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Universo encantado

17/09/2025

Autor: Valentina Fraiz

Fonte: Quatro Cinco Um - https://quatrocincoum.com.br/entrevistas/capa/universo-encantado/



Universo encantado
A ilustradora Valentina Fraiz fala sobre as inspirações e conexões da capa de setembro, que retrata diferentes habitantes da floresta

Redação Quatro Cinco Um
17set2025
Entrevistas
Ilustração

A ilustradora e bióloga Valentina Fraiz assina a imagem de capa da edição #97, de setembro de 2025, que retrata diferentes habitantes da floresta amazônica. A edição traz o especial "Vozes da floresta" - com resenhas das biografias de cacique Raoni e Nahu Kuikuro, um texto sobre as relações entre humanos e animais no povo wari', além de um ensaio sobre o livro póstumo do jornalista Dom Phillips.

Elemento central da ilustração, a samaúma - árvore emblemática da floresta e considerada sagrada por muitos povos - é o componente em torno do qual encontram-se humanos, animais e outras plantas. "Quis que ela, os bichos e todo o ecossistema fossem os protagonistas, porque é assim a percepção animista dos povos originários: tudo está vivo, tudo está interligado", diz a artista venezuelana, que vive em São Paulo.

Fraiz diz ter buscado inspiração também nos povos indígenas da América Central e do Caribe, que fazem parte da sua ancestralidade, e no trabalho de Jaider Esbell (1979-2021), artista, escritor e ativista brasileiro da etnia Macuxi.

Como foi o processo de criação da capa de setembro?
Quando soube que a edição de setembro da revista se chamaria "Vozes da floresta", pensei imediatamente em um dos seus maiores símbolos: a samaúma. A presença de um ser tão mais velho do que uma existência humana é muito impressionante - suas raízes gigantescas envolvendo as pessoas pequeninas. Quis que ela, os bichos e todo o ecossistema fossem os protagonistas, porque é assim a percepção animista dos povos originários: tudo está vivo, tudo está interligado. Primeiro fui desenhando com lápis digital e, na hora de colorir, tive muita vontade de criar um cenário noturno, intimista e mágico.

Que referências visuais e artísticas você buscou?
Minhas referências gráficas para essa ilustração vêm dos povos indígenas da América Central e do Caribe, que usam, com frequência, fundo preto com desenhos muito coloridos sobrepostos, criando contraste e magnetismo. Acho que as luzes que saem do fundo da mata e dos galhos das árvores foram inspiradas inconscientemente na obra de Jaider Esbell, na mesma linha mágica e futurista. No início, pesquisei pinturas corporais das etnias retratadas nos livros resenhados nesta edição para desenhar as pessoas ao pé da árvore. Depois, a equipe de editores me lembrou da importância de trazer realismo e contemporaneidade a essas figuras. Então, vesti algumas com camiseta, short, chinelo, vestidos, roupas diversas e diferentes adornos.

Você é formada em biologia e também trabalha em projetos de divulgação científica e sobre as mudanças climáticas. Como essas experiências se cruzam?
No curso de Biologia da USP, descobri uma forte inclinação para o desenho científico, o que me levou a migrar para a arte. Ao longo de quase três décadas, fui me aproximando novamente da ciência através da ilustração e me envolvi em projetos de pesquisa no campo do feminismo, do antirracismo, da divulgação científica e das mudanças climáticas.

Também tenho contribuído em muitos projetos que envolvem povos indígenas: desenhei os biomas do Xingu para mapas do ISA [Instituto Socioambiental]; registrei as histórias da migração de mulheres e meninas indígenas da América Latina durante a pandemia para a Fòs Feminista [aliança internacional em saúde reprodutiva e direitos femininos]; e elaborei infográficos e campanhas para o programa Gênero e Mudanças Climáticas, do Observatório do Clima, e trabalhei com o povo Kalunga, do Cerrado, para o ISPN [Instituto Sociedade, População e Natureza].

Tive a alegria de ilustrar o livro 1492, Anacaona: a insurgente do Caribe (Jandaíra, 2024), de Paula Anacaona, que conta a história dessa cacica e do povo Taíno, e atualmente estou ilustrando um livro/pesquisa sobre as infâncias do povo Guarani.

Como é representar povos indígenas na sua arte?
Sou uma mulher afro-indígena do Caribe. Minhas duas avós são da mesma região da Venezuela, com forte presença indígena, e ambas se casaram com homens europeus. Eu sou uma pessoa mestiça que carrega essa história. Quando ilustrei o livro sobre Anacaona - cacica que, na época da chegada dos invasores, foi traída e morta por eles e cujo povo foi praticamente dizimado em poucas décadas -, tive muitos pesadelos e dificuldades no processo.
Ilustração do livro 1492, Anacaona: a insurgente do Caribe (Jandaíra, 2024)

Os taínos foram um povo nômade que ocupou a região de onde são minhas avós e minha mãe. Agora, na imersão que fiz na aldeia guarani em Biguaçu (SC), também tive muitos sonhos e revelações com a curandeira de lá, Dona Fátima. Muitas das práticas de cura que ela realiza me lembraram das que minha avó, Maria Amélia, fazia comigo no quintal de casa: falando com as ervas, assoprando a doença, fazendo rezas e longas vigílias quando eu ficava doente, ainda criança. Sou muito grata à minha profissão por me oferecer cada vez mais esses presentes da ancestralidade.

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