From Indigenous Peoples in Brazil
News
Tombores de guerra
09/01/2004
Fonte: OESP, Notas e Informações, p. A3
Tambores de guerra
Há dias concluíamos um editorial nesta página, a respeito da nova reserva indígena Raposa Serra do Sol, cuja demarcação o ministro da Justiça prometeu levar à homologação presidencial este mês, com a seguinte indagação: "Será, mesmo, que a nova megarreserva de Roraima poderá ser homologada no mês entrante 'sem conflito' (como prometera o ministro)?
Esperemos que o ministro Bastos tenha encontrado a fórmula mágica."
Infelizmente, ele não a encontrou, como demonstra o amplo movimento de protesto de fazendeiros e índios que acabou fechando todas as estradas de Roraima e leva em seu bojo um potencial de extrema violência, prestes a ser desencadeada e generalizada na região.
O elementar bom senso dizia que uma vasta área de 1,6 milhão de hectares, contendo dois municípios e forte atividade agrícola, com grandes fazendas de arroz, objeto de disputas - entre comunidades indígenas e produtores rurais - há pelo menos 20 anos, não poderia ensejar uma solução demarcatória em poucos dias, sem a antecedência de uma longa, cuidadosa e consistente negociação, entre todas as partes envolvidas, a partir de um bem elaborado plano governamental. Por mais que o ministro Márcio Thomaz Bastos pretendesse atender aos conspícuos interesses fundiários de um total de 15 mil índios, assim como detectasse o máximo de interesse da sociedade brasileira em preservar uma imensa quantidade de terras para os macuxis, ingaricós, taurepangues, uapixanas e patamonas, já transparecia a temeridade de deslocar-se inúmeras famílias não indígenas que produziam naquelas terras e/ou habitavam as duas cidades - Uiramutã e Pacaraimas - que ficam dentro da reserva Raposa Serra do Sol. Os moradores não-índios reivindicavam que a demarcação fosse feita em forma de ilhas, deixando de fora da reserva as propriedades rurais e as duas cidades, pois não seria fácil saírem do lugar onde já deitaram raízes, criam os filhos e asseguram os meios da própria sobrevivência.
Agora, no entanto, percebe-se que até uma grande parcela dos índios e seus líderes protestam contra a forma de demarcação implantada pelo governo, tanto que o líder indígena Silvestre Leocádio declarou: "Desejamos viver em paz com o homem branco. Índio não pode ficar isolado e jogado à sua sorte."
Tanto Leocádio quanto os produtores se dizem descontentes com "a falta de atenção do governo federal", afirmando que, se houvesse interesse em atender às comunidades, o governo teria enviado para a região o Grupo de Trabalho Interministerial, criado para estudar esse caso específico.
Assim, as conseqüências da precipitação "homologatória" do governo, como era de se esperar, logo se fizeram sentir: na divisa de Roraima com o Amazonas - a 530 quilômetros de Boa Vista -, na fronteira com a Venezuela - a 200 quilômetros da capital -, assim como na cidade de Bonfim - a 130 quilômetros de Boa Vista -, as estradas foram fechadas com máquinas agrícolas. Em outra frente contra a demarcação, cerca de 200 pessoas depredaram a sede da missão indígena do Sumuru (na madrugada de terça-feira), agrediram os padres Ronildo Pinto França e Cézar Avellaneda, o Irmão Juan Carlos Martinez e um grupo de sete estudantes de Manaus, os quais estariam sendo mantidos como reféns - segundo informações fornecidas pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), entidade, aliás, que tem liderado as reivindicações demarcatórias dos índios e que, assumindo posições sempre radicais, tem sido uma das maiores insufladoras de violência nessa área. E também há notícia de que estariam detidos nove alunos indígenas, que freqüentam uma escola mantida em Sumuru.
Se já não bastasse esse imbróglio em Roraima, no sul de Mato Grosso a situação entre índios e produtores rurais já está em pé de guerra, com 3.700 índios caiovás-guaranis expulsando fazendeiros, proprietários, arrendatários e funcionários dos imóveis rurais, ocupando seis fazendas e ameaçando entrar em outras nove, sob alegação de que têm a seu favor documentos da Fundação Nacional do Índio (Funai), nos quais são apontados como proprietários da área ao redor da Aldeia Campo Lindo, entre Iguatemi e Japorã, junto à fronteira com o Paraguai. Com tais "explosivos" documentos - antes que sejam submetidos à apreciação da Justiça -, quaisquer comunidades indígenas podem ser levadas, de boa ou má-fé, a ungir-se e aparatar-se para a guerra, para recuperar "suas terras" em quaisquer cantos do território nacional - sem cachimbos de paz que as possam segurar.
OESP, 09/01/2004, Notas e Informações, p. A3
Há dias concluíamos um editorial nesta página, a respeito da nova reserva indígena Raposa Serra do Sol, cuja demarcação o ministro da Justiça prometeu levar à homologação presidencial este mês, com a seguinte indagação: "Será, mesmo, que a nova megarreserva de Roraima poderá ser homologada no mês entrante 'sem conflito' (como prometera o ministro)?
Esperemos que o ministro Bastos tenha encontrado a fórmula mágica."
Infelizmente, ele não a encontrou, como demonstra o amplo movimento de protesto de fazendeiros e índios que acabou fechando todas as estradas de Roraima e leva em seu bojo um potencial de extrema violência, prestes a ser desencadeada e generalizada na região.
O elementar bom senso dizia que uma vasta área de 1,6 milhão de hectares, contendo dois municípios e forte atividade agrícola, com grandes fazendas de arroz, objeto de disputas - entre comunidades indígenas e produtores rurais - há pelo menos 20 anos, não poderia ensejar uma solução demarcatória em poucos dias, sem a antecedência de uma longa, cuidadosa e consistente negociação, entre todas as partes envolvidas, a partir de um bem elaborado plano governamental. Por mais que o ministro Márcio Thomaz Bastos pretendesse atender aos conspícuos interesses fundiários de um total de 15 mil índios, assim como detectasse o máximo de interesse da sociedade brasileira em preservar uma imensa quantidade de terras para os macuxis, ingaricós, taurepangues, uapixanas e patamonas, já transparecia a temeridade de deslocar-se inúmeras famílias não indígenas que produziam naquelas terras e/ou habitavam as duas cidades - Uiramutã e Pacaraimas - que ficam dentro da reserva Raposa Serra do Sol. Os moradores não-índios reivindicavam que a demarcação fosse feita em forma de ilhas, deixando de fora da reserva as propriedades rurais e as duas cidades, pois não seria fácil saírem do lugar onde já deitaram raízes, criam os filhos e asseguram os meios da própria sobrevivência.
Agora, no entanto, percebe-se que até uma grande parcela dos índios e seus líderes protestam contra a forma de demarcação implantada pelo governo, tanto que o líder indígena Silvestre Leocádio declarou: "Desejamos viver em paz com o homem branco. Índio não pode ficar isolado e jogado à sua sorte."
Tanto Leocádio quanto os produtores se dizem descontentes com "a falta de atenção do governo federal", afirmando que, se houvesse interesse em atender às comunidades, o governo teria enviado para a região o Grupo de Trabalho Interministerial, criado para estudar esse caso específico.
Assim, as conseqüências da precipitação "homologatória" do governo, como era de se esperar, logo se fizeram sentir: na divisa de Roraima com o Amazonas - a 530 quilômetros de Boa Vista -, na fronteira com a Venezuela - a 200 quilômetros da capital -, assim como na cidade de Bonfim - a 130 quilômetros de Boa Vista -, as estradas foram fechadas com máquinas agrícolas. Em outra frente contra a demarcação, cerca de 200 pessoas depredaram a sede da missão indígena do Sumuru (na madrugada de terça-feira), agrediram os padres Ronildo Pinto França e Cézar Avellaneda, o Irmão Juan Carlos Martinez e um grupo de sete estudantes de Manaus, os quais estariam sendo mantidos como reféns - segundo informações fornecidas pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), entidade, aliás, que tem liderado as reivindicações demarcatórias dos índios e que, assumindo posições sempre radicais, tem sido uma das maiores insufladoras de violência nessa área. E também há notícia de que estariam detidos nove alunos indígenas, que freqüentam uma escola mantida em Sumuru.
Se já não bastasse esse imbróglio em Roraima, no sul de Mato Grosso a situação entre índios e produtores rurais já está em pé de guerra, com 3.700 índios caiovás-guaranis expulsando fazendeiros, proprietários, arrendatários e funcionários dos imóveis rurais, ocupando seis fazendas e ameaçando entrar em outras nove, sob alegação de que têm a seu favor documentos da Fundação Nacional do Índio (Funai), nos quais são apontados como proprietários da área ao redor da Aldeia Campo Lindo, entre Iguatemi e Japorã, junto à fronteira com o Paraguai. Com tais "explosivos" documentos - antes que sejam submetidos à apreciação da Justiça -, quaisquer comunidades indígenas podem ser levadas, de boa ou má-fé, a ungir-se e aparatar-se para a guerra, para recuperar "suas terras" em quaisquer cantos do território nacional - sem cachimbos de paz que as possam segurar.
OESP, 09/01/2004, Notas e Informações, p. A3
The news items published by the Indigenous Peoples in Brazil site are researched daily from a variety of media outlets and transcribed as presented by their original source. ISA is not responsible for the opinios expressed or errors contained in these texts. Please report any errors in the news items directly to the source