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Itaipu, Incra e Funai fraudaram identificação de indígenas, diz PGR

25/04/2019

Fonte: O Globo - https://oglobo.globo.com/sociedade



Itaipu, Incra e Funai fraudaram identificação de indígenas, diz PGR
Grupo de trabalho conclui que construção da usina violou direitos de populações indígenas da região

Vinicius Sassine
25/04/2019 - 11:43 / Atualizado em 25/04/2019 - 12:57

BRASÍLIA - A construção de um dos principais projetos da ditadura militar, a usina hidrelétrica Itaipu Binacional, ocorreu a partir de graves violações às populações indígenas da região, com exclusão dessas comunidades de processos de reassentamento e reparação. A exclusão ocorreu por iniciativa do próprio governo, mais especificamente de três órgãos: a própria Itaipu, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Fundação Nacional do Índio (Funai). Os órgãos fraudaram a identificação das populações indígenas, ao classificarem os índios como posseiros.
Estas são as conclusões de um grupo de trabalho constituído a pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e cujo relatório foi tornado público nesta quinta-feira. Dodge recebeu, na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR), lideranças Ava-Guarani, a quem a procuradora-geral entregou o documento com as conclusões do grupo de trabalho.
Procuradores da República e antropólogos do Ministério Público Federal (MPF) fizeram a investigação e chegaram à conclusão sobre as graves violações de direitos dos Ava-Guarani. Boa parte deles ocupa, hoje, territórios não demarcados e em conflitos constantes com proprietários dessas áreas.
O grupo de trabalho foi constituído no âmbito de um inquérito civil público instaurado em 2008. O estudo resultante da atuação do grupo sugere medidas que podem ser adotadas em termos de reparação aos indígenas, o que será analisada pela procuradora-geral. Entre as propostas estão indenizações aos indígenas por terras alagadas ou indevidamente tituladas a particulares; demarcação definitiva da terra dos Ava-Guarani; e reconhecimento público da violação de direitos da etnia durante a construção da usina. Itaipu, por sua vez, deve desenvolver ações de reparação e promover ressarcimentos, com a participação direta dos índios.
O estudo concluído pelo MPF e que orientará decisões por parte de Dodge analisou a situação de indígenas que ocupavam duas áreas no Paraná: Tekoha Guasu Guavirá, entre Guaíra e Terra Roxa, e Tekoha Guasu Ocoy-Jacutinga, entre Foz do Iguaçu e Santa Helena. São 24 comunidades ao todo. Segundo o estudo, os índios estão presentes no oeste do Paraná e no Paraguai desde o período colonial, "de forma amplamente documentada". "Apesar disso, durante a construção de Itaipu, laudos e diagnósticos precários produzidos pela Funai e outros órgãos de Estado atestaram a inexistência de indígenas nas áreas alagadas, numa ação deliberada que tornou as comunidades invisíveis", diz o comunicado da PGR sobre o estudo.
Itaipu, Funai e Incra fraudaram a identificação étnica dessas comunidades, segundo MPF, e os indígenas acabaram classificados como "posseiros pobres, estrangeiros ou paraguaios recém-chegados às áreas". Isso impediu "a reivindicação de qualquer direito possessório sobre as áreas e reparação pelos alagamentos".
Esta fraude tem efeitos práticos até hoje, conforme o relatório. Os índios estão em 20 ocupações no oeste paranaense, "desprovidos de praticamente tudo". São altos os índices de desnutrição infantil e senil. Não há água potável nem energia elétrica. Os índios são ameaçados de despejo por ações de reintegração de posse movidas contra eles. O estudo aponta ainda discriminação, ameaças e violência "por parte da usina e dos proprietários formais das áreas onde se encontram". Também são elevados índices de alcoolismo e suicídio, segundo o documento do MPF.
As primeiras negociações para construção de Itaipu começaram a ser feitas entre Brasil e Paraguai na década de 60. As obras começaram em 1974. A geração de energia elétrica teve início em 1984.
Demarcação de terras
Questionada pela imprensa sobre a disposição do governo de Jair Bolsonaro de não fazer novas demarcações de terras indígenas, enquanto o relatório sobre Itaipu propõe que os territórios dos Guarani sejam demarcados, a procuradora-geral da República afirmou que o Ministério Público vai "promover o processo demarcatório" caso não haja iniciativa pelo Executivo.
- No histórico de demarcação de terras, a demarcação do povo Guarani é muito pequena. As terras não têm sido demarcadas. O trabalho do Ministério Público é reunir as informações que permitem essa demarcação, segundo os critérios da Constituição, é promover o processo demarcatório caso não ocorra pelo Poder Executivo - disse Dodge.
A procuradora-geral disse esperar que as demarcações continuem sendo feitas pelo Executivo, mesmo com o deslocamento dessa atribuição da Funai para o Ministério da Agricultura, controlado por ruralistas que se opõem a novas delimitações de territórios indígenas.
- O Ministério Público tem feito ao longo dos últimos 30 anos, e continuaremos a fazer, não só porque queremos, mas porque é um mandamento constitucional. A visão externa da sociedade em relação aos índios ainda precisa superar esses aspectos de exclusão - afirmou.
Uma das lideranças guaranis que compareceram à sede da PGR para receber em mãos o estudo é Celso Japoty Alves. Ele criticou a postura do governo em relação às políticas públicas voltadas aos indígenas, em especial a transferência das demarcações para o Ministério da Agricultura.
- A fala do governo é que estamos tomando terra, que o Brasil está perdendo terra para indígena. É o contrário. Quando sai a demarcação, o Brasil está ganhando. A gente está cuidando, reflorestando. O Brasil está ganhando terra quando sai a demarcação. Os indígenas vão preservar a natureza e água também.

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