From Indigenous Peoples in Brazil
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News
Oficinas de Agroecologia e Economia Indígena fortalecem saberes e práticas ancestrais que protegem territórios e a vida
08/08/2025
Autor: Raquel Mura, Lígia Apel
Fonte: Cimi - https://cimi.org.br
"Mais do que plantar sem veneno, a Agroecologia é uma forma de viver em harmonia com a natureza, cuidar da terra e manter viva, a cultura dos povos. Enquanto o agronegócio avança, a agroecologia resiste. Protege a floresta, o alimento e o nosso jeito de viver e cultivar. Ela é território, cultura e vida".
Essa foi a conclusão dos participantes do intercâmbio de experiências sobre economias indígenas com práticas Agroecológicas e Economia Indígena, realizado entre os dias 26 e 29 de julho, no Centro de Formação Xare do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Norte 1, em Manaus (AM).
"Mais do que plantar sem veneno, a Agroecologia é uma forma de viver em harmonia com a natureza, cuidar da terra e manter viva a cultura dos povos"
Do Amazonas, o encontro reuniu jovens indígenas do povo Mura (de Careiro da Várzea e Autazes), e dos povos Kokama e Kambeba (de Tefé). De Roraima participaram jovens dos povos Macuxi, Yek'wana e Wapichana. A diversidade de origens fortaleceu a riqueza das experiências compartilhadas durante os quatro dias de atividades.
A proposta é a base do Projeto Terra Mãe e visa fortalecer as economias próprias dos indígenas que, a partir de iniciativas já existentes nas comunidades, favorece práticas agroecológicas nos territórios. Como estratégia de ação, o projeto vem promovendo oficinas entre mulheres e jovens, produtores, associações e organizações indígenas.
"Como estratégia de ação, o projeto vem promovendo oficinas entre mulheres e jovens, produtores, associações e organizações indígenas"
O encontro foi construído como espaço de troca de saberes, práticas sustentáveis e elaboração de miniprojetos voltados à autonomia alimentar e econômica dentro das aldeias. Diversificação dos roçados, das experiências e dos cultivos foram trabalhados de forma a buscar melhoramentos dos sistemas de produção já desenvolvidos pelos participantes.
A programação uniu teoria e prática, com rodas de conversa sobre economia indígena e agroecológica, além de momentos de vivência direta com o plantio de hortaliças e contou com os técnicos agrícolas indígenas, formados no (CICRSS). Os participantes puderam trocar informações sobre formas de cultivo livre de veneno, respeitando os modos ancestrais de plantar, mas também conhecendo técnicas da agroecologia como campo de estudo. O objetivo foi justamente valorizar os saberes tradicionais e, ao mesmo tempo, apresentar caminhos possíveis a partir do diálogo com o conhecimento técnico.
"É um reforço ao nosso conhecimento, como agroecólogo aprendo novas coisas com os parentes que têm uma outra forma de trabalhar com a natureza"
Janderson da Costa Mura, indígena agroecológo, da aldeia Trincheira, em Autazes, disse que os debates sobre agroecologia são importantes pelos conhecimentos que cada povo tem e que passam a ser do conhecimento dos outros.
"É um reforço ao nosso conhecimento, como agroecólogo aprendo novas coisas com os parentes que têm uma outra forma de trabalhar com a natureza. A gente tem nossa cultura, eles têm a cultura deles, e a agroecologia fortalece esses conhecimentos de como tratar da natureza e preservar o ambiente, que vêm dos nossos ancestrais", disse.
Jonison Prado Mura, técnico em agroecologia que assessorou a oficina, concorda com Janderson na constatação de que cada um traz um pouquinho do que sabe.
"A agroecologia fortalece esses conhecimentos de como tratar da natureza e preservar o ambiente, que vêm dos nossos ancestrais"
"Cada parente traz um pouquinho do conhecimento que tem na sua aldeia, na sua plantação, onde conseguem desenvolver as plantações de forma bem tradicional e que, muitas vezes, não sabem que isso é agroecologia. Então, podendo conversar, trocar ideias e repassar algumas técnicas só irão melhorar o desenvolvimento do sistema agroecológico que já vêm fazendo nas aldeias", afirmou, comentando que as técnicas compartilhadas contribuem para evitar compra de alimento na cidade.
"Nesses três dias a gente pôde falar dos compostos orgânicos, da horta orgânica e do círculo de bananeiras, técnicas que vão auxiliar bastante na produção de alimentos e vai alavancar mais com produtos orgânicos, sem usar produtos que eles vão comprar na cidade", constatou.
"Cada parente traz um pouquinho do conhecimento que tem na sua aldeia, onde conseguem desenvolver as plantações de forma bem tradicional"
Para Nedson André Macuxi, da comunidade Maturuka, região das Serras (RR), a oficina foi uma experiência boa, que "dá a certeza de que estamos levando um conhecimento [técnico] para a nossa comunidade, que é praticamente algo que a gente já vive", reconheceu, afirmando que o objetivo é o mesmo: "cuidar da natureza porque ela cuida da gente. A natureza é a nossa mãe, onde ela dá a nossa vida e o sustento de cada povo", atestou.
Da região do Médio rio Solimões, município de Tefé, aldeia Barreira de Baixo, veio o jovem Jean Cordeiro Kokama, que também percebeu que as técnicas de agroecologia são formas de entender a natureza e cultivar alimentos que as populações indígenas praticam desde sempre.
"Cuidar da natureza porque ela cuida da gente. A natureza é a nossa mãe, onde ela dá a nossa vida e o sustento de cada povo"
"É algo que a nossa população vem fazendo já, com os plantios de hortaliças e outros cultivos, mas que não têm esse conhecimento científico. Isso é algo que a gente tira muito proveito e que a gente vai estar levando e implantando nas aldeias", avaliou, concluindo que os conhecimentos organizados com as técnicas agroecológicas vão ajudar a produzir mais e melhor.
Cilene Wapichana, da região Surumu, comunidade Barro (RR), é uma jovem estudante indígena que conhece agroecologia e implanta plantios agroecológicos em sua comunidade e, também a vê como uma prática tradicional desenvolvida pelos povos indígenas e que, agora, alia esses conhecimentos às inovações científicas que beneficiam os plantios.
"É algo que a nossa população vem fazendo já, com os plantios de hortaliças e outros cultivos, mas que não têm esse conhecimento científico"
"A agroecologia é uma abordagem sustentável para a agricultura. Ela combina práticas agrícolas tradicionais com inovação científica para promover a biodiversidade, melhorar a fertilidade do solo e reduzir a dependência de insumos químicos. É valorizada por seus benefícios ambientais e sociais, pois promove a conservação da natureza e fortalece as comunidades", conceitua e vê a oficina como um espaço de troca e colaboração entre os dois saberes.
"É uma oportunidade de aprender práticas agrícolas sustentáveis de forma prática e interativa. Proporcionam um espaço de troca de conhecimentos e experiências, além de incentivar a colaboração entre agricultores e especialistas", observa, comentando que o desafio estará no repasse dos aprendizados para os demais moradores da sua aldeia.
"Vamos implementar agroecologia na comunidade organizando grupos de estudo e trabalho para compartilhar conhecimentos e técnicas agroecológicas, promovendo hortas comunitárias que utilizem práticas sustentáveis, como compostagem e rotação de culturas e oferecendo sabedoria e capacitações para agricultores e moradores interessados em adotar as práticas em agroecologia", concluiu.
"A Agroecologia combina práticas agrícolas tradicionais com inovação científica para promover a biodiversidade"
Proteção do território
Com unanimidade, os participantes da oficina perceberam que a agroecologia não é novidade para os povos indígenas. Ela é o que seus ancestrais já fazem há milhares de anos: plantar respeitando a terra, sem usar venenos e sem destruir a vegetação.
Com essa diferença conceitual de agricultura e produção de alimentos que chegou aos tempos atuais, a prática agroecológica se tornou resistência e proteção dos territórios indígenas. Enquanto o agronegócio e a monocultura avançam retirando toda a vegetação que protege e alimenta o solo, a agroecologia combina as variações de espécies agrícolas, frutíferas e florestais.
"Agroecologia é o que seus ancestrais já fazem há milhares de anos: plantar respeitando a terra, sem usar venenos e sem destruir a vegetação"
Os participantes chegaram, então, ao entendimento de que "não é sobre o que se colhe, mas é sobre o que se preserva, é sobre todo o território, sobre a cultura dos que ali vivem e sobre a vida de quem vive".
Jean Kokama válida a análise ao comentar que a forma de ocupação dos indígenas em seu território, que é uma ocupação que protege a natureza e meio ambiente, dá indicações para a construção de políticas indigenistas.
"[A agroecologia] também é algo que a gente coloca a respeito do nosso território, da nossa terra indígena. Essa prática só vem dar mais visibilidade em questão da nossa ocupação ali dentro do território. E aí, possibilita que as políticas que estão sendo realizadas para a população indígena sejam vistas pelo nosso lado. Eles veem que a gente está ali porque a gente quer cuidar e a gente quer salvar a natureza. E que a gente só está protegendo o que é nosso", apontou.
"A agroecologia também é algo que a gente coloca a respeito do nosso território, da nossa terra indígena"
Xare
Um arco-íris é um fenômeno físico, ótico, que se realiza quando a luz branca do sol atravessa gotículas de água suspensas na atmosfera, geralmente depois de uma grande chuva, e separa as cores que a compõe. Reflexão e refração da luz dentro das gotículas de água, resultam em um arco multicolorido no céu.
Na cultura Waimiri Atroari, o arco-íris pode ter a simbologia de encontro entre o mundo visível (material) e o invisível (espiritual), em uma cosmologia que conecta os diferentes reinos e os ciclos da vida que traz esperanças.
"O arco-íris pode ter a simbologia de encontro entre dois mundos em uma cosmologia que conecta os diferentes reinos e os ciclos da vida que traz esperanças"
Xare é arco-íris em Waimiri Atroari. E Xare é o Centro de Formação do Cimi Regional Norte 1. Lugar de encontro entre mundos visíveis e invisíveis, de vidas materiais e espirituais, de pessoas e culturas diversas que se unem em suas diferenças.
O intercambio sobre as Economias Indígenas reuniu os povos Kokama, Kambeba, Macuxi, Yek'wana, Wapichana e Mura no Xare. E, como em um arco-íris que tem as cores separadas, mas que estão lado a lado, esses povos se uniram em seus conhecimentos para aprender e compartilhar sobre os ciclos de vidas que alimentam a vida.
"O intercambio sobre as Economias Indígenas reuniu os povos Kokama, Kambeba, Macuxi, Yek'wana, Wapichana e Mura no Xare"
Para Hoadson Leonardo, missionário do Cimi Regional Norte 1 e administrador do Xare, esse é o sentido do Centro de Formação.
"O Centro de Formação Xare tem a sua importância porque é voltado para as diversas culturas indígenas, negras, ribeirinhas. O espaço favorece trocas de experiências entre esses povos, que mostram e demonstram as suas formas de fazer, de cuidar do ambiente, do planeta e das vidas. E quando vêm para cá com essa reciprocidade, trazendo as suas experiências em lidar com a natureza, em manejar espaços, territórios, roçados, ambientes, tanto em florestas quanto rios e lagos, todos se enriquecem, todos ganham", celebrou, destacando que a agroecologia, para além de sustentabilidade econômica e alimentar, é interação com mundo.
"O Centro de Formação Xare tem a sua importância porque é voltado para as diversas culturas indígenas, negras, ribeirinhas"
"Falar e fazer Agroecologia é, de fato, cuidar do planeta, cuidar da natureza. E o retorno para a vida é que a natureza também cuida da gente. A Agroecologia é justamente essa interação do ser humano com a natureza, é retornar ao equilíbrio e harmonia que o ser humano sempre viveu com o mundo natural, onde tudo concorre para o bem-estar do ser humano e do planeta", concluiu.
Além do aprendizado dos conceitos e sentidos da agroecologia e das técnicas de cuidados com o solo e plantios, o intercâmbio estimulou a criação de miniprojetos comunitários que poderão ser implantados nas aldeias, respeitando a realidade e os sonhos de cada povo. Alimentação saudável, geração de renda, fortalecimento da cultura e defesa do território caminharam lado a lado ao longo de toda a atividade.
"Falar e fazer Agroecologia é, de fato, cuidar do planeta, cuidar da natureza"
Roraima: no Surumu e em Maturuca
As oficinas previstas no Projeto Terra Mãe foram planejadas em diferentes locais da área de abrangência do Cimi Regional Norte 1. Já foram realizadas em Roraima, nas comunidades Surumu e Maturuka, e essa no Xare, em Manaus.
Em março desse ano aconteceu na comunidade Maturuca, região das Serras, município de Uiramutã, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, com os alunos da Escola Indígena José Allabamo, dos povos Macuxi e Wapichana.
"As oficinas previstas no Projeto Terra Mãe foram planejadas em diferentes locais da área de abrangência do Cimi Regional Norte 1"
As aulas teóricas abrangeram conceitos e técnicas de agroecologia e nas aulas práticas, ministradas por cinco técnicos indígenas em agroecologia da própria comunidade, foram construídas hortas em forma de mandala, uma técnica agroecológica que possibilita diversidade de culturas, aproveitamento de espaços e facilidade de manutenção.
Pe. James Murimi Njimia, missionário da Pastoral Indigenista de Roraima e assessor das oficinas de agroecologia, a importância da atividade está no envolvimento dos jovens e na produção de alimentos para abastecimento da comunidade, da merenda escolar e, também, para comercialização.
"As aulas teóricas e práticas foram ministradas por cinco técnicos indígenas em agroecologia da própria comunidade"
"Todos [os técnicos em agroecologia] foram formados na escola comunitária de Surumu e agora eles atuam na comunidade ajudando a produzir os alimentos que vão sustentar a comunidade e que, também, serão para venda e fornecimento para a merenda escolar", informou Pe. James, animado com a perspectiva de alcançar os objetivos: "o motivo principal é a sustentabilidade e autonomia da comunidade", concluiu.
Com a mesma perspectiva, caminhando na mesma direção e efetivando as mesmas ações, foi realizada em junho de 2025, a oficina na comunidade Surumu, município de Pacaraima, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
"O motivo principal é a sustentabilidade e autonomia da comunidade"
A área escolhida foi em um Sistema Agroflorestal (SAF), onde se combina espécies florestais e culturas agrícolas cultivadas de forma simultânea. É uma forma de agricultura que se aproxima dos ecossistemas naturais e que promove recuperação de solos degradados, melhora o microclima e a biodiversidade, além de possibilitar a geração de renda ao longo do tempo.
Segundo a coordenadora do Centro de Formação e uma das lideranças participantes da oficina, Clemilse Taurepang, o SAF já existe dede 2023, é mantido pelos alunos da escola da comunidade e "vem valorizando esse espaço com culturas diferentes, com árvores para produção de madeiras, árvores frutíferas e plantio de espécies leguminosas", explicou, destacando a participação dos alunos.
"Essa experiência de trabalho é muito boa, porque se vê pessoas que valorizam esse tipo de atividade, que é uma atividade em conjunto"
"Tudo isso de acordo com o planejamento que os alunos fazem na escola. São alunos de várias regiões. No momento tem alunos de quatro regiões, de quatro povos diferentes, que são Wai Wai, Wapichana, Macuxi e Ye'kwana", disse, explicando que a diversificação de espécies é uma prática indígena.
"Essa experiência de trabalho é muito boa, porque se vê pessoas que valorizam esse tipo de atividade, que é uma atividade em conjunto, não fazendo monocultura, fazendo plantações de diversas espécies, que valorizam muito o solo. E, também, com a nossa realidade como povo indígena, que a gente não trabalha só específico em uma só realidade, de uma cultura só, mas, de várias espécies porque aí vamos ter muito mais alimentos e outros produtos para outras necessidades", afirmou.
A realização das Oficinas de Agroecologia e do Projeto Terra Mãe reafirma o compromisso com a autonomia e os direitos dos povos indígenas, mostrando que a agroecologia e a economia indígena são caminhos vivos e possíveis para o presente e o futuro das comunidades.
https://cimi.org.br/2025/08/oficinas-agroecologia-economia-indigena/
Essa foi a conclusão dos participantes do intercâmbio de experiências sobre economias indígenas com práticas Agroecológicas e Economia Indígena, realizado entre os dias 26 e 29 de julho, no Centro de Formação Xare do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Norte 1, em Manaus (AM).
"Mais do que plantar sem veneno, a Agroecologia é uma forma de viver em harmonia com a natureza, cuidar da terra e manter viva a cultura dos povos"
Do Amazonas, o encontro reuniu jovens indígenas do povo Mura (de Careiro da Várzea e Autazes), e dos povos Kokama e Kambeba (de Tefé). De Roraima participaram jovens dos povos Macuxi, Yek'wana e Wapichana. A diversidade de origens fortaleceu a riqueza das experiências compartilhadas durante os quatro dias de atividades.
A proposta é a base do Projeto Terra Mãe e visa fortalecer as economias próprias dos indígenas que, a partir de iniciativas já existentes nas comunidades, favorece práticas agroecológicas nos territórios. Como estratégia de ação, o projeto vem promovendo oficinas entre mulheres e jovens, produtores, associações e organizações indígenas.
"Como estratégia de ação, o projeto vem promovendo oficinas entre mulheres e jovens, produtores, associações e organizações indígenas"
O encontro foi construído como espaço de troca de saberes, práticas sustentáveis e elaboração de miniprojetos voltados à autonomia alimentar e econômica dentro das aldeias. Diversificação dos roçados, das experiências e dos cultivos foram trabalhados de forma a buscar melhoramentos dos sistemas de produção já desenvolvidos pelos participantes.
A programação uniu teoria e prática, com rodas de conversa sobre economia indígena e agroecológica, além de momentos de vivência direta com o plantio de hortaliças e contou com os técnicos agrícolas indígenas, formados no (CICRSS). Os participantes puderam trocar informações sobre formas de cultivo livre de veneno, respeitando os modos ancestrais de plantar, mas também conhecendo técnicas da agroecologia como campo de estudo. O objetivo foi justamente valorizar os saberes tradicionais e, ao mesmo tempo, apresentar caminhos possíveis a partir do diálogo com o conhecimento técnico.
"É um reforço ao nosso conhecimento, como agroecólogo aprendo novas coisas com os parentes que têm uma outra forma de trabalhar com a natureza"
Janderson da Costa Mura, indígena agroecológo, da aldeia Trincheira, em Autazes, disse que os debates sobre agroecologia são importantes pelos conhecimentos que cada povo tem e que passam a ser do conhecimento dos outros.
"É um reforço ao nosso conhecimento, como agroecólogo aprendo novas coisas com os parentes que têm uma outra forma de trabalhar com a natureza. A gente tem nossa cultura, eles têm a cultura deles, e a agroecologia fortalece esses conhecimentos de como tratar da natureza e preservar o ambiente, que vêm dos nossos ancestrais", disse.
Jonison Prado Mura, técnico em agroecologia que assessorou a oficina, concorda com Janderson na constatação de que cada um traz um pouquinho do que sabe.
"A agroecologia fortalece esses conhecimentos de como tratar da natureza e preservar o ambiente, que vêm dos nossos ancestrais"
"Cada parente traz um pouquinho do conhecimento que tem na sua aldeia, na sua plantação, onde conseguem desenvolver as plantações de forma bem tradicional e que, muitas vezes, não sabem que isso é agroecologia. Então, podendo conversar, trocar ideias e repassar algumas técnicas só irão melhorar o desenvolvimento do sistema agroecológico que já vêm fazendo nas aldeias", afirmou, comentando que as técnicas compartilhadas contribuem para evitar compra de alimento na cidade.
"Nesses três dias a gente pôde falar dos compostos orgânicos, da horta orgânica e do círculo de bananeiras, técnicas que vão auxiliar bastante na produção de alimentos e vai alavancar mais com produtos orgânicos, sem usar produtos que eles vão comprar na cidade", constatou.
"Cada parente traz um pouquinho do conhecimento que tem na sua aldeia, onde conseguem desenvolver as plantações de forma bem tradicional"
Para Nedson André Macuxi, da comunidade Maturuka, região das Serras (RR), a oficina foi uma experiência boa, que "dá a certeza de que estamos levando um conhecimento [técnico] para a nossa comunidade, que é praticamente algo que a gente já vive", reconheceu, afirmando que o objetivo é o mesmo: "cuidar da natureza porque ela cuida da gente. A natureza é a nossa mãe, onde ela dá a nossa vida e o sustento de cada povo", atestou.
Da região do Médio rio Solimões, município de Tefé, aldeia Barreira de Baixo, veio o jovem Jean Cordeiro Kokama, que também percebeu que as técnicas de agroecologia são formas de entender a natureza e cultivar alimentos que as populações indígenas praticam desde sempre.
"Cuidar da natureza porque ela cuida da gente. A natureza é a nossa mãe, onde ela dá a nossa vida e o sustento de cada povo"
"É algo que a nossa população vem fazendo já, com os plantios de hortaliças e outros cultivos, mas que não têm esse conhecimento científico. Isso é algo que a gente tira muito proveito e que a gente vai estar levando e implantando nas aldeias", avaliou, concluindo que os conhecimentos organizados com as técnicas agroecológicas vão ajudar a produzir mais e melhor.
Cilene Wapichana, da região Surumu, comunidade Barro (RR), é uma jovem estudante indígena que conhece agroecologia e implanta plantios agroecológicos em sua comunidade e, também a vê como uma prática tradicional desenvolvida pelos povos indígenas e que, agora, alia esses conhecimentos às inovações científicas que beneficiam os plantios.
"É algo que a nossa população vem fazendo já, com os plantios de hortaliças e outros cultivos, mas que não têm esse conhecimento científico"
"A agroecologia é uma abordagem sustentável para a agricultura. Ela combina práticas agrícolas tradicionais com inovação científica para promover a biodiversidade, melhorar a fertilidade do solo e reduzir a dependência de insumos químicos. É valorizada por seus benefícios ambientais e sociais, pois promove a conservação da natureza e fortalece as comunidades", conceitua e vê a oficina como um espaço de troca e colaboração entre os dois saberes.
"É uma oportunidade de aprender práticas agrícolas sustentáveis de forma prática e interativa. Proporcionam um espaço de troca de conhecimentos e experiências, além de incentivar a colaboração entre agricultores e especialistas", observa, comentando que o desafio estará no repasse dos aprendizados para os demais moradores da sua aldeia.
"Vamos implementar agroecologia na comunidade organizando grupos de estudo e trabalho para compartilhar conhecimentos e técnicas agroecológicas, promovendo hortas comunitárias que utilizem práticas sustentáveis, como compostagem e rotação de culturas e oferecendo sabedoria e capacitações para agricultores e moradores interessados em adotar as práticas em agroecologia", concluiu.
"A Agroecologia combina práticas agrícolas tradicionais com inovação científica para promover a biodiversidade"
Proteção do território
Com unanimidade, os participantes da oficina perceberam que a agroecologia não é novidade para os povos indígenas. Ela é o que seus ancestrais já fazem há milhares de anos: plantar respeitando a terra, sem usar venenos e sem destruir a vegetação.
Com essa diferença conceitual de agricultura e produção de alimentos que chegou aos tempos atuais, a prática agroecológica se tornou resistência e proteção dos territórios indígenas. Enquanto o agronegócio e a monocultura avançam retirando toda a vegetação que protege e alimenta o solo, a agroecologia combina as variações de espécies agrícolas, frutíferas e florestais.
"Agroecologia é o que seus ancestrais já fazem há milhares de anos: plantar respeitando a terra, sem usar venenos e sem destruir a vegetação"
Os participantes chegaram, então, ao entendimento de que "não é sobre o que se colhe, mas é sobre o que se preserva, é sobre todo o território, sobre a cultura dos que ali vivem e sobre a vida de quem vive".
Jean Kokama válida a análise ao comentar que a forma de ocupação dos indígenas em seu território, que é uma ocupação que protege a natureza e meio ambiente, dá indicações para a construção de políticas indigenistas.
"[A agroecologia] também é algo que a gente coloca a respeito do nosso território, da nossa terra indígena. Essa prática só vem dar mais visibilidade em questão da nossa ocupação ali dentro do território. E aí, possibilita que as políticas que estão sendo realizadas para a população indígena sejam vistas pelo nosso lado. Eles veem que a gente está ali porque a gente quer cuidar e a gente quer salvar a natureza. E que a gente só está protegendo o que é nosso", apontou.
"A agroecologia também é algo que a gente coloca a respeito do nosso território, da nossa terra indígena"
Xare
Um arco-íris é um fenômeno físico, ótico, que se realiza quando a luz branca do sol atravessa gotículas de água suspensas na atmosfera, geralmente depois de uma grande chuva, e separa as cores que a compõe. Reflexão e refração da luz dentro das gotículas de água, resultam em um arco multicolorido no céu.
Na cultura Waimiri Atroari, o arco-íris pode ter a simbologia de encontro entre o mundo visível (material) e o invisível (espiritual), em uma cosmologia que conecta os diferentes reinos e os ciclos da vida que traz esperanças.
"O arco-íris pode ter a simbologia de encontro entre dois mundos em uma cosmologia que conecta os diferentes reinos e os ciclos da vida que traz esperanças"
Xare é arco-íris em Waimiri Atroari. E Xare é o Centro de Formação do Cimi Regional Norte 1. Lugar de encontro entre mundos visíveis e invisíveis, de vidas materiais e espirituais, de pessoas e culturas diversas que se unem em suas diferenças.
O intercambio sobre as Economias Indígenas reuniu os povos Kokama, Kambeba, Macuxi, Yek'wana, Wapichana e Mura no Xare. E, como em um arco-íris que tem as cores separadas, mas que estão lado a lado, esses povos se uniram em seus conhecimentos para aprender e compartilhar sobre os ciclos de vidas que alimentam a vida.
"O intercambio sobre as Economias Indígenas reuniu os povos Kokama, Kambeba, Macuxi, Yek'wana, Wapichana e Mura no Xare"
Para Hoadson Leonardo, missionário do Cimi Regional Norte 1 e administrador do Xare, esse é o sentido do Centro de Formação.
"O Centro de Formação Xare tem a sua importância porque é voltado para as diversas culturas indígenas, negras, ribeirinhas. O espaço favorece trocas de experiências entre esses povos, que mostram e demonstram as suas formas de fazer, de cuidar do ambiente, do planeta e das vidas. E quando vêm para cá com essa reciprocidade, trazendo as suas experiências em lidar com a natureza, em manejar espaços, territórios, roçados, ambientes, tanto em florestas quanto rios e lagos, todos se enriquecem, todos ganham", celebrou, destacando que a agroecologia, para além de sustentabilidade econômica e alimentar, é interação com mundo.
"O Centro de Formação Xare tem a sua importância porque é voltado para as diversas culturas indígenas, negras, ribeirinhas"
"Falar e fazer Agroecologia é, de fato, cuidar do planeta, cuidar da natureza. E o retorno para a vida é que a natureza também cuida da gente. A Agroecologia é justamente essa interação do ser humano com a natureza, é retornar ao equilíbrio e harmonia que o ser humano sempre viveu com o mundo natural, onde tudo concorre para o bem-estar do ser humano e do planeta", concluiu.
Além do aprendizado dos conceitos e sentidos da agroecologia e das técnicas de cuidados com o solo e plantios, o intercâmbio estimulou a criação de miniprojetos comunitários que poderão ser implantados nas aldeias, respeitando a realidade e os sonhos de cada povo. Alimentação saudável, geração de renda, fortalecimento da cultura e defesa do território caminharam lado a lado ao longo de toda a atividade.
"Falar e fazer Agroecologia é, de fato, cuidar do planeta, cuidar da natureza"
Roraima: no Surumu e em Maturuca
As oficinas previstas no Projeto Terra Mãe foram planejadas em diferentes locais da área de abrangência do Cimi Regional Norte 1. Já foram realizadas em Roraima, nas comunidades Surumu e Maturuka, e essa no Xare, em Manaus.
Em março desse ano aconteceu na comunidade Maturuca, região das Serras, município de Uiramutã, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, com os alunos da Escola Indígena José Allabamo, dos povos Macuxi e Wapichana.
"As oficinas previstas no Projeto Terra Mãe foram planejadas em diferentes locais da área de abrangência do Cimi Regional Norte 1"
As aulas teóricas abrangeram conceitos e técnicas de agroecologia e nas aulas práticas, ministradas por cinco técnicos indígenas em agroecologia da própria comunidade, foram construídas hortas em forma de mandala, uma técnica agroecológica que possibilita diversidade de culturas, aproveitamento de espaços e facilidade de manutenção.
Pe. James Murimi Njimia, missionário da Pastoral Indigenista de Roraima e assessor das oficinas de agroecologia, a importância da atividade está no envolvimento dos jovens e na produção de alimentos para abastecimento da comunidade, da merenda escolar e, também, para comercialização.
"As aulas teóricas e práticas foram ministradas por cinco técnicos indígenas em agroecologia da própria comunidade"
"Todos [os técnicos em agroecologia] foram formados na escola comunitária de Surumu e agora eles atuam na comunidade ajudando a produzir os alimentos que vão sustentar a comunidade e que, também, serão para venda e fornecimento para a merenda escolar", informou Pe. James, animado com a perspectiva de alcançar os objetivos: "o motivo principal é a sustentabilidade e autonomia da comunidade", concluiu.
Com a mesma perspectiva, caminhando na mesma direção e efetivando as mesmas ações, foi realizada em junho de 2025, a oficina na comunidade Surumu, município de Pacaraima, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
"O motivo principal é a sustentabilidade e autonomia da comunidade"
A área escolhida foi em um Sistema Agroflorestal (SAF), onde se combina espécies florestais e culturas agrícolas cultivadas de forma simultânea. É uma forma de agricultura que se aproxima dos ecossistemas naturais e que promove recuperação de solos degradados, melhora o microclima e a biodiversidade, além de possibilitar a geração de renda ao longo do tempo.
Segundo a coordenadora do Centro de Formação e uma das lideranças participantes da oficina, Clemilse Taurepang, o SAF já existe dede 2023, é mantido pelos alunos da escola da comunidade e "vem valorizando esse espaço com culturas diferentes, com árvores para produção de madeiras, árvores frutíferas e plantio de espécies leguminosas", explicou, destacando a participação dos alunos.
"Essa experiência de trabalho é muito boa, porque se vê pessoas que valorizam esse tipo de atividade, que é uma atividade em conjunto"
"Tudo isso de acordo com o planejamento que os alunos fazem na escola. São alunos de várias regiões. No momento tem alunos de quatro regiões, de quatro povos diferentes, que são Wai Wai, Wapichana, Macuxi e Ye'kwana", disse, explicando que a diversificação de espécies é uma prática indígena.
"Essa experiência de trabalho é muito boa, porque se vê pessoas que valorizam esse tipo de atividade, que é uma atividade em conjunto, não fazendo monocultura, fazendo plantações de diversas espécies, que valorizam muito o solo. E, também, com a nossa realidade como povo indígena, que a gente não trabalha só específico em uma só realidade, de uma cultura só, mas, de várias espécies porque aí vamos ter muito mais alimentos e outros produtos para outras necessidades", afirmou.
A realização das Oficinas de Agroecologia e do Projeto Terra Mãe reafirma o compromisso com a autonomia e os direitos dos povos indígenas, mostrando que a agroecologia e a economia indígena são caminhos vivos e possíveis para o presente e o futuro das comunidades.
https://cimi.org.br/2025/08/oficinas-agroecologia-economia-indigena/
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