From Indigenous Peoples in Brazil
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Proposta que aumenta indenização a posseiros de terras indígenas pode ser questionada no STF
24/03/2010
Autor: Fabíola Munhoz
Fonte: Amazônia.org - http://www.amazonia.org.br
A recente aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC n° 3/2004) que pretende permitir a indenização pelo valor da terra nua a proprietários de terrenos usados para a criação de reservas indígenas foi criticada por organizações, que consideram o projeto conflitante com outros pontos da Constituição Federal.
Para Roberto Liebgot, vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a proposta confronta a determinação do art. 231 da Constituição, que determina a nulidade de títulos de propriedade incidentes sobre Terras Indígenas (TI). "A proposta tenta acabar com essa perspectiva constitucional para favorecer grileiros e fazendeiros com interesses econômicos nas terras indígenas", afirma.
Ele também diz que, caso aprovada pelo Congresso Nacional, a emenda poderá ser alvo de uma ação de inconstitucionalidade, a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Para Raul do Valle, advogado e coordenador do Instituto Socioambiental (ISA), a proposta, tal como está formulada, é um equivoco. "Nós sabemos, e a própria Constituição reconhece, que muitos casos de imóveis formalmente titulados foram áreas de invasão de TI, ou títulos fraudados. Portanto, não faria sentido você indenizar alguém que sabia que a área era indígena, ou, no mínimo, não quis verificar a procedência do título. A sociedade brasileira vai pagar por um título que nunca existiu", explicou.
De acordo com o jurista, a PEC também contraria o texto da Constituição, segundo o qual o direito indígena é originário, e, devido a essa contradição jurídica, a emenda poderia ser questionada no STF, caso aprovada. "Mas, isso depende da versão final que for aprovada para a proposta, se é que ela vai ser aprovada".
Hoje, apenas o valor das chamadas benfeitorias é indenizado no caso de desapropriação para a criação de reservas indígenas. A PEC que pretende ampliar essa indenização é de autoria do senador Juvêncio da Fonseca (PSDB/MS) e será submetida ao plenário do Senado antes de ir à Câmara dos Deputados. Um texto substitutivo à proposta estendeu o direito de indenização aos donos de terras com títulos de domínio emitidos após a promulgação da Constituição de 1988.
O senador Valter Pereira (PMDB-MS), em relatório, defendeu a opção dos proprietários de pedir na Justiça o pagamento pelos direitos sobre a terra nua, atitude que atualmente é proibida pela Constituição. "Estamos resgatando o direito de ação e o respeito ao princípio da propriedade. É uma obrigação da União indenizar o dono da terra", disse.
De acordo com Liebgot, a PEC é apoiada por segmentos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul que são grileiros de áreas em terras indígenas e, portanto, têm interesse no êxito da mudança da Constituição. "É mais uma estratégia desse segmento que visa diminuir o respeito aos direitos indígenas, relacionados à demarcação de terras, que estão previstos na Constituição Federal", afirma.
Valle concorda. "Com a aprovação da PEC, seriam beneficiados grandes fazendeiros com interesses capitalistas. Ou seja, compraram uma terra barata, exatamente porque essa tinha um título duvidoso, e, quando a área foi demarcada, perderam o título que nunca existiu juridicamente, mas não querem abrir mão de receber pela valorização da terra".
Ele, porém, chama atenção para a necessidade de se fazer uma distinção entre esse tipo de ação ilegal e a ocupação de terras indígenas por pequenos posseiros, de boa-fé. "Há casos em que você tem, por um lado, o direito dos índios ao seu território tradicional e, por outro, pequenos proprietários, ou posseiros, que estão no mesmo local- também há bastante tempo-, mas não têm nada a ver com o título que possuem, e foi fraudado há 50 ou 60 anos atrás. Essas pessoas também não têm condição de se estabelecer em outro local pelos critérios atuais de indenização que pagam só o valor da benfeitoria", esclarece.
Para essas hipóteses, o advogado defende a busca por uma solução que equilibre os direitos indígenas e a assistência necessária aos pequenos agricultores. De acordo com ele, poderiam ser desenvolvidas políticas conjuntas entre Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que, simultaneamente à desapropriação de áreas destinadas à criação de terras indígenas, fossem providenciadas terras- em condições e dimensões equivalentes-, aos pequenos agricultores que viviam no local.
Possíveis impactos da emenda
Na região de Dourados (MS), produtores rurais contestam estudos da Funai para a criação de uma extensa nova área indígena reivindicada pela etnia Guarani-Kaiowá. Em 2009, houve grande debate sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de retirar fazendeiros da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Nesse caso, não houve indenização aos invasores pela terra nua, mas apenas pelas benfeitorias.
A Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) comemorou a decisão da Comissão de Constituição e Justiça favorável à PEC n° 3/2004. "Um país que não proporciona segurança ao cidadão não merece crédito. Hoje, construímos um importante marco na segurança jurídica deste país", discursou a presidente da entidade, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
Por sua vez, o senador Jayme Campos (DEM-MT), que é pré-candidato ao governo de Mato Grosso, acusou a Funai de realizar avaliações "equivocadas" sobre terras indígenas e de estimular a "intranquilidade social".
Valle, do ISA, afirma que a PEC é uma prioridade dos ruralistas e irá dificultar a luta pela demarcação de terras indígenas no Mato Grosso do Sul. "Se isso passar do jeito que está, vai ser um desastre para o povo guarani, que já vive as mais sérias consequências da falta de terra. Afinal, não haverá orçamento para indenizar as terras".
http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=349183
Para Roberto Liebgot, vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a proposta confronta a determinação do art. 231 da Constituição, que determina a nulidade de títulos de propriedade incidentes sobre Terras Indígenas (TI). "A proposta tenta acabar com essa perspectiva constitucional para favorecer grileiros e fazendeiros com interesses econômicos nas terras indígenas", afirma.
Ele também diz que, caso aprovada pelo Congresso Nacional, a emenda poderá ser alvo de uma ação de inconstitucionalidade, a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Para Raul do Valle, advogado e coordenador do Instituto Socioambiental (ISA), a proposta, tal como está formulada, é um equivoco. "Nós sabemos, e a própria Constituição reconhece, que muitos casos de imóveis formalmente titulados foram áreas de invasão de TI, ou títulos fraudados. Portanto, não faria sentido você indenizar alguém que sabia que a área era indígena, ou, no mínimo, não quis verificar a procedência do título. A sociedade brasileira vai pagar por um título que nunca existiu", explicou.
De acordo com o jurista, a PEC também contraria o texto da Constituição, segundo o qual o direito indígena é originário, e, devido a essa contradição jurídica, a emenda poderia ser questionada no STF, caso aprovada. "Mas, isso depende da versão final que for aprovada para a proposta, se é que ela vai ser aprovada".
Hoje, apenas o valor das chamadas benfeitorias é indenizado no caso de desapropriação para a criação de reservas indígenas. A PEC que pretende ampliar essa indenização é de autoria do senador Juvêncio da Fonseca (PSDB/MS) e será submetida ao plenário do Senado antes de ir à Câmara dos Deputados. Um texto substitutivo à proposta estendeu o direito de indenização aos donos de terras com títulos de domínio emitidos após a promulgação da Constituição de 1988.
O senador Valter Pereira (PMDB-MS), em relatório, defendeu a opção dos proprietários de pedir na Justiça o pagamento pelos direitos sobre a terra nua, atitude que atualmente é proibida pela Constituição. "Estamos resgatando o direito de ação e o respeito ao princípio da propriedade. É uma obrigação da União indenizar o dono da terra", disse.
De acordo com Liebgot, a PEC é apoiada por segmentos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul que são grileiros de áreas em terras indígenas e, portanto, têm interesse no êxito da mudança da Constituição. "É mais uma estratégia desse segmento que visa diminuir o respeito aos direitos indígenas, relacionados à demarcação de terras, que estão previstos na Constituição Federal", afirma.
Valle concorda. "Com a aprovação da PEC, seriam beneficiados grandes fazendeiros com interesses capitalistas. Ou seja, compraram uma terra barata, exatamente porque essa tinha um título duvidoso, e, quando a área foi demarcada, perderam o título que nunca existiu juridicamente, mas não querem abrir mão de receber pela valorização da terra".
Ele, porém, chama atenção para a necessidade de se fazer uma distinção entre esse tipo de ação ilegal e a ocupação de terras indígenas por pequenos posseiros, de boa-fé. "Há casos em que você tem, por um lado, o direito dos índios ao seu território tradicional e, por outro, pequenos proprietários, ou posseiros, que estão no mesmo local- também há bastante tempo-, mas não têm nada a ver com o título que possuem, e foi fraudado há 50 ou 60 anos atrás. Essas pessoas também não têm condição de se estabelecer em outro local pelos critérios atuais de indenização que pagam só o valor da benfeitoria", esclarece.
Para essas hipóteses, o advogado defende a busca por uma solução que equilibre os direitos indígenas e a assistência necessária aos pequenos agricultores. De acordo com ele, poderiam ser desenvolvidas políticas conjuntas entre Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que, simultaneamente à desapropriação de áreas destinadas à criação de terras indígenas, fossem providenciadas terras- em condições e dimensões equivalentes-, aos pequenos agricultores que viviam no local.
Possíveis impactos da emenda
Na região de Dourados (MS), produtores rurais contestam estudos da Funai para a criação de uma extensa nova área indígena reivindicada pela etnia Guarani-Kaiowá. Em 2009, houve grande debate sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de retirar fazendeiros da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Nesse caso, não houve indenização aos invasores pela terra nua, mas apenas pelas benfeitorias.
A Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) comemorou a decisão da Comissão de Constituição e Justiça favorável à PEC n° 3/2004. "Um país que não proporciona segurança ao cidadão não merece crédito. Hoje, construímos um importante marco na segurança jurídica deste país", discursou a presidente da entidade, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
Por sua vez, o senador Jayme Campos (DEM-MT), que é pré-candidato ao governo de Mato Grosso, acusou a Funai de realizar avaliações "equivocadas" sobre terras indígenas e de estimular a "intranquilidade social".
Valle, do ISA, afirma que a PEC é uma prioridade dos ruralistas e irá dificultar a luta pela demarcação de terras indígenas no Mato Grosso do Sul. "Se isso passar do jeito que está, vai ser um desastre para o povo guarani, que já vive as mais sérias consequências da falta de terra. Afinal, não haverá orçamento para indenizar as terras".
http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=349183
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