, quando Arnaldo Bloch e Sebastião Salgado adentraram a área. Depois de quatro horas num monomotor vindo de Manaus, eles fizeram a volta da maloca, saudando seus habitantes, mas logo se depararam com a visão aterradora para quem vem de fora: cadáveres de 60 macacos atados por cipó pendendo em fogo baixo.
Os 200 quilos de macacos eram apenas parte do rito em honra do morto, cujo nome não se podia pronunciar. No centro, sob efeito da yakuana, pó marrom feito de raspas de árvores que dá acesso aos espíritos, Genésio, membro da elite de pajés, soltava gritos que imitam as vozes dos animais, fazia poses que emulavam fantasmas de árvores e gestos que repetiam as coreografias dos espíritos protetores e dos maléficos.
À noite, repórter e fotógrafo, dormiram redes, entre famílias e "parentes" convidados para a festa, e curtiram o breu que, numa aldeia sem luz elétrica, é permeado por lanterninhas e pequenas fogueiras que vão amenizar o frio da madrugada amazônica. Ali, ouviram os discursos em yanomae sobre os fatos do dia, a festa e o surto de gripe que ameaçava duas anciãs e três crianças com pneumonia.
Na manhã, eles acompanharam os participantes da festa recolherem o vinho alaranjado e oferecerem uns aos outros em grande quantidade. E viram o corpo do morto, envolto numa espécie de rede feita de folhas de bananeira, ser suspenso entre duas árvores próximas ao igarapé, até poder ser descarnado, seus ossos serem queimados, e suas cinzas guardadas nas urnas que ficam no mesmo local onde os 60 macacos eram assados, dia e noite, em fumaça lenta e persistente.
Só no último dia, os dois observaram, o povo teve a liberdade do pranto. Antes, pajés e visitantes sopraram yakuana nas narinas. Alguns foram se unir em duplas e realizar o waymou, de diálogo arcaico, de metáforas entrelaçadas, em forma de desafio. Então, Bloch e Salgado foram expulsos da maloca e as cinzas, enterradas ou guardadas por parentes. Do lado de fora, eles só puderam ouvir o choro intenso.
https://oglobo.globo.com/cultura/noticia/2025/05/23/em-2014-o-globo-acompanhou-sebastiao-salgado-em-expedicao-as-terras-dos-ianomani.ghtml
O repórter Arnaldo Bloch e o fotógrafo, morto esta sexta-feira, foram alguns dos raros brancos a testemunhar cerimônia fúnebre do ameaçado povo originário
Por O GLOBO - Rio de Janeiro
23/05/2025
m março de 2014, o repórter Arnaldo Bloch, de O GLOBO, acompanhou o fotógrafo Sebastião Salgado (morto esta sexta-feira, em Paris, aos 81 anos) em uma expedição às terras dos ianomâmi no Amazonas, ba divisa com Roraima, entre as bacias do Rio Negro e do Rio Branco. Os dois foram autorizados a presenciar uma cerimônia fúnebre raramente vista por pessoas de fora.
Os receios em relação ao contato com os brancos tinham razão de ser: desde o contato no fim do século XIX a população ianomâmi no país tinha sido reduzida a 20%, segundo indigenistas e antropólogos, o Instituto Socioambiental (ISA) e a Frente de Proteção Ianomâmi, então ligada à Funai. Em 2014, eles eram 23 mil, dos 40 mil que havia no Brasil e na Venezuela - a maior população humana em alto grau de isolamento na mais extensa área indígena no planeta na floresta tropical.
O extermínio do povo ianomâmi também tinha atingido sua terra, riquíssima em reservas minerais, invadida, na década de 1980, pelo garimpo e por mineradoras, numa corrida do ouro estimulada pelo presidente da Funai à época. O número de garimpeiros chegou a ser cinco vezes o de ianomâmis. O reconhecimento, em 1992, dos 9,6 milhões de hectares, maior área demarcada do Brasil, de alta relevância para a proteção da biodiversidade amazônica, estancou a sangria.
Salgado é considerado um dos maiores talentos da fotografia mundial.
"Os brancos chegaram", traduziu Davi Kopenawa, chefe da aldeia, quando Arnaldo Bloch e Sebastião Salgado adentraram a área. Depois de quatro horas num monomotor vindo de Manaus, eles fizeram a volta da maloca, saudando seus habitantes, mas logo se depararam com a visão aterradora para quem vem de fora: cadáveres de 60 macacos atados por cipó pendendo em fogo baixo.
Os 200 quilos de macacos eram apenas parte do rito em honra do morto, cujo nome não se podia pronunciar. No centro, sob efeito da yakuana, pó marrom feito de raspas de árvores que dá acesso aos espíritos, Genésio, membro da elite de pajés, soltava gritos que imitam as vozes dos animais, fazia poses que emulavam fantasmas de árvores e gestos que repetiam as coreografias dos espíritos protetores e dos maléficos.
À noite, repórter e fotógrafo, dormiram redes, entre famílias e "parentes" convidados para a festa, e curtiram o breu que, numa aldeia sem luz elétrica, é permeado por lanterninhas e pequenas fogueiras que vão amenizar o frio da madrugada amazônica. Ali, ouviram os discursos em yanomae sobre os fatos do dia, a festa e o surto de gripe que ameaçava duas anciãs e três crianças com pneumonia.
Na manhã, eles acompanharam os participantes da festa recolherem o vinho alaranjado e oferecerem uns aos outros em grande quantidade. E viram o corpo do morto, envolto numa espécie de rede feita de folhas de bananeira, ser suspenso entre duas árvores próximas ao igarapé, até poder ser descarnado, seus ossos serem queimados, e suas cinzas guardadas nas urnas que ficam no mesmo local onde os 60 macacos eram assados, dia e noite, em fumaça lenta e persistente.
Só no último dia, os dois observaram, o povo teve a liberdade do pranto. Antes, pajés e visitantes sopraram yakuana nas narinas. Alguns foram se unir em duplas e realizar o waymou, de diálogo arcaico, de metáforas entrelaçadas, em forma de desafio. Então, Bloch e Salgado foram expulsos da maloca e as cinzas, enterradas ou guardadas por parentes. Do lado de fora, eles só puderam ouvir o choro intenso.
https://oglobo.globo.com/cultura/noticia/2025/05/23/em-2014-o-globo-acompanhou-sebastiao-salgado-em-expedicao-as-terras-dos-ianomani.ghtml
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