From Indigenous Peoples in Brazil
The printable version is no longer supported and may have rendering errors. Please update your browser bookmarks and please use the default browser print function instead.

News

A tristeza do líder xavante

11/10/2007

Fonte: CB, Brasil, p. 17



A tristeza do líder xavante
Funai alega problemas burocráticos e deixa cacique Aniceto Tsudzavéré, 80 anos, vagando pelas ruas de Brasília em busca de comida e hospedagem. Três semanas atrás, o índio se encontrou com Lula

Paloma Oliveto
Da equipe do Correio

Há três semanas, o cacique Aniceto Tsudzavéré conversava, em Brasília, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há dois dias, perambulava pela Asa Sul, procurando um lugar para dormir. Um dos líderes xavantes mais reconhecidos no Brasil e no mundo, o cacique não conseguiu que a Fundação Nacional do Índio (Funai) fornecesse alimentação e hospedagem para ele. Não fossem R$ 30 doados pelo cineasta Armando Sampaio Lacerda, diretor do filme Juruna, o Espírito da Floresta, ele teria passado a noite no pátio externo da Funai ou em alguma parada de ônibus. Aniceto tem 80 anos.

O cacique chegou à capital às 9h30 de terça-feira para conversar com o presidente da Funai, Márcio Augusto de Meira. Viajou 10 horas de ônibus, desde Barra do Garças (MT), onde mora, na reserva São Marcos. Veio relatar a situação de seu povo que, segundo Aniceto, passa fome e enfrenta problemas de saúde, como desnutrição. Ele mesmo não está bem. Fumante, o cacique pegou pneumonia dupla. Por causa da viagem cansativa, sente dores pelo corpo. Mas não tem dinheiro para comprar remédio.

Aniceto sente-se desrespeitado. "Eu não sou qualquer um", repete. Juntamente com Mário Juruna, morto em 2002, o cacique foi um dos responsáveis pela homologação da reserva. Na década de 1970, percorreu a pé os 633km que separam Barra do Garças de Brasília. Veio conversar com o então presidente, general Emílio Garrastazu Médici. Furou a barreira de seguranças e conseguiu que o ditador militar assinasse o decreto de homologação da área, que tem 188 mil hectares. "Naquela época, os fazendeiros invadiam nossa terra para fazer pasto. Os bois comiam nossa plantação", recorda. Hoje, diz o cacique, não há problemas com produtores rurais. "O problema é a Funai", acusa.

O xavante, que deve ir embora de Brasília hoje, diz que deixa a capital entristecido. "Na terça-feira, passei o dia inteiro nessa Funai, tentando conseguir dinheiro para comer e um lugar para dormir. Meu corpo todo está doendo." Ontem, acompanhado pela reportagem do Correio, Aniceto voltou ao órgão e conseguiu ser recebido.

No Serviço de Atendimento ao Índio em Trânsito, a servidora Hilda Araújo Azevedo explicou ao índio que, para receber auxílio da Funai, é necessário que a administração regional solicite o recurso à sede. De acordo com a fundação, o pedido não foi feito. "Eu falei que vinha, sim. É muita falta de respeito. Eu tenho 80 anos, sou reconhecido pelo mundo", lamenta. "Toda vida, a Funai tenta dobrar meu pescoço. Mas não vai conseguir. Não estou lutando por mim. É pelo meu povo."

Desprotegidos
De acordo com Aniceto, com a reestruturação da Funai, os índios ficaram desprotegidos. O órgão contava com 45 administrações regionais e 337 postos indígenas. Com as mudanças, anunciadas neste ano, o número de administrações regionais passou para 12. Foram criadas outras 39, locais, mais 315 postos. Por meio da assessoria de imprensa, a Funai informou que a idéia foi descentralizar as decisões, aproximando mais as administrações dos índios. O xavante não concorda. "Primeiro, nenhum líder foi consultado. Segundo, porque não é descentralização. Isso só afasta mais a Funai dos índios", diz.

Na reserva, onde vivem 4 mil índios, faltam sementes para plantio, de acordo com o cacique. "Só conseguimos plantar milho e feijão. Precisamos plantar abóbora, batata, inhame, melancia. Não é para vender, é para as pessoas comerem. Os índios estão passando fome. Não têm ferramenta para mexer na terra", reclama. Outro problema relatado pelo xavante é que, há cinco meses, os índios deixaram de receber cestas básicas, distribuídas às famílias desde o ano passado. O presidente da Funai prometeu resolver o problema. "Não vai resolver nada", diz, descrente.

Para Aniceto, só o presidente Lula pode mudar a situação. No II Encontro Nacional dos Povos da Floresta, que ocorreu há duas semanas no Teatro Nacional Claudio Santoro, o cacique se aproximou do presidente. "Contei pra ele tudo. Ele disse que não sabia, que essas coisas não chegam nele. E que ia dar um puxão de orelhas no Ministério da Justiça", conta.

CB, 11/10/2007, Brasil, p. 17
 

The news items published by the Indigenous Peoples in Brazil site are researched daily from a variety of media outlets and transcribed as presented by their original source. ISA is not responsible for the opinios expressed or errors contained in these texts. Please report any errors in the news items directly to the source