From Indigenous Peoples in Brazil
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Meiembipe, o nome Tupi-Guarani que deu origem à cidade de Florianópolis
19/10/2025
Autor: Ana Menezes
Fonte: ND Mais - https://www.nsctotal.com.br
Primeira vereadora indígena de Florianópolis reflete sobre o apagamento do nome original da Ilha e defende que resgatar essa memória é um ato de resistência e pertencimento
"A história de Florianópolis não começa com um decreto. Começa com um canto, e esse canto ainda ecoa". A frase é de Ingrid Sateré Mawé, 1ª vereadora indígena da capital catarinense. Ela se refere ao primeiro nome que se tem registro utilizado para se referir à Ilha de Santa Catarina, Meiembipe, dado pelos indígenas Carijós. A palavra é de origem Tupi-Guarani, e significa "elevação de montanhas ao longo do mar".
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Segundo o historiador e membro do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC), Francisco do Vale Pereira, o nome remonta aos primeiros registros da Ilha em mapas de navegação e na cartografia dos séculos XV e XVI.
- A Ilha oferecia um porto abrigado para a atracagem de expedições, navegadores e aventureiros que se orientavam em direção às Américas no Atlântico Sul. O local era usado para reabastecimento de água potável e obtenção de madeira de qualidade para reparo de embarcações, além de servir para descanso da tripulação - explica.
Ao chegarem, os navegadores encontravam nativos ou povos originários que já reconheciam a Ilha. De acordo com o historiador, era ao entrar em contato com os povos Carijós que os viajantes sabiam que o local era conhecido como Meiembipe.
- O nome significa uma montanha próxima ao canal. Esta referência geográfica é o ponto mais próximo entre a Ilha e o continente, onde a Ponte Hercílio Luz está construída hoje. O objetivo ao parar neste porto natural era seguir as explorações até o Rio da Prata, que era o grande interesse das expedições - diz o historiador.De acordo com Francisco, a Ilha foi conhecida como Meiembipe até o período do marco histórico de 1500, com a chegada da esquadra de Pedro Álvares Cabral, que oficializou a existência do território pertencente a Portugal. Ainda, antes de 1526, era referenciada também como Ilha dos Patos ou Lagoa dos Patos, devido à quantidade de pássaros sazonais e migrantes.
O nome se manteve, até que houve o reconhecimento da população como povoação de Nossa Senhora do Desterro em 1673. Seguiram-se os nomes Vila de Nossa Senhora do Desterro e Desterro, até que em 1893, após a Revolução Federalista, a cidade se tornou Florianópolis, em homenagem ao Marechal Floriano Peixoto, conhecido pelo autoritarismo e a repressão violenta aos opositores.
Em Meiembipe, "Ilha não era descoberta, era vivida"
Ingrid Sateré Mawé é natural de Mawé, uma porção de terra nas águas do médio rio Amazonas. Para a vereadora, a extinção do nome Meiembipe representa um apagamento.
- Esse nome é mais do que uma palavra indígena, é uma forma de enxergar o mundo. Meiembipe é a terra dos povos carijós, do Tupi Guarani. A Ilha não era descoberta, ela era vivida, sentida, nomeada. E o nome dizia tudo: montanha e mar, corpo e espírito, equilíbrio. Mas aí veio a colonização, vieram os europeus, as cruzes, os canhões, os decretos e junto com as novas construções vieram os apagamentos - afirma ela.
Segundo a vereadora, quando Meiembipe deixou de ser usado e deu lugar a Desterro, e mais tarde a Florianópolis, o nome que expressava vida e pertencimento foi substituído por um símbolo de poder político e imposição colonial.
- Essa transição é um espelho do Brasil, uma história contada do alto, mas vivida aqui embaixo, por quem teve que resistir para continuar existindo - diz.
Apesar dos séculos de silenciamento, Ingrid acredita que Meiembipe ainda resiste na memória, na paisagem e nos nomes que sobrevivem no cotidiano da Ilha, como Itaguaçu, Pirajubaé e Anhatomirim.
- Meiembipe está nas histórias que o vento conta, nas marisqueiras, nas comunidades tradicionais, nos povos indígenas que seguem lutando, está na montanha que ainda olha o mar. E lembrar disso é um ato político - defende.
Para ela, resgatar o nome original é uma forma de reparação histórica, que devolveria o pertencimento e o direito dos povos originários de existirem na própria história, além de uma possibilidade de criar um futuro diferente.
- Florianópolis fez 352 anos, mas Meiembipe é muito mais antiga e talvez o futuro que a gente busca, mais sustentável, mais humano, mais nosso, esteja justamente lá atrás, no jeito de viver de quem chamava essa ilha de montanha ao longo do mar. E é por isso que eu gosto de dizer: a história de Florianópolis não começa com um decreto, começa com um canto e esse canto ainda ecoa em cada onda, em cada vento, em cada mulher que resiste nessa Ilha.
História de povos originários está presente na Ilha, diz historiador
Diversos vestígios indicam a presença de povos originários no território onde hoje está Florianópolis, de acordo com Francisco. Um dos exemplos mais expressivos são as inscrições rupestres, encontradas em locais como o Costão do Santinho, além da Praia da Armação, Pântano do Sul e Ilha do Campeche. Essas formações, segundo Francisco, revelam aspectos da cultura e da espiritualidade dos povos que habitaram a região há milhares de anos.
Como visitar as principais inscrições rupestres na Ilha de Santa Catarina
Outro importante vestígio são os sambaquis, grandes montes de conchas erguidos por povos coletores, que funcionavam como marcos de referência. De acordo com o historiador, eram locais aos quais os grupos nômades retornavam, pois sabiam que ali encontrariam sustento.
Parte deste material coletado desses sítios está preservada no Museu do Sambaqui, mantido pelo Colégio Catarinense, com acervo reunido pelo padre Rohr.
Arqueólogos descobrem nova hipótese sobre ocupação do litoral catarinense
Ainda, as escavações arqueológicas também têm revelado cemitérios, ossadas, instrumentos e objetos cerâmicos, frequentemente descobertos durante obras de exploração imobiliária, conforme o historiador. Em vista disso, para Francisco, o esquecimento dessa herança é sintomático.
- Alguns podem dizer que é um apagamento, outros que é provocativamente um esquecimento. Podemos dizer também que são estratégias de silenciamento - reflete o historiador, destacando a necessidade de reconhecer e valorizar as raízes indígenas que moldaram a história da Ilha.
https://www.nsctotal.com.br/noticias/meiembipe-o-nome-tupi-guarani-que-deu-origem-a-cidade-de-florianopolis
"A história de Florianópolis não começa com um decreto. Começa com um canto, e esse canto ainda ecoa". A frase é de Ingrid Sateré Mawé, 1ª vereadora indígena da capital catarinense. Ela se refere ao primeiro nome que se tem registro utilizado para se referir à Ilha de Santa Catarina, Meiembipe, dado pelos indígenas Carijós. A palavra é de origem Tupi-Guarani, e significa "elevação de montanhas ao longo do mar".
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Segundo o historiador e membro do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC), Francisco do Vale Pereira, o nome remonta aos primeiros registros da Ilha em mapas de navegação e na cartografia dos séculos XV e XVI.
- A Ilha oferecia um porto abrigado para a atracagem de expedições, navegadores e aventureiros que se orientavam em direção às Américas no Atlântico Sul. O local era usado para reabastecimento de água potável e obtenção de madeira de qualidade para reparo de embarcações, além de servir para descanso da tripulação - explica.
Ao chegarem, os navegadores encontravam nativos ou povos originários que já reconheciam a Ilha. De acordo com o historiador, era ao entrar em contato com os povos Carijós que os viajantes sabiam que o local era conhecido como Meiembipe.
- O nome significa uma montanha próxima ao canal. Esta referência geográfica é o ponto mais próximo entre a Ilha e o continente, onde a Ponte Hercílio Luz está construída hoje. O objetivo ao parar neste porto natural era seguir as explorações até o Rio da Prata, que era o grande interesse das expedições - diz o historiador.De acordo com Francisco, a Ilha foi conhecida como Meiembipe até o período do marco histórico de 1500, com a chegada da esquadra de Pedro Álvares Cabral, que oficializou a existência do território pertencente a Portugal. Ainda, antes de 1526, era referenciada também como Ilha dos Patos ou Lagoa dos Patos, devido à quantidade de pássaros sazonais e migrantes.
O nome se manteve, até que houve o reconhecimento da população como povoação de Nossa Senhora do Desterro em 1673. Seguiram-se os nomes Vila de Nossa Senhora do Desterro e Desterro, até que em 1893, após a Revolução Federalista, a cidade se tornou Florianópolis, em homenagem ao Marechal Floriano Peixoto, conhecido pelo autoritarismo e a repressão violenta aos opositores.
Em Meiembipe, "Ilha não era descoberta, era vivida"
Ingrid Sateré Mawé é natural de Mawé, uma porção de terra nas águas do médio rio Amazonas. Para a vereadora, a extinção do nome Meiembipe representa um apagamento.
- Esse nome é mais do que uma palavra indígena, é uma forma de enxergar o mundo. Meiembipe é a terra dos povos carijós, do Tupi Guarani. A Ilha não era descoberta, ela era vivida, sentida, nomeada. E o nome dizia tudo: montanha e mar, corpo e espírito, equilíbrio. Mas aí veio a colonização, vieram os europeus, as cruzes, os canhões, os decretos e junto com as novas construções vieram os apagamentos - afirma ela.
Segundo a vereadora, quando Meiembipe deixou de ser usado e deu lugar a Desterro, e mais tarde a Florianópolis, o nome que expressava vida e pertencimento foi substituído por um símbolo de poder político e imposição colonial.
- Essa transição é um espelho do Brasil, uma história contada do alto, mas vivida aqui embaixo, por quem teve que resistir para continuar existindo - diz.
Apesar dos séculos de silenciamento, Ingrid acredita que Meiembipe ainda resiste na memória, na paisagem e nos nomes que sobrevivem no cotidiano da Ilha, como Itaguaçu, Pirajubaé e Anhatomirim.
- Meiembipe está nas histórias que o vento conta, nas marisqueiras, nas comunidades tradicionais, nos povos indígenas que seguem lutando, está na montanha que ainda olha o mar. E lembrar disso é um ato político - defende.
Para ela, resgatar o nome original é uma forma de reparação histórica, que devolveria o pertencimento e o direito dos povos originários de existirem na própria história, além de uma possibilidade de criar um futuro diferente.
- Florianópolis fez 352 anos, mas Meiembipe é muito mais antiga e talvez o futuro que a gente busca, mais sustentável, mais humano, mais nosso, esteja justamente lá atrás, no jeito de viver de quem chamava essa ilha de montanha ao longo do mar. E é por isso que eu gosto de dizer: a história de Florianópolis não começa com um decreto, começa com um canto e esse canto ainda ecoa em cada onda, em cada vento, em cada mulher que resiste nessa Ilha.
História de povos originários está presente na Ilha, diz historiador
Diversos vestígios indicam a presença de povos originários no território onde hoje está Florianópolis, de acordo com Francisco. Um dos exemplos mais expressivos são as inscrições rupestres, encontradas em locais como o Costão do Santinho, além da Praia da Armação, Pântano do Sul e Ilha do Campeche. Essas formações, segundo Francisco, revelam aspectos da cultura e da espiritualidade dos povos que habitaram a região há milhares de anos.
Como visitar as principais inscrições rupestres na Ilha de Santa Catarina
Outro importante vestígio são os sambaquis, grandes montes de conchas erguidos por povos coletores, que funcionavam como marcos de referência. De acordo com o historiador, eram locais aos quais os grupos nômades retornavam, pois sabiam que ali encontrariam sustento.
Parte deste material coletado desses sítios está preservada no Museu do Sambaqui, mantido pelo Colégio Catarinense, com acervo reunido pelo padre Rohr.
Arqueólogos descobrem nova hipótese sobre ocupação do litoral catarinense
Ainda, as escavações arqueológicas também têm revelado cemitérios, ossadas, instrumentos e objetos cerâmicos, frequentemente descobertos durante obras de exploração imobiliária, conforme o historiador. Em vista disso, para Francisco, o esquecimento dessa herança é sintomático.
- Alguns podem dizer que é um apagamento, outros que é provocativamente um esquecimento. Podemos dizer também que são estratégias de silenciamento - reflete o historiador, destacando a necessidade de reconhecer e valorizar as raízes indígenas que moldaram a história da Ilha.
https://www.nsctotal.com.br/noticias/meiembipe-o-nome-tupi-guarani-que-deu-origem-a-cidade-de-florianopolis
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