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Sem consenso global, Brasil busca mapa do caminho com cientistas e petroleiros para manter viva a proposta de fim dos fósseis
23/11/2025
Autor: Fábio Bispo
Fonte: InfoAmazonia - https://infoamazonia.org
Entre avanços diplomáticos e contradições domésticas, Brasil tenta transformar em roteiro global a proposta de eliminar gradualmente petróleo, gás e carvão. Estudos que baseiam a proposta do mapa do caminho apresentado em Belém devem reunir agências internacionais, cientistas e representantes do setor petrolífero, enquanto o país mantém aberta a exploração de novas reservas na Amazônia.
Um mapa ainda sem rumo definido - e que expôs as contradições e disputas centrais da crise climática - começou a ser traçado em Belém com o encerramento da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. A iniciativa da presidência da COP30 para o roteiro deve se apoiar em estudos técnicos, que devem reunir cientistas, agências internacionais e representantes do setor petrolífero (leia mais abaixo). Proposto pelo presidente Lula (PT) já na abertura da Cúpula de Líderes, que antecedeu a conferência, o "mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis" dominou os debates nas duas semanas da reunião e conquistou o apoio de dezenas de países, mesmo tendo sido anunciado poucas semanas depois de o próprio governo autorizar a perfuração de poços de petróleo na costa amazônica.
Sem menções aos combustíveis fósseis, cuja queima é a principal responsável pelo aquecimento do planeta, nos textos das negociações, a proposta acabou se tornando um dos temas mais comentados da COP. Pautou encontros paralelos e articulações diplomáticas, mas enfrentou forte resistência de nações petrolíferas, lideradas pela Arábia Saudita, Rússia e Índia, pelo tema não constar na agenda oficial.
No meio da segunda semana, Lula voltou à Zona Azul, onde ocorrem as negociações, para tentar costurar um consenso. Uma versão preliminar do documento do Mutirão (principal pacote político do acordo de Belém) chegou a mencionar a criação de um "mapa voluntário" para a saída dos fósseis dentro do Acordo de Paris. Com os debates sobre financiamento e adaptação travados, o chamado mapa do caminho (roadmap, em inglês) para o fim dos fósseis era o grande resultado político esperado do encontro. Mas a proposta não entrou no texto final, que evitou qualquer menção aos combustíveis fósseis.
Um grupo de 29 países -entre eles Colômbia, Chile, Panamá, Alemanha e Dinamarca- ameaçou não assinar o acordo sem a inclusão do mapa do caminho, mas acabou cedendo.
"Estava um placar tipo 85 a 80, que a gente mais ou menos identificou, e como vocês sabem, tem que ser de 195 a 0", disse Ana Toni, CEO da COP30, ao citar um placar estimado da divergência sobre o tema entre os países da convenção.
Sem acordo entre as 195 delegações, a saída à brasileira foi empurrar o tema para uma trilha paralela, anunciada por Corrêa do Lago na plenária final de sábado (22). Sob sua coordenação direta, a presidência da COP30 prometeu entregar, até a COP31, na Turquia, um documento técnico que subsidie novas discussões sobre o fim dos combustíveis fósseis. O roteiro, contudo, não é vinculante à Convenção do Clima e não cria obrigações para o cumprimento das metas do Acordo de Paris, servindo apenas como uma plataforma voluntária de diálogo entre os países que apoiaram a iniciativa, algo em torno de 80 nações.
A primeira reunião desse grupo está prevista para abril de 2026, na Colômbia, durante a primeira conferência internacional dedicada à transição dos combustíveis fósseis.
Durante a COP30, em Belém, a Colômbia ganhou destaque ao anunciar toda a sua Amazônia como zona livre de petróleo, durante encontro de ministros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Na ocasião, provocou as demais nações que abrigam a maior floresta tropical do mundo a seguir o mesmo caminho.
Divisão exposta na plenária final
A solução encontrada pela presidência da COP30 gerou reações imediatas durante a plenária final. Países como Colômbia, Panamá e Uruguai exigiram que a menção à "transição para longe dos combustíveis fósseis, de maneira justa, ordenada e equitativa" fosse mantida no programa de mitigação.
A negociadora colombiana interrompeu a sessão e declarou: "Esta é a COP da verdade, a COP da confiança, e não pode apoiar um resultado que ignore a ciência." Ela lembrou que "quase 75% das emissões globais de CO₂ vêm dos combustíveis fósseis" e que "não há mitigação se não pudermos discutir a transição com base na ciência e na justiça".
Na direção oposta, Arábia Saudita, Rússia, Índia e Nigéria reagiram com ironias e críticas à pressão latino-americana. O representante russo acusou os países da região de "se comportarem como crianças que querem todos os doces". A Nigéria afirmou que "a transição energética não pode ser imposta" e deve respeitar "as realidades econômicas nacionais", enquanto a Índia, em nome do grupo BASIC, bloco de quatro países recentemente industrializados (Brasil, África do Sul, Índia e China), rejeitou reabrir o debate sobre os fósseis.
Em meio ao embate, o Secretário de Segurança Energética e Emissões Zero do Reino Unido, Ed Miliband, saiu da plenária e resumiu a ambiguidade do resultado aos jornalistas: "Eu teria preferido que a transição para longe dos combustíveis fósseis tivesse sido incluída no texto, mas países-chave se opuseram. Mesmo assim, há elementos suficientes neste acordo para que o Brasil lance esse roteiro crucial. É um avanço, ainda que limitado."
A União Europeia, por sua vez, defendeu a continuidade das discussões sobre a transição energética, mas concordou em apoiar o texto do acordo climático apresentado na plenária, conhecido como Pacote de Belém, sem a menção aos combustíveis fósseis.
"A ciência nos diz claramente que as emissões globais precisam cair muito mais rápido. A Europa está fazendo a sua parte. Tínhamos a esperança de que Belém nos desse uma resposta global para acelerar ambição e ação e mostrar como vamos fechar a lacuna para 1,5 oC. O pacote à nossa frente é, em certa medida, uma oportunidade perdida. Ainda assim, a UE não irá se opor a este pacote".
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva, foi desde o início a principal defensora da proposta brasileira. Em sua fala final, evocou a Conferência Rio-92, que deu origem às COPs, e afirmou que se pudesse voltar no tempo, diria a si mesma que "a urgência deveria falar mais alto que qualquer outro interesse".
Em que pese ainda não ter sido possível o consenso para que esse chamado entrasse nas decisões desta COP, o apoio que recebeu de muitas partes e da sociedade fortalece o compromisso da atual presidência de elaborar dois mapas do caminho: um sobre deter e reverter o desmatamento e outro sobre a transição para longe dos combustíveis fósseis, de maneira justa, ordenada e equitativa. Ambos serão guiados pela ciência e serão inclusivos."
Marina Silva, ministra do Meio Ambiente
Ao discursar na plenária final da COP30, Marina foi ovacionada pelos representantes das 195 nações, que a aplaudiram de pé por mais de três minutos.
Mapa vai reunir estudos em meio a dilemas nacionais sobre exploração na Amazônia
O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, afirmou que o roteiro será elaborado a partir de estudos já encomendados pelo MMA para definir caminhos de transição energética. "O objetivo é construir um documento técnico robusto, baseado em evidências e no diálogo entre países produtores e consumidores de energia", explicou.
Segundo o diplomata, o Brasil pretende envolver cientistas e a própria indústria do petróleo na construção do plano, com apoio de instituições como a Agência Internacional de Energia (AIE), a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA) e até mesmo o cartel da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), que segundo ele, "tem muita pesquisa sobre o tema".
"Queremos reunir a maior inteligência possível sobre energia fóssil e organizar essa informação por meio de reuniões, seminários e estudos", disse Corrêa do Lago.
De acordo com André Corrêa do Lago, o roteiro do mapa deve se apoiar em estudos técnicos, incluindo propostas já encomendadas pela Presidência da COP30. A InfoAmazonia apurou que um desses estudos é o relatório "Transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos", elaborado a pedido do MMA e apresentado como subsídio para o mapa do caminho. O estudo foi realizado pela consultoria Catavento e apoiado pelo Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), representante do setor petrolífero, e pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS). A segunda versão, que inclui também o setor de carvão, foi entregue à presidência da COP30 em agosto deste ano. Ele foi citado pelo presidente da COP30 como um exemplo de como o roteiro será construído, reunindo o máximo de informações sobre o tema.
"Nós já começamos esse estudo, a ministra [Marina Silva] já tinha pedido e a Ana [Toni] tinha encomendado, nós começamos esse estudo com um trabalho que eu acho que nos mostrou que seria possível a gente fazer isso. E mais do que possível, interessantíssimo. Porque o primeiro trabalho que a gente encomendou já nos mostrou o mundo de uma maneira diferente", anunciou Corrêa do Lago.
O estudo analisa a capacidade de 11 países adaptarem suas matrizes energéticas e os distribui em três grupos, definidos conforme o grau de urgência e viabilidade da transição dos combustíveis fósseis. Nesse conjunto, o Brasil é classificado como "potencial intermediário de adaptação", atrás de Alemanha, China, Canadá e Estados Unidos, classificados como os que deveriam liderar a saída dos fósseis por sua autonomia econômica e maior capacidade de financiar tecnologias para a transição interna em seus países.
Na outra ponta entre os países avaliados, Índia, Arábia Saudita e Nigéria figuram no grupo dos, adapters, que, segundo o estudo, demandam mais apoio para para avançar na transição energética.
Na prática, isso significa que o Brasil que tenta liderar o debate global sobre o fim dos fósseis continuaria explorando petróleo por mais alguns anos. Uma solução que espelha o dilema interno do governo Lula sobre a exploração na Foz do Amazonas e a pressão de empresas estrangeiras como as norte-americanas ExxonMobil e Chevron, principais vencedoras do último leilão na costa amazônica brasileira.
Segundo a assessoria da presidência da COP30, a proposta é semelhante ao mapa Baku-Belém, aprovado também como medida lateral à convenção do Azerbaijão no ano passado (COP29), que reuniu esforços das duas nações na construção de um roteiro para o financiamento climático alcançar o 1,3 trilhão de dólares necessário para financiar o combate às mudanças climáticas. O roteiro reuniu uma série de estudos, análises e pesquisas que indicavam quanto as nações precisam para combater as mudanças climáticas e promover a transição energética.
Um balanço agridoce
O mapa dos fósseis proposto pelo Brasil sobreviveu politicamente, mas saiu da COP30 sem força normativa.
Para o especialista em políticas climáticas do Instituto Talanoa, Caio Victor Vieira, "a COP termina com um sentimento agridoce". Apesar de avanços pontuais nos debates sobre transição justa, financiamento para adaptação e revisão dos mecanismos de transparência climática, ele avalia que o texto final não tratou das emergências que exigem respostas imediatas.
Vieira destaca que a proposta brasileira, mesmo que paralela, dá um recado importante sobre o quadro das nações-membros da convenção, mas é cético quanto aos resultados necessários da medida adotada.
"Ela abre processos institucionais que podem acabar de uma vez por todas com os problemas globais, mas ainda é um sinal muito frágil de que isso será feito; posterga esse impasse, que poderia ser resolvido aqui em Belém, para um processo de pelo menos um ano. Ao passo que é histórico, é também uma diluição no tempo da qual já não temos", analisa o cientista do Talanoa.
Na avaliação do Greenpeace, o desfecho ficou aquém do necessário. "A decisão da Presidência de criar os dois mapas do caminho -tanto para zerar o desmatamento quanto para o fim dos combustíveis fósseis- tem gosto de prêmio de consolação. É claro que isso permitirá que o trabalho siga no ano que vem, e que o momentum criado em Belém não se perca. Mas não é o avanço que esperávamos, e que o mundo desesperadamente precisa, disse Carolina Pasquali, diretora da ONG no Brasil.
Ainda sem mapa, fim dos fósseis no Brasil está indefinido
Questionada pela InfoAmazonia sobre quando o Brasil iria anunciar o fim dos fósseis como exemplo na própria bandeira que levantou na reunião global do clima, a ministra Marina Silva disse, em sua última declaração na Zona Azul, que "o próprio presidente Lula disse que está convencido de que a gente precisa fazer mapas do caminho".
"Se você faz o mapa, são os estudos, que é uma dinâmica muito complexa, que vai dizer os prazos. Se você diz a priori, você está desconsiderando que algo dessa natureza e complexidade só pode ser feito com base em dados e evidência", completou Marina.
No último 17 de novembro, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) aprovou a inclusão de 275 novos blocos exploratórios para exploração de petróleo e gás no edital da Oferta Permanente de Concessão, incluindo áreas para exploração na Amazônia e em outras regiões do país.
Até o momento, o Brasil não tem uma data para acabar com a sua própria exploração de combustíveis fósseis.
https://infoamazonia.org/2025/11/23/sem-consenso-global-brasil-busca-mapa-do-caminho-com-cientistas-e-petroleiros-para-manter-viva-a-proposta-de-fim-dos-fosseis/
Um mapa ainda sem rumo definido - e que expôs as contradições e disputas centrais da crise climática - começou a ser traçado em Belém com o encerramento da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. A iniciativa da presidência da COP30 para o roteiro deve se apoiar em estudos técnicos, que devem reunir cientistas, agências internacionais e representantes do setor petrolífero (leia mais abaixo). Proposto pelo presidente Lula (PT) já na abertura da Cúpula de Líderes, que antecedeu a conferência, o "mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis" dominou os debates nas duas semanas da reunião e conquistou o apoio de dezenas de países, mesmo tendo sido anunciado poucas semanas depois de o próprio governo autorizar a perfuração de poços de petróleo na costa amazônica.
Sem menções aos combustíveis fósseis, cuja queima é a principal responsável pelo aquecimento do planeta, nos textos das negociações, a proposta acabou se tornando um dos temas mais comentados da COP. Pautou encontros paralelos e articulações diplomáticas, mas enfrentou forte resistência de nações petrolíferas, lideradas pela Arábia Saudita, Rússia e Índia, pelo tema não constar na agenda oficial.
No meio da segunda semana, Lula voltou à Zona Azul, onde ocorrem as negociações, para tentar costurar um consenso. Uma versão preliminar do documento do Mutirão (principal pacote político do acordo de Belém) chegou a mencionar a criação de um "mapa voluntário" para a saída dos fósseis dentro do Acordo de Paris. Com os debates sobre financiamento e adaptação travados, o chamado mapa do caminho (roadmap, em inglês) para o fim dos fósseis era o grande resultado político esperado do encontro. Mas a proposta não entrou no texto final, que evitou qualquer menção aos combustíveis fósseis.
Um grupo de 29 países -entre eles Colômbia, Chile, Panamá, Alemanha e Dinamarca- ameaçou não assinar o acordo sem a inclusão do mapa do caminho, mas acabou cedendo.
"Estava um placar tipo 85 a 80, que a gente mais ou menos identificou, e como vocês sabem, tem que ser de 195 a 0", disse Ana Toni, CEO da COP30, ao citar um placar estimado da divergência sobre o tema entre os países da convenção.
Sem acordo entre as 195 delegações, a saída à brasileira foi empurrar o tema para uma trilha paralela, anunciada por Corrêa do Lago na plenária final de sábado (22). Sob sua coordenação direta, a presidência da COP30 prometeu entregar, até a COP31, na Turquia, um documento técnico que subsidie novas discussões sobre o fim dos combustíveis fósseis. O roteiro, contudo, não é vinculante à Convenção do Clima e não cria obrigações para o cumprimento das metas do Acordo de Paris, servindo apenas como uma plataforma voluntária de diálogo entre os países que apoiaram a iniciativa, algo em torno de 80 nações.
A primeira reunião desse grupo está prevista para abril de 2026, na Colômbia, durante a primeira conferência internacional dedicada à transição dos combustíveis fósseis.
Durante a COP30, em Belém, a Colômbia ganhou destaque ao anunciar toda a sua Amazônia como zona livre de petróleo, durante encontro de ministros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Na ocasião, provocou as demais nações que abrigam a maior floresta tropical do mundo a seguir o mesmo caminho.
Divisão exposta na plenária final
A solução encontrada pela presidência da COP30 gerou reações imediatas durante a plenária final. Países como Colômbia, Panamá e Uruguai exigiram que a menção à "transição para longe dos combustíveis fósseis, de maneira justa, ordenada e equitativa" fosse mantida no programa de mitigação.
A negociadora colombiana interrompeu a sessão e declarou: "Esta é a COP da verdade, a COP da confiança, e não pode apoiar um resultado que ignore a ciência." Ela lembrou que "quase 75% das emissões globais de CO₂ vêm dos combustíveis fósseis" e que "não há mitigação se não pudermos discutir a transição com base na ciência e na justiça".
Na direção oposta, Arábia Saudita, Rússia, Índia e Nigéria reagiram com ironias e críticas à pressão latino-americana. O representante russo acusou os países da região de "se comportarem como crianças que querem todos os doces". A Nigéria afirmou que "a transição energética não pode ser imposta" e deve respeitar "as realidades econômicas nacionais", enquanto a Índia, em nome do grupo BASIC, bloco de quatro países recentemente industrializados (Brasil, África do Sul, Índia e China), rejeitou reabrir o debate sobre os fósseis.
Em meio ao embate, o Secretário de Segurança Energética e Emissões Zero do Reino Unido, Ed Miliband, saiu da plenária e resumiu a ambiguidade do resultado aos jornalistas: "Eu teria preferido que a transição para longe dos combustíveis fósseis tivesse sido incluída no texto, mas países-chave se opuseram. Mesmo assim, há elementos suficientes neste acordo para que o Brasil lance esse roteiro crucial. É um avanço, ainda que limitado."
A União Europeia, por sua vez, defendeu a continuidade das discussões sobre a transição energética, mas concordou em apoiar o texto do acordo climático apresentado na plenária, conhecido como Pacote de Belém, sem a menção aos combustíveis fósseis.
"A ciência nos diz claramente que as emissões globais precisam cair muito mais rápido. A Europa está fazendo a sua parte. Tínhamos a esperança de que Belém nos desse uma resposta global para acelerar ambição e ação e mostrar como vamos fechar a lacuna para 1,5 oC. O pacote à nossa frente é, em certa medida, uma oportunidade perdida. Ainda assim, a UE não irá se opor a este pacote".
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva, foi desde o início a principal defensora da proposta brasileira. Em sua fala final, evocou a Conferência Rio-92, que deu origem às COPs, e afirmou que se pudesse voltar no tempo, diria a si mesma que "a urgência deveria falar mais alto que qualquer outro interesse".
Em que pese ainda não ter sido possível o consenso para que esse chamado entrasse nas decisões desta COP, o apoio que recebeu de muitas partes e da sociedade fortalece o compromisso da atual presidência de elaborar dois mapas do caminho: um sobre deter e reverter o desmatamento e outro sobre a transição para longe dos combustíveis fósseis, de maneira justa, ordenada e equitativa. Ambos serão guiados pela ciência e serão inclusivos."
Marina Silva, ministra do Meio Ambiente
Ao discursar na plenária final da COP30, Marina foi ovacionada pelos representantes das 195 nações, que a aplaudiram de pé por mais de três minutos.
Mapa vai reunir estudos em meio a dilemas nacionais sobre exploração na Amazônia
O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, afirmou que o roteiro será elaborado a partir de estudos já encomendados pelo MMA para definir caminhos de transição energética. "O objetivo é construir um documento técnico robusto, baseado em evidências e no diálogo entre países produtores e consumidores de energia", explicou.
Segundo o diplomata, o Brasil pretende envolver cientistas e a própria indústria do petróleo na construção do plano, com apoio de instituições como a Agência Internacional de Energia (AIE), a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA) e até mesmo o cartel da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), que segundo ele, "tem muita pesquisa sobre o tema".
"Queremos reunir a maior inteligência possível sobre energia fóssil e organizar essa informação por meio de reuniões, seminários e estudos", disse Corrêa do Lago.
De acordo com André Corrêa do Lago, o roteiro do mapa deve se apoiar em estudos técnicos, incluindo propostas já encomendadas pela Presidência da COP30. A InfoAmazonia apurou que um desses estudos é o relatório "Transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos", elaborado a pedido do MMA e apresentado como subsídio para o mapa do caminho. O estudo foi realizado pela consultoria Catavento e apoiado pelo Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), representante do setor petrolífero, e pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS). A segunda versão, que inclui também o setor de carvão, foi entregue à presidência da COP30 em agosto deste ano. Ele foi citado pelo presidente da COP30 como um exemplo de como o roteiro será construído, reunindo o máximo de informações sobre o tema.
"Nós já começamos esse estudo, a ministra [Marina Silva] já tinha pedido e a Ana [Toni] tinha encomendado, nós começamos esse estudo com um trabalho que eu acho que nos mostrou que seria possível a gente fazer isso. E mais do que possível, interessantíssimo. Porque o primeiro trabalho que a gente encomendou já nos mostrou o mundo de uma maneira diferente", anunciou Corrêa do Lago.
O estudo analisa a capacidade de 11 países adaptarem suas matrizes energéticas e os distribui em três grupos, definidos conforme o grau de urgência e viabilidade da transição dos combustíveis fósseis. Nesse conjunto, o Brasil é classificado como "potencial intermediário de adaptação", atrás de Alemanha, China, Canadá e Estados Unidos, classificados como os que deveriam liderar a saída dos fósseis por sua autonomia econômica e maior capacidade de financiar tecnologias para a transição interna em seus países.
Na outra ponta entre os países avaliados, Índia, Arábia Saudita e Nigéria figuram no grupo dos, adapters, que, segundo o estudo, demandam mais apoio para para avançar na transição energética.
Na prática, isso significa que o Brasil que tenta liderar o debate global sobre o fim dos fósseis continuaria explorando petróleo por mais alguns anos. Uma solução que espelha o dilema interno do governo Lula sobre a exploração na Foz do Amazonas e a pressão de empresas estrangeiras como as norte-americanas ExxonMobil e Chevron, principais vencedoras do último leilão na costa amazônica brasileira.
Segundo a assessoria da presidência da COP30, a proposta é semelhante ao mapa Baku-Belém, aprovado também como medida lateral à convenção do Azerbaijão no ano passado (COP29), que reuniu esforços das duas nações na construção de um roteiro para o financiamento climático alcançar o 1,3 trilhão de dólares necessário para financiar o combate às mudanças climáticas. O roteiro reuniu uma série de estudos, análises e pesquisas que indicavam quanto as nações precisam para combater as mudanças climáticas e promover a transição energética.
Um balanço agridoce
O mapa dos fósseis proposto pelo Brasil sobreviveu politicamente, mas saiu da COP30 sem força normativa.
Para o especialista em políticas climáticas do Instituto Talanoa, Caio Victor Vieira, "a COP termina com um sentimento agridoce". Apesar de avanços pontuais nos debates sobre transição justa, financiamento para adaptação e revisão dos mecanismos de transparência climática, ele avalia que o texto final não tratou das emergências que exigem respostas imediatas.
Vieira destaca que a proposta brasileira, mesmo que paralela, dá um recado importante sobre o quadro das nações-membros da convenção, mas é cético quanto aos resultados necessários da medida adotada.
"Ela abre processos institucionais que podem acabar de uma vez por todas com os problemas globais, mas ainda é um sinal muito frágil de que isso será feito; posterga esse impasse, que poderia ser resolvido aqui em Belém, para um processo de pelo menos um ano. Ao passo que é histórico, é também uma diluição no tempo da qual já não temos", analisa o cientista do Talanoa.
Na avaliação do Greenpeace, o desfecho ficou aquém do necessário. "A decisão da Presidência de criar os dois mapas do caminho -tanto para zerar o desmatamento quanto para o fim dos combustíveis fósseis- tem gosto de prêmio de consolação. É claro que isso permitirá que o trabalho siga no ano que vem, e que o momentum criado em Belém não se perca. Mas não é o avanço que esperávamos, e que o mundo desesperadamente precisa, disse Carolina Pasquali, diretora da ONG no Brasil.
Ainda sem mapa, fim dos fósseis no Brasil está indefinido
Questionada pela InfoAmazonia sobre quando o Brasil iria anunciar o fim dos fósseis como exemplo na própria bandeira que levantou na reunião global do clima, a ministra Marina Silva disse, em sua última declaração na Zona Azul, que "o próprio presidente Lula disse que está convencido de que a gente precisa fazer mapas do caminho".
"Se você faz o mapa, são os estudos, que é uma dinâmica muito complexa, que vai dizer os prazos. Se você diz a priori, você está desconsiderando que algo dessa natureza e complexidade só pode ser feito com base em dados e evidência", completou Marina.
No último 17 de novembro, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) aprovou a inclusão de 275 novos blocos exploratórios para exploração de petróleo e gás no edital da Oferta Permanente de Concessão, incluindo áreas para exploração na Amazônia e em outras regiões do país.
Até o momento, o Brasil não tem uma data para acabar com a sua própria exploração de combustíveis fósseis.
https://infoamazonia.org/2025/11/23/sem-consenso-global-brasil-busca-mapa-do-caminho-com-cientistas-e-petroleiros-para-manter-viva-a-proposta-de-fim-dos-fosseis/
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