From Indigenous Peoples in Brazil
Notícias
Uma justiça climática de verdade
26/02/2025
Autor: NALINI, José Renato
Fonte: OESP - https://www.estadao.com.br/
Uma justiça climática de verdade
As questões ambientais já chegaram aos Tribunais. Sob a forma de demandas tópicas, mas também exteriorizadas à luz do processo coletivo
José Roberto Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo.
26/02/2025
O mau uso dos recursos naturais gera consequências que, se de início era legítimo serem desconhecidas por grande parte da sociedade, com o avanço científico essa escusa é hoje inaceitável. A ação humana impulsionou transformações planetárias que extrapolam a resiliência ecossistêmica do planeta. Tudo indica uma exaustão da Terra: o comprometimento da biodiversidade, a queda do nível da qualidade existencial humana e não humana, drásticas alterações do clima, que provocam desastres ambientais potencialmente letais. Tudo isso, com intensidade e frequência cada vez maiores.
Vive-se uma sociedade de risco, à luz do pensamento de Beck, prevalecendo incerteza, complexidade e imprevisibilidade. A insistência em preservar modos de vida insustentáveis permite se conclua que a sociedade assumiu uma conotação autodestrutiva.
O direito é o instrumento de que se serve a humanidade para solucionar problemas. Foi também chamado a intervir nas situações críticas em que a espécie mergulhou, advindas de escassez de recursos hídricos, migrações forçadas, insegurança alimentar e outras questões. A fase presente, que se convencionou chamar Antropoceno, reclama atitudes firmes da sociedade, com vistas a transformações éticas, políticas e jurídicas.
As questões ambientais já chegaram aos Tribunais. Sob a forma de demandas tópicas, mas também exteriorizadas à luz do processo coletivo. A resposta do Judiciário a essa necessidade foi a criação de Varas Ambientais, na maior parte dos Estados brasileiros e de Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente, em segunda instância, no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Mas isso é insuficiente. Verifica-se agora a tendência de se levar temas ambientais aos Tribunais Internacionais, seja a Corte de Direitos Humanos de Luxemburgo, seja o Tribunal Penal Internacional. Mas há um longo caminho a percorrer.
Uma experiência interessante foi a criação do Tribunal Internacional Ambiental em Quito, no Equador, cuja Constituição contemplou o ambiente como sujeito de direitos em 2008. O Tribunal Internacional Ambiental funciona desde 2014, mas é uma Corte Simbólica, assim como foi o Tribunal Russel e o chamado Tribunal dos Povos.
A complexidade específica das questões ecológicas reclama a criação de um verdadeiro Tribunal Ambiental Internacional, com jurisdição sobre indivíduos, entidades e Poder Público, inclusive Estados, pois o conservadorismo na categorização jurídica pode frustrar a tentativa de obrigar o infrator ecológico a restaurar o espaço vulnerado, a recuperar a cobertura vegetal, a despoluir as águas molestadas e a tudo fazer no sentido de, na medida do possível, devolver a situação ao status quo ante.
A proliferação de casos que necessitam de uma Justiça especializada é notória. Os casos de litigância climática tornam-se cada vez mais frequentes, e ocorrem nas mais diversas regiões do planeta. São temas frequentes nessas demandas: a poluição do ar, a proteção de espécies silvestres, o acesso à água e à liberdade de informação, o cumprimento das leis e normativas ambientais, a demanda por medidas de adaptação e reversão de impacto, indenização, medidas acautelatórias preventivas, seguros e compensações financeiras, direitos humanos, proteção da biodiversidade, emissão de gases efeito-estufa - GEE, investimentos dos Estados, participação pública e compromissos firmados por Empresas e Estados.
O universo do direito padece ainda, principalmente em nação emergente como o Brasil, de um evidente anacronismo. É que o modelo de ensino jurídico remonta a mais de um milênio. Explica-se: quando o Imperador Pedro I quis criar cursos jurídicos no Brasil recém-independente, foi buscar o modelo coimbrão. Só que em 1828, Coimbra preservava os cânones de Bolonha, Universidade italiana datada do século 13, mas cujo ensino de direito remontava ao Oitocentos.
O que de fato se alterou na rotina de transmitir informação normativa, doutrinária e jurisprudencial, compartimentada em várias disciplinas, sem a visão transversal obrigatoriamente incidente sobre a crise contemporânea? Quase nada. Talvez não seja heresia pensar que é preciso mudar quase tudo.
As questões ambientais já chegaram aos Tribunais. Sob a forma de demandas tópicas, mas também exteriorizadas à luz do processo coletivo
José Roberto Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo.
26/02/2025
O mau uso dos recursos naturais gera consequências que, se de início era legítimo serem desconhecidas por grande parte da sociedade, com o avanço científico essa escusa é hoje inaceitável. A ação humana impulsionou transformações planetárias que extrapolam a resiliência ecossistêmica do planeta. Tudo indica uma exaustão da Terra: o comprometimento da biodiversidade, a queda do nível da qualidade existencial humana e não humana, drásticas alterações do clima, que provocam desastres ambientais potencialmente letais. Tudo isso, com intensidade e frequência cada vez maiores.
Vive-se uma sociedade de risco, à luz do pensamento de Beck, prevalecendo incerteza, complexidade e imprevisibilidade. A insistência em preservar modos de vida insustentáveis permite se conclua que a sociedade assumiu uma conotação autodestrutiva.
O direito é o instrumento de que se serve a humanidade para solucionar problemas. Foi também chamado a intervir nas situações críticas em que a espécie mergulhou, advindas de escassez de recursos hídricos, migrações forçadas, insegurança alimentar e outras questões. A fase presente, que se convencionou chamar Antropoceno, reclama atitudes firmes da sociedade, com vistas a transformações éticas, políticas e jurídicas.
As questões ambientais já chegaram aos Tribunais. Sob a forma de demandas tópicas, mas também exteriorizadas à luz do processo coletivo. A resposta do Judiciário a essa necessidade foi a criação de Varas Ambientais, na maior parte dos Estados brasileiros e de Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente, em segunda instância, no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Mas isso é insuficiente. Verifica-se agora a tendência de se levar temas ambientais aos Tribunais Internacionais, seja a Corte de Direitos Humanos de Luxemburgo, seja o Tribunal Penal Internacional. Mas há um longo caminho a percorrer.
Uma experiência interessante foi a criação do Tribunal Internacional Ambiental em Quito, no Equador, cuja Constituição contemplou o ambiente como sujeito de direitos em 2008. O Tribunal Internacional Ambiental funciona desde 2014, mas é uma Corte Simbólica, assim como foi o Tribunal Russel e o chamado Tribunal dos Povos.
A complexidade específica das questões ecológicas reclama a criação de um verdadeiro Tribunal Ambiental Internacional, com jurisdição sobre indivíduos, entidades e Poder Público, inclusive Estados, pois o conservadorismo na categorização jurídica pode frustrar a tentativa de obrigar o infrator ecológico a restaurar o espaço vulnerado, a recuperar a cobertura vegetal, a despoluir as águas molestadas e a tudo fazer no sentido de, na medida do possível, devolver a situação ao status quo ante.
A proliferação de casos que necessitam de uma Justiça especializada é notória. Os casos de litigância climática tornam-se cada vez mais frequentes, e ocorrem nas mais diversas regiões do planeta. São temas frequentes nessas demandas: a poluição do ar, a proteção de espécies silvestres, o acesso à água e à liberdade de informação, o cumprimento das leis e normativas ambientais, a demanda por medidas de adaptação e reversão de impacto, indenização, medidas acautelatórias preventivas, seguros e compensações financeiras, direitos humanos, proteção da biodiversidade, emissão de gases efeito-estufa - GEE, investimentos dos Estados, participação pública e compromissos firmados por Empresas e Estados.
O universo do direito padece ainda, principalmente em nação emergente como o Brasil, de um evidente anacronismo. É que o modelo de ensino jurídico remonta a mais de um milênio. Explica-se: quando o Imperador Pedro I quis criar cursos jurídicos no Brasil recém-independente, foi buscar o modelo coimbrão. Só que em 1828, Coimbra preservava os cânones de Bolonha, Universidade italiana datada do século 13, mas cujo ensino de direito remontava ao Oitocentos.
O que de fato se alterou na rotina de transmitir informação normativa, doutrinária e jurisprudencial, compartimentada em várias disciplinas, sem a visão transversal obrigatoriamente incidente sobre a crise contemporânea? Quase nada. Talvez não seja heresia pensar que é preciso mudar quase tudo.
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