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Garimpo ilegal em reserva continua, quase dois anos depois de massacre

20/03/2006

Fonte: OESP, Nacional, p. A11



Garimpo ilegal em reserva continua, quase dois anos depois de massacre
Ministério da Justiça admite que há 300 homens atuando na área dos cintas-largas em que morreram 29 em 2004

Nilton Salina

A menos de um mês do aniversário de dois anos do assassinato de 32 garimpeiros na Reserva Roosevelt (RO), a extração ilegal de diamantes numa das maiores jazidas da pedra no mundo segue firme. O Ministério da Justiça admite que 300 garimpeiros atuam hoje na terra dos cintas-largas, alguns comandados pelos próprios índios. Garimpeiros instalados nas cidades vizinhas sustentam que esse número é maior, de 700 a 1.000 pessoas.
A PF foi proibida de entrar na reserva pelos caciques João Bravo, Nacoça Pio, João Pelado e Ita. Sob risco de conflito, os policiais evitam ultrapassar as seis bases montadas ao redor da terra indígena. No fim de 2005, segundo os caciques, o diretor da PF para Assuntos de Fronteira, Mauro Sposito, e três agentes foram aprisionados na aldeia de João Bravo Cinta-Larga. Depois de pintar o diretor da PF com urucu, o que é considerado por eles uma humilhação, Ita segurou uma pena de gavião real e simulou cortar o pescoço do delegado: "Você pensa que é autoridade? Você é autoridade na cidade. Aqui, nós somos a autoridade. E se você voltar aqui de novo..."
Sposito tinha ido à aldeia atender a um chamado dos índios. Ele levava uma metralhadora, mas havia deixado a arma na caminhonete. Os índios tomaram as chaves, fecharam o carro e mantiveram os policiais reféns durante três dias. Depois disso, nenhum policial entrou novamente na Reserva Roosevelt.
"Se for necessário, vamos entrar na terra indígena. Mas não queremos usar a força. Não temos idéia do resultado de uma ação de força contra eles. Quando vêm, os índios sempre colocam mulheres e crianças na frente. É melhor resolver esse problema diplomaticamente", disse Sposito, que não trata o episódio como um seqüestro.
O contato com os índios tem sido feito por emissários da Fundação Nacional do Índio (Funai), que nas últimas semanas intensificaram o processo de negociação para remover garimpeiros que atuam sob a guarda dos cintas-largas, segundo o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto. A iniciativa é parte de uma grande operação que será deflagrada pela PF dentro da reserva "nos próximos dez dias". Uma ronda aérea identificou 30 máquinas resumidoras - usadas na extração do diamante - em atividade neste momento. De acordo com Barreto, os garimpeiros driblaram a fiscalização e, com uma retroescavadeira, abriram uma nova estrada de acesso às áreas de concentração da pedra. "Vamos prender garimpeiros que estiverem na reserva e faremos quantas operações forem necessárias para coibir a exploração de diamantes", afirmou o secretário.
DIESEL
Os índios reclamam que a apreensão de combustível pela PF tem prejudicado as aldeias, que obtêm energia por meio de gerador. O óleo diesel também é usado em tratores alugados para o cultivo de arroz, feijão, mandioca e milho. "O governo nos trata mal. A saúde está ruim. Não temos médico e agora nos deixam no escuro, dizendo que todo o óleo que compramos é usado no garimpo. Temos dificuldade até para levar doentes à cidade", reclamou João Pelado Cinta-Larga.
Barreto negou que a PF esteja "proibida" de entrar na reserva e insistiu que os agentes atuam de "modo equilibrado". Sugeriu ainda que a "cobiça sobre os diamantes" esteja por trás das reclamações.
Em Espigão do Oeste, diariamente chegam novas levas de garimpeiros. Pedras são vendidas na única praça da cidade.
Depois de 14 dias na área de garimpo, Evercino Araújo Peixoto, o Bicho da Goiaba, estava na cidade, no fim da semana passada. Ele revelou que é preciso pagar aos índios uma taxa que varia entre R$ 15 mil e R$ 20 mil para permanecer 20 dias em Roosevelt. O valor é quitado em diamantes, conforme vão sendo encontrados. "Mas é difícil. Pagamos para um índio e ele nos autoriza a ficar, mas depois vem um outro indígena e nos manda sair. Da última vez me fizeram andar nu, para que eu saísse antes do prazo combinado. É uma forma de humilhação", contou.

Justiça ainda espera laudo para decidir se pune índios

A Justiça Federal aguarda o laudo antropológico sobre 28 índios indiciados pela Polícia Federal pelo massacre de 32 garimpeiros em 7 de abril de 2004. Com o laudo, será possível saber se os índios são ou não aculturados e se têm condições de responder pela matança. Só após a emissão desse laudo, elaborado pela Funai e remetido ao Ministério Público, a ação contra os responsáveis pelos assassinatos pode ter prosseguimento.
Os guerreiros permanecem nas aldeias, mas caciques que teriam ordenado as mortes vão constantemente a Cacoal (RO), a 500 quilômetros da capital Porto Velho. Ainda há discrepâncias sobre o total de mortes na chacina. Segundo o Ministério da Justiça, foram 29 pessoas, mas o número de mortos pode ter sido maior.
Rosalina, de 22 anos, que pede para não ser identificada, visita toda semana o cemitério de Espigão do Oeste, onde foram enterrados os corpos de 24 garimpeiros, para rezar pelos mortos. Ela era noiva de Josimar Campo da Silva, que estava com o grupo assassinado em abril de 2004. O corpo dele não estava entre os que foram trazidos do garimpo ilegal pela PF.
Rosalina, que ainda guarda o enxoval, não quer falar da matança. Estava com o casamento marcado, quando o noivo disse que iria "pela última vez" à terra dos índios. Prometeu que, assim que voltasse, iria comprar uma casa e estaria preparado para o casamento. Não voltou e alguns dos mortos nunca foram identificados. N.S.

OESP, Nacional, 20/03/2006, p. A11
 

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