From Indigenous Peoples in Brazil
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Carroceiro habilitado, sim senhor! - Daniel Lima Silva
08/09/2008
Autor: Daniel Lima Silva*
Fonte: Dourados Agora - www.douradosagora.com.br
Toda cidade, qualquer cidade, é entendida e concebida pelos homens e mulheres que nela vivem através do seu cotidiano: morando, trabalhando, percorrendo, participando, vivendo, analisando, sentindo, construindo suas histórias, fomentando sua economia e, em meio a tudo isto, situando-se em seus espaços. A cidade também é concebida em classes desiguais, como apontou o geógrafo Milton Santos em "O Espaço Dividido: os dois circuitos da economia dos países subdesenvolvidos". Participar da cidade é estar inserido nas dinâmicas do "progresso", da informação, das caixas registradoras, elevadores, etc., e, além de lidarmos com o movimento dessa vida "moderna", temos que lidar também com o movimento do trânsito, semáforos, placas de sinalização, congestionamentos...
Dourados, "Cidade Educadora", com universidades de "peso", lindas mansões, "lan houses", lojas de grife, de avenidas largas e bem traçadas onde circulam 54.000 veículos emplacados pelo próprio município, e outros 4.000 rotativos de outras localidades, 26.000 motos e 140.000 bicicletas, amalgamados entre seus 200 mil habitantes (aproximadamente 13.000 são universitários de fora). Pouco se diferencia das outras cidades, de porte igual ou superior regidas pelo mesmo sistema do qual estamos todos inseridos.
Entretanto, uma informação do geógrafo Oslon Carlos E. Paes de Barros, Superintendente de Transporte e Trânsito, divulgada em entrevista a TV Morena, canal local, chamou-nos a atenção: 2.100 carroças de tração animal circulam em meio a tantos veículos, importados e de luxo, ou não, pela cidade. A princípio, pensando que se tratasse de certo exagero, fomos pesquisar e confirmamos que esse número poderá ser ainda maior após conclusão do trabalho que a Prefeitura está ministrando, tendo como responsável a Coordenadora de Educação para o Trânsito, Edna Cristina Chanfrin.
Algo que talvez justifique essa disparidade, e que poucos de nós munícipes tenham percebido, é que a cidade é limítrofe de duas das maiores aldeias indígenas do Estado: a Jaguapirú e Bororó, onde o meio de transporte mais comum é a carroça. Esta população indígena circula com mais de 1.500 carroças pelo perímetro urbano da cidade, pois esse é o principal meio de locomoção e para trabalho (venda de mandioca, milho verde, batata doce, etc.) donde tiram parte do sustento. Não é necessário dizer dos "transtornos" (para quem? Ou, imaginemos, quantos não são os transtornos que os motoristas, a "mil por hora", provocam para os carroceiros?) que esses condutores causam, involuntariamente e por falta de conhecimentos mais específicos, ao trânsito local. Segundo Edna Cristina, este ano, até o final de maio, ocorreram 400 acidentes no perímetro urbano envolvendo todos os tipos de veículos, pedestres e, evidentemente, também as carroças (alguns com vítimas fatais), sendo que 90% desses acidentes são causados por falha humana: desrespeito às placas "pare", circulação pela contramão e avanço de sinal vermelho.
Com o propósito de disciplinar o trânsito e resguardar a integridade física e material dos sujeitos e veículos circulantes, foi que a Superintendência de Transito de Dourados tomou a iniciativa de organizar e ministrar o Curso para condutor de veículo de tração animal, através do "Projeto Carroceiro". Nele, estão envolvidas dezenas de pessoas voluntárias dos mais diversos escalões da sociedade, que desejam colaborar para a segurança dos cidadãos. Prefeitura Municipal, Guarda Municipal, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Faculdade de Veterinária da UNIGRAN, Associação dos Carroceiros de Dourados, encabeçam o Projeto que reúne todo mês um grupo de cerca de 100 carroceiros, entre os das Reservas Indígenas e os que moram na periferia da cidade e que tiram o sustento da família através do trabalho diário na remoção de entulhos, pequenos fretes, captura e venda de materiais recicláveis e no serviço de jardinagem, enfim, estes que Milton Santos, em seu livro, define como os moradores da periferia ou "marginalização geográfica".
O currículo do curso foi construído com o propósito de dar uma formação resumida e fundamental onde o condutor tem noções básicas de legislação de trânsito, direção defensiva, cuidados com o animal, sinalização de trânsito, primeiros socorros e aula prática com o veículo de tração animal. Ao final de cada curso, é conferido ao participante um certificado e uma carteira de transporte animal, com a foto do habilitado, emitidos pela Superintendência de Transporte e Trânsito.
A atitude é louvável e muito contribui para a "formação educacional", para o trânsito dessa categoria, que vive marginalizada, renegada e excluída da sociedade "moderna". É um pingo de água no oceano? Sim. Mas já é alguma coisa.
*Acadêmico de Geografia e pesquisador-bolsista do projeto "Carroceiros em Dourados: "circuito inferior da economia" e mulheres e homens de tempo e espaço "lentos", da UFGD.
Dourados, "Cidade Educadora", com universidades de "peso", lindas mansões, "lan houses", lojas de grife, de avenidas largas e bem traçadas onde circulam 54.000 veículos emplacados pelo próprio município, e outros 4.000 rotativos de outras localidades, 26.000 motos e 140.000 bicicletas, amalgamados entre seus 200 mil habitantes (aproximadamente 13.000 são universitários de fora). Pouco se diferencia das outras cidades, de porte igual ou superior regidas pelo mesmo sistema do qual estamos todos inseridos.
Entretanto, uma informação do geógrafo Oslon Carlos E. Paes de Barros, Superintendente de Transporte e Trânsito, divulgada em entrevista a TV Morena, canal local, chamou-nos a atenção: 2.100 carroças de tração animal circulam em meio a tantos veículos, importados e de luxo, ou não, pela cidade. A princípio, pensando que se tratasse de certo exagero, fomos pesquisar e confirmamos que esse número poderá ser ainda maior após conclusão do trabalho que a Prefeitura está ministrando, tendo como responsável a Coordenadora de Educação para o Trânsito, Edna Cristina Chanfrin.
Algo que talvez justifique essa disparidade, e que poucos de nós munícipes tenham percebido, é que a cidade é limítrofe de duas das maiores aldeias indígenas do Estado: a Jaguapirú e Bororó, onde o meio de transporte mais comum é a carroça. Esta população indígena circula com mais de 1.500 carroças pelo perímetro urbano da cidade, pois esse é o principal meio de locomoção e para trabalho (venda de mandioca, milho verde, batata doce, etc.) donde tiram parte do sustento. Não é necessário dizer dos "transtornos" (para quem? Ou, imaginemos, quantos não são os transtornos que os motoristas, a "mil por hora", provocam para os carroceiros?) que esses condutores causam, involuntariamente e por falta de conhecimentos mais específicos, ao trânsito local. Segundo Edna Cristina, este ano, até o final de maio, ocorreram 400 acidentes no perímetro urbano envolvendo todos os tipos de veículos, pedestres e, evidentemente, também as carroças (alguns com vítimas fatais), sendo que 90% desses acidentes são causados por falha humana: desrespeito às placas "pare", circulação pela contramão e avanço de sinal vermelho.
Com o propósito de disciplinar o trânsito e resguardar a integridade física e material dos sujeitos e veículos circulantes, foi que a Superintendência de Transito de Dourados tomou a iniciativa de organizar e ministrar o Curso para condutor de veículo de tração animal, através do "Projeto Carroceiro". Nele, estão envolvidas dezenas de pessoas voluntárias dos mais diversos escalões da sociedade, que desejam colaborar para a segurança dos cidadãos. Prefeitura Municipal, Guarda Municipal, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Faculdade de Veterinária da UNIGRAN, Associação dos Carroceiros de Dourados, encabeçam o Projeto que reúne todo mês um grupo de cerca de 100 carroceiros, entre os das Reservas Indígenas e os que moram na periferia da cidade e que tiram o sustento da família através do trabalho diário na remoção de entulhos, pequenos fretes, captura e venda de materiais recicláveis e no serviço de jardinagem, enfim, estes que Milton Santos, em seu livro, define como os moradores da periferia ou "marginalização geográfica".
O currículo do curso foi construído com o propósito de dar uma formação resumida e fundamental onde o condutor tem noções básicas de legislação de trânsito, direção defensiva, cuidados com o animal, sinalização de trânsito, primeiros socorros e aula prática com o veículo de tração animal. Ao final de cada curso, é conferido ao participante um certificado e uma carteira de transporte animal, com a foto do habilitado, emitidos pela Superintendência de Transporte e Trânsito.
A atitude é louvável e muito contribui para a "formação educacional", para o trânsito dessa categoria, que vive marginalizada, renegada e excluída da sociedade "moderna". É um pingo de água no oceano? Sim. Mas já é alguma coisa.
*Acadêmico de Geografia e pesquisador-bolsista do projeto "Carroceiros em Dourados: "circuito inferior da economia" e mulheres e homens de tempo e espaço "lentos", da UFGD.
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