From Indigenous Peoples in Brazil
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News
Entrevista: caso assassinato adolescente Xavante
03/07/2008
Fonte: Coiab - www.coiab.com.br
No dia 25 de junho, na Casai de Brasília (DF), Jaira Pewewiõ Tsiruipi Xavante, 16 anos, morreu em decorrência dos bárbaros atos de violência sexual aos quais foi submetida. As circunstâncias da morte da adolescente são obscuras, e a investigação do crime não contribui para esclarecimentos, pois tem se mostrado deficiente.
Nesta entrevista, o secretário-geral da COIAB, Saturnino Wapotowe Rudzaneedi Xavante, esclarece algumas informações distorcidas que têm sido divulgadas sobre o ocorrido. Saturnino faz parte da etnia Xavante, e era primo da vítima.
1. Quem era a adolescente Jaira Pewewiõ Tsiruipi Xavante, 16 anos, que foi brutalmente torturada e morreu na Casai, em Brasília?
Saturnino - Na cultura Xavante, as pessoas que moram na aldeia formam todos uma grande família. Jaira nasceu na Aldeia São Pedro, município de Campinápolis, em Mato Grosso. Logo nos seus primeiros meses de vida, ela teve meningite, o que acarretou seqüelas que a deixaram com limitações. Ela tinha problemas locomotores e dificuldade para falar, também tinha o desenvolvimento mental mais lento que o de outras crianças. Mas ela reconhecia a família, era uma menina carinhosa e dócil. Na cultura Xavante, o homem tem duas mulheres. Portanto, ela vivia na mesma casa com o pai, a mãe e com a segunda mulher do seu pai, que são irmãs. Ou seja, a segunda mulher do pai de Jaira, era também sua tia. Ela recebia todos os cuidados que precisava. Meu tio, que era o pai dela, era auxiliar de enfermagem com mais de vinte anos de profissão, o que ajudava nos cuidados especiais que ela precisava. Ela recebia cuidados e carinho da família, não é a toa que havia completado 16 anos. Estava recebendo tratamento na CASAI, evoluindo e a família tinha esperança de que ela se recuperaria totalmente.
2. Veículos de comunicação nacional tem divulgado que a adolescente Jaira foi violentada em um ritual que faz parte da cultura Xavante. Isto é uma realidade?
Saturnino - Esta informação não é verdadeira. Poucos povos indígenas, tradicionalmente, não permitem que pessoas que nascem com algum tido de deficiência continuem a viver; mas isto não faz parte da cultura Xavante. Ou seja, não faz parte da tradição Xavante matar pessoas portadoras de deficiência. Também não há registros de rituais envolvendo empalamento entre o povo Xavante. Portanto, esta informação de que a adolescente foi morta em um ritual da cultura Xavante é inverídica. Faz parte do caráter do povo Xavante a espiritualidade. Somos um povo muito sensível, e acreditamos em Danhimite (Deus). Estes atos não fazem parte dos nossos costumes. Desafio qualquer pessoa a provar que este tipo de violência faz parte de rituais tradicionalmente praticados na cultura Xavante. Ainda que fizesse, isto seria inaceitável na realidade em que o povo Xavante vive atualmente. Todos têm o direito a vida. Ninguém a não ser Danhimite tem o direito de tirar a vida dos nossos semelhantes.
3. Se os rituais com prática de empalamento não fazem parte da cultura Xavante, quem divulgou esta informação de que a adolescente teria sido morta em um ritual que promove a violência sexual?
Saturnino - Esta informação foi divulgada de forma equivocada pela direção da CASAI, para se isentar de suas responsabilidades. Quando sofreu os abusos, a adolescente estava internada na CASAI, sob seus cuidados. Nada justifica que uma menina totalmente desprotegida tenha sido barbaramente torturada, sem que ninguém tenha visto nada. Jaira tinha deficiências em decorrência de uma meningite, mas não era muda. Ou seja, podia gritar por socorro. Como ninguém ouviu nada? Isto só demonstra a negligência da FUNASA em relação aos indígenas aos quais deveria prestar atendimento de saúde. No caso de Jaira, a situação é ainda mais grave, pois demonstra a falta de segurança aos quais os indígenas, que deveriam receber tratamento médico, estão expostos.
4. Você tem críticas a forma como a mídia tem divulgado a morte de Jaira?
Saturnino - Os jornalistas têm contribuído para a falta de esclarecimentos sobre este caso. Infelizmente, grande parte dos profissionais de comunicação não está preparada para lidar com assuntos relacionados aos povos indígenas, pois desconhece suas culturas e tradições. O resultado disto é a divulgação de informações que não procedem, como aconteceu no caso da morte de Jaira. Nos temas relacionados aos povos indígenas, dificilmente, os próprios indígenas são entrevistados. Somos discriminados até na hora de ter um espaço na mídia. Argumentaram que os parentes de Jaira não sabem falar português. Mas isto não é verdade. A mãe de Jaira, que a estava acompanhando na CASAI, fala português muito bem. Alguém já viu alguma entrevista com os parentes de Jaira na mídia? Infelizmente, os veículos de comunicação só procuraram as fontes oficiais para as noticias. Além de estarem traumatizados com a barbaridade que aconteceu, mais uma vez os indígenas não tiveram a oportunidade de falar ou expor sua versão dos fatos.
5. Como tem sido a investigação do crime? Que providências a família ou organizações indígenas tomarão para que este não seja mais um caso impune de violência contra os povos indígenas?
Saturnino - A investigação está seriamente comprometida, porque o cenário do crime não foi preservado. Ou seja, como vão colher impressões digitais, ou outras provas para encontrar o culpado? Além disso, quem deveria tomar a frente das investigações deveria ser a Polícia Federal. Mas, atualmente, é a Polícia Civil do DF que está investigando o caso. Não duvidamos da capacidade da Polícia Civil, mas por se tratar da morte de uma indígena, na FUNASA, o âmbito é federal. A família ainda está muito abalada com o ocorrido. As organizações indígenas recorrerão às instâncias federais para que este caso tenha uma resolução e o culpado seja punido no rigor da lei. Este é um momento que chama atenção para o descaso aos quais os povos indígenas estão submetidos, principalmente, em relação à saúde.
Mais informações: Saturnino Xavante - (92) 8181-5029; (61)8163-2257
sat_xav@hotmail.com
Nesta entrevista, o secretário-geral da COIAB, Saturnino Wapotowe Rudzaneedi Xavante, esclarece algumas informações distorcidas que têm sido divulgadas sobre o ocorrido. Saturnino faz parte da etnia Xavante, e era primo da vítima.
1. Quem era a adolescente Jaira Pewewiõ Tsiruipi Xavante, 16 anos, que foi brutalmente torturada e morreu na Casai, em Brasília?
Saturnino - Na cultura Xavante, as pessoas que moram na aldeia formam todos uma grande família. Jaira nasceu na Aldeia São Pedro, município de Campinápolis, em Mato Grosso. Logo nos seus primeiros meses de vida, ela teve meningite, o que acarretou seqüelas que a deixaram com limitações. Ela tinha problemas locomotores e dificuldade para falar, também tinha o desenvolvimento mental mais lento que o de outras crianças. Mas ela reconhecia a família, era uma menina carinhosa e dócil. Na cultura Xavante, o homem tem duas mulheres. Portanto, ela vivia na mesma casa com o pai, a mãe e com a segunda mulher do seu pai, que são irmãs. Ou seja, a segunda mulher do pai de Jaira, era também sua tia. Ela recebia todos os cuidados que precisava. Meu tio, que era o pai dela, era auxiliar de enfermagem com mais de vinte anos de profissão, o que ajudava nos cuidados especiais que ela precisava. Ela recebia cuidados e carinho da família, não é a toa que havia completado 16 anos. Estava recebendo tratamento na CASAI, evoluindo e a família tinha esperança de que ela se recuperaria totalmente.
2. Veículos de comunicação nacional tem divulgado que a adolescente Jaira foi violentada em um ritual que faz parte da cultura Xavante. Isto é uma realidade?
Saturnino - Esta informação não é verdadeira. Poucos povos indígenas, tradicionalmente, não permitem que pessoas que nascem com algum tido de deficiência continuem a viver; mas isto não faz parte da cultura Xavante. Ou seja, não faz parte da tradição Xavante matar pessoas portadoras de deficiência. Também não há registros de rituais envolvendo empalamento entre o povo Xavante. Portanto, esta informação de que a adolescente foi morta em um ritual da cultura Xavante é inverídica. Faz parte do caráter do povo Xavante a espiritualidade. Somos um povo muito sensível, e acreditamos em Danhimite (Deus). Estes atos não fazem parte dos nossos costumes. Desafio qualquer pessoa a provar que este tipo de violência faz parte de rituais tradicionalmente praticados na cultura Xavante. Ainda que fizesse, isto seria inaceitável na realidade em que o povo Xavante vive atualmente. Todos têm o direito a vida. Ninguém a não ser Danhimite tem o direito de tirar a vida dos nossos semelhantes.
3. Se os rituais com prática de empalamento não fazem parte da cultura Xavante, quem divulgou esta informação de que a adolescente teria sido morta em um ritual que promove a violência sexual?
Saturnino - Esta informação foi divulgada de forma equivocada pela direção da CASAI, para se isentar de suas responsabilidades. Quando sofreu os abusos, a adolescente estava internada na CASAI, sob seus cuidados. Nada justifica que uma menina totalmente desprotegida tenha sido barbaramente torturada, sem que ninguém tenha visto nada. Jaira tinha deficiências em decorrência de uma meningite, mas não era muda. Ou seja, podia gritar por socorro. Como ninguém ouviu nada? Isto só demonstra a negligência da FUNASA em relação aos indígenas aos quais deveria prestar atendimento de saúde. No caso de Jaira, a situação é ainda mais grave, pois demonstra a falta de segurança aos quais os indígenas, que deveriam receber tratamento médico, estão expostos.
4. Você tem críticas a forma como a mídia tem divulgado a morte de Jaira?
Saturnino - Os jornalistas têm contribuído para a falta de esclarecimentos sobre este caso. Infelizmente, grande parte dos profissionais de comunicação não está preparada para lidar com assuntos relacionados aos povos indígenas, pois desconhece suas culturas e tradições. O resultado disto é a divulgação de informações que não procedem, como aconteceu no caso da morte de Jaira. Nos temas relacionados aos povos indígenas, dificilmente, os próprios indígenas são entrevistados. Somos discriminados até na hora de ter um espaço na mídia. Argumentaram que os parentes de Jaira não sabem falar português. Mas isto não é verdade. A mãe de Jaira, que a estava acompanhando na CASAI, fala português muito bem. Alguém já viu alguma entrevista com os parentes de Jaira na mídia? Infelizmente, os veículos de comunicação só procuraram as fontes oficiais para as noticias. Além de estarem traumatizados com a barbaridade que aconteceu, mais uma vez os indígenas não tiveram a oportunidade de falar ou expor sua versão dos fatos.
5. Como tem sido a investigação do crime? Que providências a família ou organizações indígenas tomarão para que este não seja mais um caso impune de violência contra os povos indígenas?
Saturnino - A investigação está seriamente comprometida, porque o cenário do crime não foi preservado. Ou seja, como vão colher impressões digitais, ou outras provas para encontrar o culpado? Além disso, quem deveria tomar a frente das investigações deveria ser a Polícia Federal. Mas, atualmente, é a Polícia Civil do DF que está investigando o caso. Não duvidamos da capacidade da Polícia Civil, mas por se tratar da morte de uma indígena, na FUNASA, o âmbito é federal. A família ainda está muito abalada com o ocorrido. As organizações indígenas recorrerão às instâncias federais para que este caso tenha uma resolução e o culpado seja punido no rigor da lei. Este é um momento que chama atenção para o descaso aos quais os povos indígenas estão submetidos, principalmente, em relação à saúde.
Mais informações: Saturnino Xavante - (92) 8181-5029; (61)8163-2257
sat_xav@hotmail.com
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