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Nova lei de licenciamento e mea culpa ambiental

11/06/2025

Autor: KOKKE, Marcelo

Fonte: OESP - https://www.estadao.com.br/



Nova lei de licenciamento e mea culpa ambiental
É preciso superar análises simplistas ou emocionais. Procurar e atuar sobre o 'porquê' é mais eficiente do que projetar idealizações

Marcelo Kokke
Pós-doutor pela Universidade de Santiago de Compostela, mestre e doutor pela PUC-Rio, pós-graduado em Ecologia e Monitoramento Ambiental, procurador federal da Advocacia-Geral da União, coordenador de Assuntos Estratégicos e Responsabilidade Civil - PFE-IBAMA, é professor do Centro Universitário Dom Helder

11/06/2025

A aprovação no Senado do projeto que estabelece a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental desperta reações e confrontações sociais a respeito da preservação e da conservação ambientais. O projeto tem efeitos sobre as novas dinâmicas de gestão de riscos e impactos ambientais. Este artigo se volta à abordagem diversa, contrária ao maniqueísmo que por vezes toma o tema. A pergunta central que se levanta é: em que medida o ordenamento jurídico, assim como juristas, ambientalistas e tantos outros profissionais ligados ao meio ambiente, não deveriam também refletir sobre uma espécie de "mea culpa ambiental"?

Propõe-se uma análise crítica que retire o teor do "nós contra eles", da indisposição entre economia e meio ambiente. Passa-se a tematizar, justamente, em que medida esse discurso reforça estereótipos ecológicos que rotulam a proteção ambiental e o licenciamento como entraves econômicos e de desenvolvimento social. É necessário que haja análise crítica para se perceber que por vezes os debates e discursos ambientais são projetados para o próprio círculo de sua elaboração. Ao longo das últimas décadas, a construção generalizante do estereótipo do agricultor ou empresário degradador, assim como do ambientalista que gostaria de viver nas cavernas, tomou as mentes com percepções sociais antagônicas. A aprovação do projeto de lei deve ser compreendida como um sintoma, como reação político-social a esse contexto de confrontação.

O texto revela, antes de tudo, uma crise de confiança. Empreendedores se sentem inseguros diante das aplicações normativas, da dilargada análise do licenciamento ambiental, de exigências que por vezes transcendem os aspectos de impacto ecológico e transformam o licenciamento em mecanismo ambíguo de política pública. A insegurança avança diante de riscos de judicialização, de paralisia de investimentos. O meio ambiente, embora seja o pressuposto da prosperidade, passou a ser entendido como seu obstáculo. Trata-se de uma expressão comportamental e o fluxo de construção jurídica está imerso em expectativas de segurança que são antes de tudo jurídico-psicológicas.

Desde casos como o complexo portuário Porto Sul, transposição do Rio São Francisco ou o complexo Portuário de Suape, até casos de menor envergadura, mas de intensa repercussão cumulativa. Em todos eles, o licenciamento, em vez de interiorizado socialmente como uma fonte de benefícios ecológicos, econômicos e sociais, passou a ser considerado como um gargalo, fonte de paralisia. É preciso superar análises simplistas ou emocionais. Procurar e atuar sobre o "porquê" é mais eficiente do que projetar idealizações. A imagem de insegurança jurídica captada pela forma como veio a ser implementado o licenciamento e sua discussão judicial levou ao projeto de lei.

Dentre os diversos relatórios e análises legislativas, destacam-se argumentos sobre a atual ausência de norma geral aplicável com homogeneidade de conceitos, prazos, tipos de licença e seus critérios, procedimentos e estudos ambientais exigíveis, participação social e manifestações de entidades públicas. Assim, um dos alicerces propulsores do projeto foi a insegurança jurídica, a sensação social e econômica do licenciamento como entrave, e não como via de desenvolvimento contínuo. Sem o enfrentamento crítico desses argumentos, o falso dilema entre meio ambiente e desenvolvimento continuará.

Nessa linha, leis e resoluções dos entes estaduais de meio ambiente, com o objetivo de efetivar licenciamentos simplificados, foram objeto constante de judicialização, chegando ao Supremo Tribunal Federal, por vezes anos após sua edição. A judicialização extravagante compromete a expectativa de confiança do empreendedor diante da instabilidade da base normativa. Cite-se aqui, v.g., ADI 6288, ADI 7611, ADI 6650, RE 1264738. Por outro lado, não há dúvida de que violações normativas provocadas por minoria de empreendedores imprimem uma postura defensiva por parte dos órgãos públicos, o que também leva a uma desconfiança paralisante.

Esse contexto exibe uma crise do modelo de governança multinível econômico-ecológica. Juristas, ambientalistas, economistas ambientais, dentre outros, precisam levar a si uma crítica interna. Não porque estejam errados em seus objetivos de proteção e desenvolvimento sustentável, de forma alguma. É necessário tematizar pontos de crise de governança ambiental envolvendo Estado, sociedade e mercado, que foram sedimentados ao longo de décadas em todos os níveis da federação.

Enfrentar a crise de confiança e com eficácia proporcionar um amálgama entre economia e tutela ambiental, demonstrar que a primeira não sobrevive sem a segunda, demanda reversão comportamental do sentimento de insegurança jurídica ambiental em favor do modelo de sustentabilidade. Manter maniqueísmos idealistas, sejam eles ambientais, sejam eles econômicos, somente proporcionará eventos com debates que funcionarão mais como terapia coletiva do que como via construtiva e aprimoradora da aplicação de institutos jurídico-ambientais.

https://www.estadao.com.br/opiniao/espaco-aberto/nova-lei-de-licenciamento-e-mea-culpa-ambiental/
 

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