From Indigenous Peoples in Brazil
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A ciência não é um deus que sabe tudo, diz líder ianomâmi
12/05/2010
Autor: YANOMAMI, Davi Kopenawa
Fonte: FSP, Ciência, p. A18
A ciência não é um deus que sabe tudo, diz líder ianomâmi
Davi Kopenawa diz estar contente com notícia de que sangue de seu povo será devolvido pelos EUA
Da Redação
O líder ianomâmi Davi Kopenawa disse estar "muito contente" com a notícia de que as mais de 2.000 amostras de sangue de seu povo, que desde 1967 repousam em centros de pesquisa dos Estados Unidos, serão devolvidas à tribo. Conforme a Folha adiantou no último domingo, há um acordo sendo finalizado entre cinco universidades e o governo brasileiro para a devolução, que ainda não tem data.
Da Alemanha, onde está para assistir a uma ópera que tem seu povo como protagonista, o líder indígena respondeu por e-mail, por intermédio do antropólogo Bruce Albert, a perguntas feitas pela reportagem. (CA)
Folha - Como o sr. recebeu a notícia de que as universidades aceitaram devolver o sangue?
Davi Kopenawa Yanomami - Foi uma luta de dez anos. Agora, fiquei muito contente que os brancos acabaram entendendo a importância desse retorno.
Folha - O sangue foi coletado nos anos 1960, mas só nesta última década os ianomâmis começaram a se esforçar para tê-lo de volta. Por quê?
Kopenawa - O sangue foi tirado do nosso povo quando eu era menino. Os cientistas não explicaram nada direito. Só deram presentes, panelas, facas, anzóis e falaram que era para coisa de saúde. Depois todo mundo esqueceu. Ninguém pensou que o sangue seria guardado nas geladeiras deles, como se fosse comida! Só em 2000 que eu soube que esse sangue estava ainda guardado e sendo usado para pesquisa. Aí me lembrei da minha infância, e os velhos também se lembraram de que nosso sangue foi tirado. Todo mundo ficou muito triste de saber que esse sangue nosso e de nossos parentes mortos ainda estava guardado.
Folha - Napoleon Chagnon e James Neel agiram errado com vocês?
Kopenawa - Eu acho que estavam muito errados, porque eles pensaram que os ianomâmis podem ser tratados como crianças e não têm pensamento próprio. Não dá para fazer pesquisa com povos indígenas sem explicação. Pesquisa que interessa à gente é para melhorar nossa saúde. Não dá para pesquisar e deixar a gente depois morrer de doenças. Um tempo depois que esses cientistas foram embora, em 1967, morreu quase todo o meu povo do Toototobi de sarampo.
Folha - Por que o sangue será jogado no rio quando ele voltar?
Kopenawa - Vamos entregar esse sangue do povo ianomâmi ao rio porque o nosso criador, Omama, pescou sua mulher, nossa mãe, no rio no primeiro tempo. Mas não gosto da palavra "jogar", não vamos jogar o sangue dos nossos antigos; vamos devolver para as águas.
Folha - Os cientistas dizem que, sem poderem estudar o sangue e o DNA de vocês, informações que podem ser preciosas para toda a humanidade se perderão para sempre. Como o sr. reage a essa crítica?
Kopenawa - A ciência não é um deus que sabe tudo para todos os povos. Se querem pesquisar o sangue do povo deles, eles podem. Quem decide se pesquisas são boas para nosso povo somos nós, ianomâmis.
FSP, 12/05/2010, Ciência, p. A18
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1205201002.htm
Davi Kopenawa diz estar contente com notícia de que sangue de seu povo será devolvido pelos EUA
Da Redação
O líder ianomâmi Davi Kopenawa disse estar "muito contente" com a notícia de que as mais de 2.000 amostras de sangue de seu povo, que desde 1967 repousam em centros de pesquisa dos Estados Unidos, serão devolvidas à tribo. Conforme a Folha adiantou no último domingo, há um acordo sendo finalizado entre cinco universidades e o governo brasileiro para a devolução, que ainda não tem data.
Da Alemanha, onde está para assistir a uma ópera que tem seu povo como protagonista, o líder indígena respondeu por e-mail, por intermédio do antropólogo Bruce Albert, a perguntas feitas pela reportagem. (CA)
Folha - Como o sr. recebeu a notícia de que as universidades aceitaram devolver o sangue?
Davi Kopenawa Yanomami - Foi uma luta de dez anos. Agora, fiquei muito contente que os brancos acabaram entendendo a importância desse retorno.
Folha - O sangue foi coletado nos anos 1960, mas só nesta última década os ianomâmis começaram a se esforçar para tê-lo de volta. Por quê?
Kopenawa - O sangue foi tirado do nosso povo quando eu era menino. Os cientistas não explicaram nada direito. Só deram presentes, panelas, facas, anzóis e falaram que era para coisa de saúde. Depois todo mundo esqueceu. Ninguém pensou que o sangue seria guardado nas geladeiras deles, como se fosse comida! Só em 2000 que eu soube que esse sangue estava ainda guardado e sendo usado para pesquisa. Aí me lembrei da minha infância, e os velhos também se lembraram de que nosso sangue foi tirado. Todo mundo ficou muito triste de saber que esse sangue nosso e de nossos parentes mortos ainda estava guardado.
Folha - Napoleon Chagnon e James Neel agiram errado com vocês?
Kopenawa - Eu acho que estavam muito errados, porque eles pensaram que os ianomâmis podem ser tratados como crianças e não têm pensamento próprio. Não dá para fazer pesquisa com povos indígenas sem explicação. Pesquisa que interessa à gente é para melhorar nossa saúde. Não dá para pesquisar e deixar a gente depois morrer de doenças. Um tempo depois que esses cientistas foram embora, em 1967, morreu quase todo o meu povo do Toototobi de sarampo.
Folha - Por que o sangue será jogado no rio quando ele voltar?
Kopenawa - Vamos entregar esse sangue do povo ianomâmi ao rio porque o nosso criador, Omama, pescou sua mulher, nossa mãe, no rio no primeiro tempo. Mas não gosto da palavra "jogar", não vamos jogar o sangue dos nossos antigos; vamos devolver para as águas.
Folha - Os cientistas dizem que, sem poderem estudar o sangue e o DNA de vocês, informações que podem ser preciosas para toda a humanidade se perderão para sempre. Como o sr. reage a essa crítica?
Kopenawa - A ciência não é um deus que sabe tudo para todos os povos. Se querem pesquisar o sangue do povo deles, eles podem. Quem decide se pesquisas são boas para nosso povo somos nós, ianomâmis.
FSP, 12/05/2010, Ciência, p. A18
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1205201002.htm
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