De Povos Indígenas no Brasil
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Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai)

Desde 1967, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) é o órgão indigenista oficial responsável pela promoção e proteção aos direitos dos povos indígenas de todo o território nacional.

Histórico

A criação da Funai no contexto da ditadura militar

Embora projetada pelos intelectuais do CNPI para superar os antigos impasses do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), a Funai acabou por reproduzi-los. Sua criação foi inserida no plano mais abrangente da ditadura militar (1964-1985), que pretendia reformar a estrutura administrativa do Estado e promover a expansão político-econômica para o interior do País, sobretudo para a região amazônica. As políticas indigenistas foram integralmente subordinadas aos planos de defesa nacional, construção de estradas e hidrelétricas, expansão de fazendas e extração de minérios. Sua atuação foi mantida em plena afinidade com os aparelhos responsáveis por implementar essas políticas: Conselho de Segurança Nacional (CSN), Plano de Integração Nacional (PIN), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

A ação da Funai durante a ditadura foi fortemente marcada pela perspectiva assimilacionista. O Estatuto do Índio (Lei nº 6.001) aprovado em 1973, e ainda vigente, reafirmou as premissas de integração que permearam a história do SPI. Por um lado, pretendia-se agregar os indígenas em torno de pontos de atração, como batalhões de fronteira, aeroportos, colônias, postos indígenas e missões religiosas. Por outro, o foco era isolá-los e afastá-los das áreas de interesse estratégico. Para realizar este projeto, os militares aprofundaram o monopólio tutelar: centralizaram os projetos de assistência, saúde, educação, alimentação e habitação; cooptaram lideranças e facções indígenas para obter consentimento; e limitaram o acesso de pesquisadores, organizações de apoio e setores da Igreja às áreas indígenas (M. Santilli, 1991).

A estrutura do órgão

O órgão foi concebido em bases semelhantes às do SPI. Até 1991 se manteve vinculado ao extinto Ministério do Interior, que sempre exerceu grande ingerência sobre suas ações. Os presidentes nomeados entre as décadas de 1970 e 1980 eram, em grande maioria, militares ou políticos de carreira pouco ou nada comprometidos, e até mesmo contrários aos interesses indígenas. A administração foi centralizada em Brasília. Os postos indígenas foram mantidos e as inspetorias transformadas em delegacias regionais. Outras instâncias – ajudâncias, superintendências, administrações executivas, núcleos locais de apoio – foram criadas e extintas ao longo do tempo. A despeito destas modificações, a Funai se estruturou aos moldes do SPI, de modo mais ou menos centralizado, com grande rigidez burocrática, em três níveis espaciais: nacional, regional e local (Souza Lima, 2001).

Apesar das irregularidades que levaram à extinção do SPI, seu quadro funcional foi transferido para a Funai. Com recursos escassos e mal contabilizados, a Funai continuou a operar, assim como o SPI, com profissionais pouco qualificados. Não se concretizou a proposta de se realizar planejamentos antropologicamente orientados, conduzidos por profissionais de formação sólida, bem pagos e comprometidos com o futuro dos povos indígenas. O órgão foi permeado, em todos os níveis, por redes de relações pessoais, clientelistas e corporativas, que remetem ao paternalismo e ao voluntarismo que dominaram o velho SPI. A criação da Funai foi marcada pela ineficiência, desinteresse e dificuldade de operação, o que levou o órgão a limitar sua intervenção a favor dos indígenas a situações altamente críticas, conflituosas e emergenciais, consequentes dos planos de colonização e exploração econômica que chegavam aos extremos do país (Oliveira, 2006; Souza Lima, 2002).

A emergência da questão indígena no cenário nacional

Neste contexto desfavorável, a questão indígena começou a emergir no cenário político nacional. A maior parte das organizações de apoio aos povos indígenas se estruturou na década de 1970. Entre elas destaca-se: as comissões pró-índio (CPIs), as associações nacionais de apoio ao índio (ANAIs), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), a Operação Amazônia Nativa (OPAN), o Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI) e o Núcleo de Direitos Indígenas (NDI). Estas duas últimas se juntaram para fundar o atual Instituto Socioambiental (ISA). Criadas por intelectuais e clérigos envolvidos com a questão indígena, estas entidades passaram a realizar importantes trabalhos como: o questionamento fundamentado às políticas oficiais, a interlocução entre indígenas e Funai, bem como a formulação de alternativas concretas para o indigenismo brasileiro (M. Santilli, 1991; Souza Lima, 2002).

Na década de 1980, diversas manifestações indígenas passaram a ganhar visibilidade nacional. Também neste período começaram a se estruturar suas primeiras organizações formais de base comunitária ou regional. Em âmbito nacional foi criada a União das Nações Indígenas (UNI), que já não existe mais. Conheça as organizações indígenas compiladas pelo ISA.

Os povos indígenas e o marco jurídico atual

Com as mobilizações indígenas e das organizações de apoio, a Constituição de 1988 acabou por conferir um tratamento inédito aos povos indígenas. Pela primeira vez foi reconhecido seu direito à diferença (Art. 231), rompendo com a tradição assimilacionista que prevaleceu até então. Foi garantido o usufruto exclusivo de seus territórios tradicionalmente ocupados, definidos a partir de seus usos, costumes e tradições (Art. 231). A União foi instituída definitivamente como instância privilegiada das relações entre os indígenas e a sociedade nacional. Através do artigo 232, os indígenas e suas organizações foram reconhecidos como partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos, o que incentivou a expansão e a consolidação de suas associações. Para isso, foram definidos canais diretos de comunicação entre os povos indígenas, o Ministério Público e o Congresso Nacional. Com estas medidas, o conceito de “capacidade relativa dos silvícolas” (Código Civil, 1917), e a consequente necessidade do “poder de tutela” perderam validade e atualidade. Estas vitórias constitucionais precisariam, entretanto, ser regulamentadas e consolidadas politicamente.

Em 1991, uma Comissão Especial foi instaurada para rever o Estatuto do Índio (1973) a partir do enfoque inovador da Carta de 1988. Foram abordados temas como: a situação jurídica dos indígenas e as responsabilidades assistenciais da Funai; os direitos de autoria e a propriedade intelectual; a proteção ambiental e a regulamentação do uso e exploração de recursos naturais; os procedimentos de demarcação de terras indígenas. A tramitação do projeto, entretanto, foi paralisada em 1994.

A descentralização do indigenismo oficial

No início da década de 1990, houve amplos debates acerca do papel do órgão indigenista oficial a partir do novo marco jurídico. O Ministério do Interior foi extinto e a Funai foi transferida ao Ministério da Justiça. Blocos parlamentares anti-indígenas propunham fechá-la, sem substituí-la por nada novo, o que provocaria um grande vazio administrativo. Mobilizações indígenas e organizações de apoio defendiam que a reestruturação do órgão fosse feita concomitantemente à aprovação do texto do Estatuto. Em 1991, o governo Collor realizou, por meio de decretos, uma ampla reforma das atribuições da Funai. As responsabilidades sobre saúde, educação, desenvolvimento rural e meio ambiente foram descentralizadas, e passaram a ser exercidas pelos Ministérios da Saúde, Educação, Desenvolvimento Agrário e Meio Ambiente. As ações extra-Funai decretadas por Collor tomaram rumos distintos e impactaram de modos diferenciados os povos indígenas do Brasil. Durante os anos FHC estas políticas passaram a adquirir contornos administrativos mais precisos. Algumas ONGs e associações indígenas passaram a participar ativamente do processo de implementação das políticas públicas.

Com os decretos de 1991, a Funai, esvaziada em suas atribuições, passou a se concentrar nas políticas de regularização fundiária. Em 1996, o governo FHC modificou as regras para a demarcação de Terras Indígenas visando destacar a necessidade da participação indígena e o direito a contestação das partes afetadas (Decreto 1775/96, Portaria 14/96).

O desenvolvimento dos projetos participativos

Também em 1996 passou a operar o Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL), resultado da parceria entre a Funai e o Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais do Brasil – PPG7. Embora direcionado à demarcação de terras, o PPTAL se propôs a criar alternativas concretas e de longo prazo ao modelo tutelar. Sua proposta se baseou no estímulo ao controle social e à atuação indígena qualificada na estrutura da Funai e do Estado de modo mais abrangente. Em seu âmbito, a partir da experiência dos Wajãpi do Amapá, foi criado o modelo de “demarcação participativa”, que tem como premissa básica a parceria e a co-responsabilidade dos povos indígenas na formulação das políticas que lhes afetam diretamente. Neste modelo, a própria demarcação é tomada como apenas uma das etapa do processo mais abrangente de gestão sustentável das Terras Indígenas. Trata-se de uma proposta baseada no diálogo intercultural, que apenas se realiza enquanto política pública com o pleno envolvimento e concordância dos povos interessados (Mendes, 2002).

A experiência inovadora do PPTAL estimulou a criação em 2001 do Projeto Demonstrativo dos Povos Indígenas (PDPI), desenvolvido no âmbito do Ministério do Meio Ambiente em parceria com o PP-G7. Este projeto é voltado ao financiamento de iniciativas de valorização cultural e desenvolvimento sustentável elaborados e geridos pelas populações indígenas e seus parceiros.

A Funai e as novas demandas por reconhecimento indígena

Em 2002, a ratificação pelo governo brasileiro da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre “Sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes” (1989) aprofundou a sustentação jurídica às demandas de povos antes tomados por aculturados e integrados, que atualmente reivindicam, em diversas regiões do Brasil, seus direitos indígenas diferenciados. Cada vez mais numerosas, estas reivindicações trazem novos desafios à atuação da Funai, responsável pela demarcação das Terras Indígenas no país.

A valorização dos conhecimentos tradicionais

Na virada do milênio, os conhecimentos indígenas e tradicionais passaram a ganhar destaque na agenda nacional e internacional. As discussões se concentram na criação e aprimoramento de mecanismos legais que impeçam que estas populações sejam expropriadas de seu rico patrimônio intelectual, produzido ao longo de gerações. O problema é evidente no caso dos conhecimentos associados à biodiversidade que têm sido alvo de inúmeros casos de biopirataria. Embora acordos internacionais como a Convenção da Diversidade Biológica e a Agenda 21, criadas no contexto da Eco-92, tenham destacado a urgência do problema, apenas em 2002 o Brasil iniciou, através de decreto presidencial (nº 4.339, de 22 de agosto de 2002), uma política nacional de biodiversidade, que, entretanto, precisa ser aprimorada em diversos aspectos (J. Santilli, 2000, 2002). Também neste âmbito e neste período, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), vinculado ao Ministério da Cultura, passou a realizar ações de proteção, valorização e salvaguarda do patrimônio cultural material e imaterial de povos indígenas e tradicionais. Estas ações decorrem do esforço de regulamentação da Constituição de 88, que em seus artigos 215 e 216 formaliza o valor imaterial dos bens culturais. No ano 2000 o decreto 3.551 instituiu os mecanismos oficiais de valorização e proteção do patrimônio cultural no Brasil. Estes instrumentos, entretanto, se encontram em fase inicial de consolidação e são alvo de pesquisas e debates entre especialistas. Até mesmo no campo internacional as propostas neste sentido são recentes. Data de 2003 a Convenção da UNESCO para a “Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial”.

O desafio da consolidação do paradigma participativo

Desde a Constituição de 1988 o indigenismo oficial passou por diversas e significativas mudanças, voltadas, de modo geral, ao reconhecimento e à valorização da diferença cultural. As políticas públicas direcionadas aos povos indígenas têm se tornado cada vez mais descentralizadas e realizadas no âmbito de diversos ministérios que atuam em parceria com agências de cooperação internacional e organizações não-governamentais. A premissa elementar do conjunto das ações é o estímulo à participação e à co-responsabilidade indígena na gestão das políticas destinadas a eles. Entretanto, o sucesso destas políticas depende de sua plena consolidação jurídica e institucional em todos níveis, do local ao governo central. Afinal, o poder tutelar, o assistencialismo e o assimilacionismo ainda são uma realidade fortemente enraizada em diversas práticas do relacionamento entre o Estado e os povos indígenas.

Em relação à consolidação jurídica deste novo momento, é notável que o Estatuto do Índio de 1973, de bases integracionistas, ainda esteja vigente. Entre 1991 e 1994, foi apresentada uma proposta de substituição ao texto que jamais foi votada pelo congresso. Em março de 2006, o governo federal criou a Comissão Nacional de Política Indígenista (CNPI). Em sua agenda, foi estabelecida a prioridade da atualização do Estatuto, com vistas a apresentar uma regulamentação integrada dos diversos temas da agenda dos povos indígenas: o patrimônio e os conhecimentos tradicionais, a proteção e a gestão territorial e ambiental, as atividades sustentáveis e o uso de recursos renováveis, o aproveitamento de recursos minerais e hídricos, a assistência social, a educação escolar e o atendimento à saúde diferenciados. Em julho de 2009, a proposta - construída com a participação de representantes indígenas – foi apresentada ao Congresso Nacional e aguarda votação.

Neste contexto, o atual CNPI e a Funai tem a tarefa de articular e integrar o conjunto das ações estatais de defesa dos direitos indígenas, com vistas a promover o paradigma participativo e superar definitivamente seu papel tutelar. Com este objetivo, o órgão indigenista oficial têm realizado esforços para atualizar suas práticas e modos de funcionamento.

Reestruturação da Funai

Em fins de 2009, o governo Lula anunciou, por meio de decreto presidencial (nº 7.056, 28/12), um amplo plano de reestruturação da Funai, que pretende oferecer maior capacidade de atuação onde vivem os povos indígenas. As Administrações Executivas Regionais (AERs) e Postos Indígenas (PIs) foram substituídos por Coordenações Técnicas Locais e Regionais, formadas por técnicos qualificados, que passarão a desenvolver ações participativas junto aos povos indígenas envolvidos. Nesta estrutura, está planejada a criação de Conselhos Consultivos, nos quais os indígenas e as organizações parceiras participam diretamente na formulação, implantação e gestão das políticas públicas a eles destinadas. Além disso, está prevista a criação de 3,1 mil cargos a serem preenchidos até 2012. Esta nova estrutura pretende, conforme sua direção, superar os impasses históricos do órgão indigenista oficial. Apreensivos, diversos povos se posicionaram contra as mudanças e reclamaram de falta de consulta prévia prevista na Convenção nº 169 da OIT.

Galeria dos presidentes da Funai

A história do controvertido órgão indigenista oficial, a Funai (Fundação Nacional do Índio), pode ser contada através da sucessão de seus 40 presidentes ao longo de quase 50 anos, de 1967 a 2017.

Presidentes da Funai (1967-2017)
Presidentes Quem é | O que fez
Franklimberg Ribeiro de Freitas
[mai. de 2017]

O general do exército Franklimberg Ribeiro de Freitas assumiu interinamente a presidência da Funai após a exoneração de Antônio Costa. Em julho de 2017, foi plenamente empossado. Franklimberg é militar da reserva, tendo ingressado nas Forças Armadas em 1976, e antes de ser nomeado para a Funai exercia o cargo de assessor de relações institucionais do CMA (Comando Militar da Amazônia), sediado em Manaus (AM).

Assume a presidência da Funai poucos dias após um massacre realizado contra os Gamela, no Maranhão e em meio à uma intensa crise política desencadeada por investigações de corrupção no governo Temer.

Antonio Fernandes Toninho Costa
[jan. de 2017 a mai. de 2017]

Dentista e pastor evangélico de Luiziânia (GO), já atuou como assessor parlamentar. Interessante notar o contexto da decisão de sua nomeação como novo presidente da Funai. Segundo a reportagem da Globo News, o presidente da República, Michel Temer, em reunião com ministros sobre obras de infraestrutura, foi informado sobre impasses e conflitos com indígenas, que estariam impedindo a continuidade das obras, e que a Funai estava com um presidente interino. Ele então solicitou ao ministro da Justiça que resolvesse a questão – provavelmente com a expectativa de conseguir a aprovação da Funai para as obras paralisadas. Dentro da lógica de loteamento à base aliada, Temer aceitou a indicação do Partido Social Cristão (PSC), cujo presidente é o Pastor Everaldo e que é integrado por Jair Bolsonaro e Marcos Feliciano. Costa já trabalhou com povos indígenas na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e na Missão Evangélica Caiuá – antiga missão que prestava assistência aos Guarani em Mato Grosso do Sul e hoje atua em diversos Distritos Sanitários Especiais de Saúde Indígena (DSEIs) através de convênio com a Sesai.

Agostinho do Nascimento Netto
[set. de 2016 a jan. 2017]

Assessor especial do Ministério da Justiça desde junho de 2016, desconhecido do movimento indígena e indigenista, foi nomeado Presidente substituto da Funai em setembro do mesmo ano. Durante sua curta gestão, ele aprovou a TI Pindoty/Araça-Mirim, no Vale do Ribeira (SP), no dia 29 de dezembro de 2016, com 1.030 hectares.

Artur Nobre Mendes
[jun. de 2016 a set. 2016]

Funcionário de carreira da Funai, o antropólogo Artur Nobre Mendes assumiu a presidência dó órgão em substituição a João Pedro Gonçalves, exonerado pelo governo interino de Michel Temer. Artur Nobre Mendes já fora presidente da Funai entre 2002 e 2003 e no momento ocupava o cargo de diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável. (Veja mais abaixo informações sobre o seu primeiro mandato)

Em 2016, permaneceu no cargo de presidente substituto por aproximadamente 4 meses. Em sua curta interinidade, Artur publicou, em agosto de 2016, a identificação de três TIs Guarani no estado de São Paulo: Djaiko-aty com 1,216 ha, Ka'aguy Mirim com 1.190, e a Ambá Porã com 7.204 ha.

Foi exonerado em Setembro, poucos dias após a Funai criticar a organização dos Jogos Paralímpicos Rio 2016 por terem afirmado, na apresentação da menina Igani Suruwaha, que a menina e a mãe tiveram que deixar a comunidade onde viviam para “evitar o infanticídio indígena”. Em nota de repúdio, a Funai disse que a informação do Comitê Organizador dos Jogos promove “ofensa e desrespeito aos povos indígenas do Brasil, referindo-se ao 'infanticídio ou homicídio, abuso sexual, estupro individual ou coletivo, escravidão, tortura, abandono de vulneráveis e violência doméstica' como 'práticas tradicionais' indígenas. A Funai entende que tal posicionamento revela uma total incompreensão sobre a realidade indígena no país, refletindo uma visão preconceituosa e discriminatória sobre esses povos, suas culturas e seus modos de vida.

João Pedro Gonçalves da Costa
[jun. de 2015 a jun. de 2016]

Foi deputado estadual, vereador e senador suplente do estado do Amazonas. Também trabalhou como superintendente estadual do Instituto Nacional de Colonização Reforma Agrária no Amazonas Assumiu a presidência da Funai no lugar de Flavio Chiarelli Vicenti de Azevedo, que foi presidente interino durante 8 meses.

Segundo nota d'A Crítica (14/06/15), sua indicação "foi uma costura de parlamentares petistas do Norte com o argumento de que o Governo Dilma precisa dar mais espaços a políticos da Amazônia assim como Lula fez quando pôs Marcus Barros no Ibama, e Marina Silva, no Ministério do Meio Ambiente."

Seu mandato coincidiu com os últimos meses antes de a Presidente Dilma Roussef ser afastada do cargo e nesse curto período buscaram reverter a paralisia de demarcações que até então marcara esse governo. Durante seu mandato foram aprovados pela Funai os estudos das terras: Cobra Grande (PA) dos povos Arapiuns, Jaraqui e Tapajó; Kaxuyana-Tunayana (AM/PA), dos Kaxuyana, Tunayana e outros; Jurubaxi-Téa (AM), dos Baré, Tukano, Baniwa e outros; Sawré/Muybu (PA), dos Munduruku; Sambaqui (PR), Pakurity (MS), Peguaoty (MS) e Cerco Grande (PR), dos Guarani Mbya; Ypoi-Triunfo (MS), dos Guarani Ñandeva; Dourados Amambaipeguá I, dos Kaiowáa e Ñandeva; e Mato Castelhano-FÁg TY KA (RS), dos Kaingang.

Flávio Chiarelli Vicente de Azevedo
[out. de 2014 a jun. de 2015]

Foi chefe da Procuradoria Federal Especializada da Funai. Assumiu a Presidência interinamente, em substituição à também interina Maria Augusta Assirati.

Permaneceu os 8 meses de sua gestão como presidente interino. Nesse período apesar das determinações do governo de paralisar o reconhecimento das Terras Indígenas (TIs) - conseguiu aprovar e publicar no DOU em janeiro de 2015, os estudos de identificação e delimitação da TI Riozinho, dos indígenas Ticuna e Kokama com 362.495 hectares, nos municípios de Juruá e Jutai no Amazonas.

Criou três Grupos Técnicos (GTs) para estudos de novas TIs: uma para os Ticuna, em Fonte Nova/Amazonas, outra em Paraty no Rio de Janeiro para os Guarani, e a pela primeira vez a Funai criou um GT para reconhecer uma TI no no Rio Grande do Norte, no município de Baía Formosa: a Sagi/Trabanda.

Em junho de 2015, com a nomeação do novo presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa, Flávio Chiarelli foi nomeado assessor especial do Ministro da Justiça.

Segundo ele, o governo tem um olhar não-indígena para os povos tradicionais, 'achando que eles são os causadores de problemas. Quando, na verdade, a gente deveria parar para olhar o lado deles e enfrentar a real causa do problema". (Greenpeace, Jun/15)

Maria Augusta Boulitreau Assirati
[jun. de 2013 a out. de 2014]

Advogada, dirigiu o Departamento de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável (DPDS) da Funai e assumiu a Presidência interinamente, com a exoneração de Marta Maria Azevedo.

Mesmo mantida em interinidade durante um ano e quatro meses, em um governo que primou pela paralisia das demarcações de Terras Indígenas, ela conseguiu aprovar e publicar três estudos de identificação das TIs: Tapeba com 5.838 hectares, no Ceará; da Herareka Xetá com 2.686 hectares, no Paraná; e a ampliação da TI Xakriabá com 43.357 em Minas Gerais.

Maria Augusta pediu demissão por conta de um curso de doutorado em Portugal, mas segundo o jornal O Globo, de 25 de setembro de 2014, alguns dos motivos principais seriam as divergências envolvendo a construção de hidrelétricas e a disputa enfrentada pela própria Funai, no interior do governo, para realizar sua tarefa primordial: a demarcação de terras indígenas. A interferência política do governo sobre a atuação da Funai foi apontada pela ex-presidente em entrevista na Agência Pública, de janeiro de 2015:

A orientação é no sentido de que nenhum processo de demarcação em nenhum estágio, delimitação, declaração, ou homologação, tramite sem a avaliação do Ministério da Justiça e da Casa Civil. Isso é, nada mais, nesse momento, “depende apenas da Funai”." (APública, Jan/2015)

Marta Maria Azevedo
[abr. de 2012 a jun. de 2013]

Professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Marta Maria do Amaral Azevedo é antropóloga, demógrafa, e autora de um dos primeiros trabalhos de pesquisa sobre demografia dos povos indígena. Nascida em São Paulo, formou-se em Ciências Sociais em 1978 pela Universidade de São Paulo (USP). Em 1980 integrou o grupo de Educação Indígena da Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP) e atuou como colaboradora do Programa Povos Indígenas no Brasil do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI). Também foi colaboradora do ISA, do Núcleo de História Indígena e do Indigenismo da Universidade de São Paulo – onde ajudou a fundar o Grupo Mari de Educação Indígena – e do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), no início da década de 1990. Participou da equipe de demógrafos que, em conjunto com o IBGE, Funai e especialistas de várias e diferentes instituições, aprimorou a coleta das informações sobre os povos indígenas para o censo brasileiro de 2010. Suas investigações envolvem temas como educação indígena, segurança alimentar e saúde das mulheres indígenas, os quais contam com o comprometimento de Marta em sua gestão.

Em um ano e dois meses no cargo, Marta aprovou os estudos de identificação de 14 Terras Indígenas. Destacamos algumas: a TI Iguatemipeguá I com mais de 41 mil hectares, para os Kaiowá, localizada em região de intensos conflitos com fazendeiros, no Mato Grosso Sul; também aprovou os reestudos de duas terras guarani em S.Paulo, a Jaraguá (com 532 ha, na capital) e a Boa Vista do Sertão Pró-Mirim (no município de Ubatuba com 5.520 ha); seis terras mura tiveram seus estudos de identificação aprovados nos municípios de Borba, Autazes, Carreiro da Várzea, Manaquiri e Careiro, todos no estado do Amazonas, somando 72.631 ha. A ministra chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, exonerou, a pedido, Marta Maria do Amaral Azevedo da presidência da Funai em Junho de 2013.

Márcio Meira
[abr. 2007 a abr. 2012]

Formado em História pela Universidade Federal do Pará (UFPA), com mestrado em Antropologia pela Universidade de Campinas (Unicamp), o atual Presidente da Funai pesquisou os povos Warekena, da região do rio Xié, um dos afluentes do rio Negro, no Amazonas, no início dos anos 1990. É o autor da tese "No tempo dos Patrões", sobre o regime de aviamento que ainda vigora nas relações entre extrativistas e comerciantes no interior da Amazônia. Sua atuação com os povos indígenas, porém, é anterior e data desde sua participação na luta pelos direitos indígenas na Constituição Federal de 1988. Foi também responsável pelo GT da Funai de identificação das Terras Indígenas do Médio Rio Negro, localizadas nos municípios de São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro. Meira foi um dos interlocutores das organizações indígenas na equipe de transição do governo Lula, em 2002. Sua gestão foi responsável pelo processo de reestruturação da Funai, que renovou o quadro funcional (com 425 novas contratações) e a estrutura administrativa do órgão. Também foi resposável pela inauguração do Centro de Formação em Política Indigenista em Sobradinho/DF. Apesar de ter priorizado a participação do movimento indígena e de ter implantado a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), ao final da gestão Meira ocorreu um rompimento da bancada indigenista com a comissão, no qual entidades ligadas à Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) decidiram deixar a CNPI.

Mércio Pereira Gomes
[set. 2003 a março de 2007]

Dirigiu o IPARJ (Instituto de Pesquisas Antropológicas do Rio de Janeiro) e participou da política carioca quando do governo de Leonel Brizola (1991-95), na condição de subsecretário de Cultura e Projetos Especiais. Foi também assessor de projetos especiais da cidade de Petrópolis. Depois de Roque Laraia e Artur Nobre Mendes, Mércio Gomes é o terceiro antropólogo a assumir a presidência da Funai. Foi professor de antropologia na Unicamp, UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Macalestes (EUA) e na UFF (Universidade Federal Fluminense). Membro efetivo do Diretório Estadual do PPS, partido da base aliada do governo Lula, Mércio Gomes já era cotado para a presidência da Funai na campanha eleitoral de 2002 em um eventual governo Ciro Gomes.

Eduardo Aguiar de Almeida
[fev. de 2003 a ago. de 2003]

Primeiro presidente da Funai do governo Lula, Eduardo Aguiar de Almeida ficou apenas seis meses no cargo, tendo sido exonerado em 15 de agosto de 2003, por meio de portaria da Casa Civil. O ministro da justiça declarou-se insatisfeito com o seu trabalho à frente da Funai em mais de uma ocasião, em que observava a "falta de sintonia" de Almeida com os interesses do Ministério. Os rumores sobre a sua substituição começaram a circular há pelos menos 2 meses desde que ele assumiu a pasta. Em entrevista à imprensa, Almeida atribuiu sua demissão à forte pressões oriundas dos setores anti-indígenas da política nacional, citando diretamente os nomes dos senadores Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Romero Jucá (PMDB-PR) e dos governadores Blairo Maggi (PPS-MT), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC).

Almeida tomou posse oficialmente no cargo mais de um mês após o início da nova gestão do governo brasileiro, em 03/02/2003. É natural do Rio de Janeiro, jornalista e membro fundador da Sociedade Brasileira de Indigenistas (SBI). Já trabalhou na Funai como assessor da presidência entre janeiro e agosto de 2000. Desde janeiro de 2002, atuava como consultor do Ministério do Meio Ambiente. Em sua gestão, Almeida concentrou parte de seus esforços na preparação da Conferência Nacional de Política Indigenista, um dos ítens mais relevantes na pauta petista para a questão indígena – já expresso no documento de campanha de Lula à presidência, intitulado Compromisso com os Povos Indígenas – e cujo objetivo é o de criar uma instância de articulação entre os setores governamentais que têm responsabilidades para com as demandas indígenas, representantes dos indígenas e outros setores da sociedade civil. No âmbito das reivindicações territoriais, Almeida criou Grupos de Trabalho (Gts) para identificar 17 novas Terras Indígenas e reestudar os limites de outras dez. Uma decisão inovadora da gestão de Eduardo Aguiar de Almeida foi a determinação do critério da "auto-identificação" como instrumento fundamental para que se reconheça como indígenas os grupos que reivindiquem esta condição, adequando as ações do Estado brasileiro à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

'Artur Nobre Mendes
[ago. de 2002 a jan. de 2003]'

Funcionário de carreira da Funai, o antropólogo Artur Nobre Mendes foi o nono presidente do órgão indigenista em oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso. Na Funai desde 1983, Mendes sempre havia atuado na área fundiária. Foi chefe do Departamento de Identificação e Delimitação (Deid), coordenador de Projetos Especiais e coordenador técnico do Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal - o PPTAL, que, ligado ao Programa Piloto de Proteção às Florestas Tropicias do Brasil (PPG7), tem por objetivo demarcar 160 terras indígenas. No momento em que assumiu a presidência da casa, ocupava a diretoria do Departamento de Assuntos Fundiários (DAF), posto em que estava desde a gestão de Glênio da Costa Alvarez.

Artur Nobre Mendes foi formalmente apresentado no novo cargo em 31/07/2002, juntamente com a equipe recém-constituída por Paulo de Tarso Ramos Ribeiro, o oitavo ministro da Justiça a assumir a pasta ao longo das duas gestões FHC. Mendes permaneceu à frente da Funai até janeiro de 2003, quando, já então no primeiro mês do governo de Luís Inácio Lula da Silva, pediu demissão.

Otacílio Antunes Reis Filho
[jun. a jul. 2002]

A saída de Glênio Alvarez levou à presidência da Funai Otacílio Antunes Reis Filho, antigo funcionário do órgão, então no cargo de diretor de Artesanato. Reis Filho, que já havia sido diretor de Planejamento na gestão de Romero Jucá à frente da Funai, dirigiu a Fundação por 46 dias, entre junho e julho de 2002.

Glênio Alvarez
[mai. 2000 a jun. 2002]

O geólogo Glênio Alvarez, funcionário da Funai há 14 anos, é o 27º presidente do orgão indigenista oficial desde sua fundação, em 1967. Foi administrador regional do órgão em Boa Vista (RR), em 1994, período de demarcação da TI Yanomami.

A escolha de Alvarez, gaúcho de Santa Maria, encerrou a interinidade do antropólogo Roque de Barros Laraia, que ocupou o cargo desde a saída de Carlos Frederico Marés. Alvarez assumiu dizendo pretender implantar programas conjuntos com governos estaduais. Seu principal desafio seria contornar a falta de verbas para desenvolver os programas previstos para 2000.

No início de junho de 2002, a publicação no Diário Oficial da União da exoneração de Glênio Alvarez pegou a todos de surpresa. Ele, inclusive, que não quis se manifestar logo após o ocorrido. Por meio de seu assessor de imprensa, declarou que "havia feito seu trabalho corretamente a favor dos índios no Brasil". A queda de Alvarez aconteceu dois dias depois que o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara, deputado Pinheiro Landim, retirou de pauta o Projeto de Lei da Mineração em Terras Indígenas. A Funai havia se manifestado contrária à aprovação do projeto, de autoria do senador Romero Jucá.

Roque de Barros Laraia
[abr. a mai. de 2000]

Com a demissão de Marés, o então presidente substituto, o antropólogo Roque de Barros Laraia, assumiu a presidência da Funai em regime interino. Foram 29 dias até que Glênio Alvarez fosse nomeado presidente pelo ministro José Gregori.

Laraia é formado em história, mas optou pela antropologia. Foi parte do corpo docente do Museu Nacional (UFRJ) e, a partir de 1968, da UnB. É integrante do Conselho Indigenista desde que foi criado, em 1967. À época, esse conselho representava o poder máximo no órgão. O antropólogo tem experiência de pesquisa com os Terena e os Suruí do Pará.

Durante a gestão de Marés, Roque Laraia foi o responsável pela Diretoria de Assuntos Fundiários. Em entrevista exclusiva ao Isa, confessou que os maiores problemas por ele enfrentados em sua curta gestão na presidência, foram o esvaziamento dos quadros profissionais, a escassez de recursos e a pressão constante de grupos indígenas, como os Xavante e os Fulniô. Segundo ele, "não é possível administrar a Funai com os Xavante do jeito que estão". Para ele, a maioria dos indígenas continua desassistida, ao passo que uma etnia acaba consumindo o tempo da administração e tomando a maioria dos recursos parcamente disponíveis.

Carlos Frederico Marés
[nov. de 1999 a abr. de 2000]

Nascido em União da Vitória (PR), Carlos Frederico Marés de Souza Filho é professor de Direito Agrário e Ambiental da PUC-PR. Foi procurador do estado do Paraná entre 1991 e 1994, e secretário da Cultura do município de Curitiba, entre 1983 e 1988.

Colaborou, na Assembléia Nacional Constituinte (1987-88), na formulação do Capítulo VIII, "Dos Índios", e foi um dos coordenadores da campanha "Povos Indígenas na Constituinte". Em 1989, fundou o Núcleo de Direitos Indígenas (NDI), e, em 1994, o Instituto Socioambiental, do qual foi presidente e conselheiro.

Marés é também autor de seis livros, o último deles - "O renascer dos povos indígenas para o Direito" - é resultado de sua dissertação de doutoramento apresentada, em 1988, à UFPR.

Marés foi indicado para a presidência da Funai pelo ministro da Justiça, José Carlos Dias, que advogou em seu favor, providenciando a regularização de sua situação no Brasil, quando de seu retorno depois de nove anos de exílio.

Antes de assumir o cargo, Marés apresentou 13 propostas para o ministro como condição para poder assumir a presidência da Funai (ver artigo Descascando o "abacaxi", nos "500 anos" do Brasil). Entre elas, estava a homologação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol.

O curto período em que Marés esteve na Funai foi marcado por atos polêmicos. Logo no início de 2000, declarou publicamente que não haveria o que comemorar no dia 22 de abril, aniversário de 500 anos do "descobrimento" do Brasil. "É uma festa da chegada das caravelas, festa dos brancos. A maior parte dos indígenas brasileiros tem contato com a civilização branca há bem menos de 500 anos", disse ele.

A gestão de Marés foi marcada pela negociação em torno da apresentação da nova proposta para o "Estatuto do Índio". Em 17 de abril de 2000, Marés apresentou a proposta do governo "Estatuto do índio e das comunidades indígenas" às lideranças indígenas que se reuniam em Monte Pascoal, em ocasião da marcha de protesto contra as comemorações dos 500 anos. Isso se deu antes mesmo da proposta ser submetida ao Legislativo.

Em 22 de abril, após presenciar uma ação da polícia contra a marcha dos indígenas que iam de Coroa Vermelha a Porto Seguro para protestar contra as comemorações dos 500 anos, Marés anunciou que pediria demissão. "Não posso permanecer num governo que faz agressão física ao movimento indígena organizado", afirmou após ter decidido, em caráter irrevogável, apresentar sua demissão ao ministro da Justiça José Gregori.

Márcio Lacerda
[fev. a nov. de 1999]

José Márcio Panoff de Lacerda tomou posse na Presidência da Funai em 22 de fevereiro de 1999. Foi deputado, senador e vice-governador do Mato Grosso. Em seu discurso de posse, prometeu investir na aprovação de um novo Estatuto do Índio, "que reflita uma política realista, voltada para proporcionar às sociedades indígenas o legítimo direito de explorar em bases racionais os recursos naturais existentes em suas terras".

Sua atuação foi marcada pela defesa de parcerias entre o estado e os municípios para melhorar os atendimentos às sociedades indígenas.

Em 31 de maio, Lacerda foi retirado à força do prédio da Funai por 51 guerreiros xavante, que se revoltaram devido ao afastamento do diretor da AER de Nova Xavantina.

A gestão de Lacerda teve de enfrentar, a partir de maio de 1999, os inquéritos por ocasião da CPI da Funai, promovida por parlamentares que visavam investigar o relacionamento do órgão federal com ONGs, admissão de antropólogos e aplicação de recursos. Nesse período, tornou-se cada vez mais público o caos orçamentário da Funai.

Em novembro, por pressões dos povos indígenas, de várias instituições e de ONGs, colocou o cargo à disposição. Na ocasião, ele admitiu que enfrentou conflitos internos, principalmente com o médico Oswaldo Cid Nunes da Cunha, exonerado da chefia do Departamento de Saúde na Funai em Brasília, que classificou Lacerda de "incompetente".

Lacerda acusou o médico de deslealdade ao condenar publicamente a decisão do governo de transferir a área de saúde indígena para a Fundação Nacional de Saúde.

Sulivan Silvestr
[ago. de 1997 a fev. de 1999]

Sulivan Silvestre, paranaense, funcionário do Ministério Público de Goiás, tomou posse em 22 de agosto de 1997. Formado em Direito pela PUC de Goiás, Silvestre era especialista em meio ambiente. Desconhecido entre indígenas e indigenistas, seu nome surpreendeu, já que estavam cotados para ocupar o cargo antropólogos e funcionários da Funai conhecidos pela comunidade.

Sua nomeação comprovou o poder de fogo do ministro Íris Rezende, que conseguiu colocar no comando um apadrinhado político sem nenhuma experiência com a política indigenista. A indicação política desagradou o funcionalismo da Funai, que torcia pela nomeação de um técnico dos quadros da Fundação e algumas organizações não-governamentais.

Em seu discurso de posse, Silvestre afirmou ser a demarcação de terras a prioridade de sua gestão. Além disso, enfatizou a necessidade de uma aproximação entre a Funai, os indígenas e as demais entidades de apoio.

Procurou estruturar o Conselho Deliberativo e Participativo das Lideranças Indígenas, promovendo o diálogo entre a Funai, os representantes indígenas, as ONGs, o Cimi e o Capoib, sempre em defesa da descentralização do órgão indigenista.

Em 1 de fevereiro de 1999, Silvestre morreu em um acidente de avião. O bimotor Sêneca, que o levaria de Brasília até uma reunião com os indígenas Fulni-ô e Pankararu, caiu a poucos minutos da pista do aeroporto de Goiânia. O acidente ocorreu por volta das 21h30. Pouco depois da queda, o aparelho foi consumido pelo fogo. Renan Calheiros, ministro da Justiça na época, afirmou que iria acompanhar as investigações sobre o acidente.

Júlio Gaiger
[mar. de 1996 a jul. de 1997]

O advogado gaúcho Júlio Gaiger foi nomeado presidente da Funai em 12 de março de 1996, ocupando o lugar de Márcio Santilli. Ligado à questão indígena desde 1977, quando dirigiu a Associação Nacional de Apoio ao Índio em Porto Alegre, Gaiger foi assessor jurídico do Cimi até 1991 e trabalhou como assessor na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara.

Foi indicado pelo ministro Nelson Jobim, com quem trabalhava desde meados de 1995 na formulação do polêmico Decreto 1775, que prevê a revisão de áreas indígenas ainda não registradas. Essa indicação causou imediatos protestos de organizações indígenas e de apoio.

Em junho de 1997, apesar dos apelos dos Xavante pela saída imediata de Gaiger, o novo ministro da Justiça, Íris Rezende, bancou a sua permanência. Mas, em 17 de julho, Gaiger entregou o cargo, alegando que o governo não teria se empenhado na implementação da política indigenista e que lhe teria faltado apoio político para levar adiante a reformulação administrativa do órgão.

"Ressinto-me, na Funai, da ausência de decisões estratégicas que escapam do nosso alcance", escreveu em sua carta de demissão. Em entrevista, disse que vinha sofrendo pressões dos Xavante, de funcionários da Funai e de grupos políticos vinculados aos indígenas e aos servidores que, na sua opinião, tencionavam desestabilizá-lo para que não reformulasse o órgão.

Márcio José Brando Santilli
[set. de 1995 a mar. de 1996]

Indicado por FHC, um dia depois de uma reunião ocorrida no palácio da alvorada em 03/08/95 entre o presidente, o ministro da justiça e um grupo de antropólogos, Santilli não era o preferido de Jobim. Então secretário executivo do Instituto Socioambiental em Brasília, Santilli demorou um mês para aceitar a indicação, período em que indicou outros nomes ao ministro Jobim.

Consultou previamente várias ONGs do campo indigenista sobre a oportunidade de encarar o desafio de administrar uma Funai sucateada e enfrentar um novo decreto sobre demarcação de terras indígenas, medida já decidida pelo presidente FHC.

Formado em filosofia, Santilli foi deputado pelo PMDB de SP (1982-86) e integrante do grupo político do atual presidente FHC. Durante seu mandato parlamentar, foi membro da Comissão de Relações Exteriores e da Comissão do índio, na Câmara dos Deputados.

Entre 1987 e 88, foi pessoa-chave na ligação entre a Coordenação Nacional dos Povos Indígenas na Constituinte - que reunia indígenas e organizações civis de apoio - e o Congresso Nacional. Em 1989, juntamente com um grupo de indígenas, antropólogos e juristas, fundou e dirigiu o NDI, uma ONG com sede em Brasília, que teve destacado papel na aplicação prática dos direitos coletivos dos indígenas, através de demandas judiciais paradigmáticas. Em 1994, foi um dos fundadores do Instituto Socioambiental.

O Cimi considerou a sua nomeação como "uma tentativa do governo para criar condições políticas favoráveis para mudar o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas". Além da Igreja Católica, Santilli ganhou muitos inimigos internos com a demissão de funcionários corruptos das Áreas Kayapó e Xavante, o corte de diárias de caciques xavante em Brasília, o fechamento de Administrações Regionais, e o anúncio de uma grande reforma administrativa.

Enfrentou várias rebeliões regionais e sequestros de funcionários por indígenas articulados com segmentos de máfias funcionais e o seu próprio gabinete em Brasília foi invadido por um grupo de Xavante, acompanhado da Rede Globo de TV. Santilli pediu demissão alegando falta de apoio do Ministério da Justiça, que não buscava ampliar as verbas da Funai e retinha os recursos que ele conseguira diretamente do Tesouro Nacional, além de não garantir a investigação policial a respeito das máfias funcionais.

Dinarte Nobre Madeiro
[set. de 1993 a set. de 1995]

Dinarte assumiu interinamente a presidência da Funai, no dia 03/09/93, e acabou permanecendo dois anos à frente do órgão. Há 23 anos funcionário da Funai, ao assumir o cargo era assessor da Presidência do órgão para a região Norte e Nordeste, e estava em Boa Vista coordenando a retirada dos garimpeiros da AI Yanomami. Defendeu a necessidade do órgão retomar o poder de polícia para ter mais autonomia e mobilidade no combate aos garimpeiros que invadem terras indígenas.

Madeiro foi mantido no cargo com a mudança de governo e, no conjunto, teve uma gestão discreta, sem denúncias de improbidades administrativas. Apesar disso, Dinarte foi publicamente desprestigiado pelo ministro da Justiça Nélson Jobim e pelo próprio presidente FHC. Chegou a pedir demissão alegando suas divergências com o secretário-executivo do Ministério, Milton Selligman, na questão das demarcações das terras indígenas, principalmente sobre a área dos Xavante, a Suiá-Missu. O ministro não aceitou a demissão. Afastado das deliberações sobre os rumos da política indigenista oficial, colocou seu cargo à disposição mais de uma vez e manifestou sucessivamente seu apoio à manutenção dos procedimentos administrativos constantes no Decreto 22/91.

Cláudio dos Santos Romero
[mai. a set. de 1993]

Claudio Romero ocupava o cargo de Diretor Geral de Assistência da Funai, quando foi nomeado para presidir o órgão em 20/05/93. Funcionário de carreira do órgão,desde meados da década de setenta, coordenou o Projeto Xavante que tinha como principal objetivo a demarcação do território xavante ocupado pela frente colonizadora, além de projetos de educação e desenvolvimento comunitário. Foi diretor do Parque Indígena do Xingu, quando entre outras coisas apoiou os Kayapó Metuktire na demarcação da AI Capoto/Jarina. Tomou posse do cargo de presidente do órgão prometendo que não haveria qualquer ruptura na continuidade dos trabalhos da gestão de Sidney Possuelo. Nos quase quatro meses que esteve à frente da Funai, Romero teve uma gestão controvertida. Disse que o presidente Itamar Franco não tinha vontade política para cumprir o prazo constitucional de 05/10 para regularizar a demarcação das terras indígenas no país e foi obrigado a reparar o comentário, publicamente. Em agosto de 93, foi acusado, por um dossiê interno, de ter delatado em 83 à Assessoria de Segurança e Informação -o SNI da Funai -uma conspiração de funcionários contra o então presidente do órgão, coronel Paulo Leal. Ele admitiu que escreveu um relatório denunciando servidores do órgão, mas negou ser "araponga" do regime militar. Romero diz que os servidores denunciados planejavam invadir a sede da Funai, articulados pelo então deputado Mário Juruna e pelo então vice-governador do Rio, Darcy Ribeiro. Na época, diretor do Parque Indígena do Xingu, Romero disse que estava interessado em obter da direção da Funai a demarcação das terras indígenas na região e, por isso, foi contra o movimento.

Foi demitido no dia 03/09/93, em meio a informações contraditórias sobre a chamada chacina dos Yanomami em Haximu, sobre a qual divulgou números sucessivamente desmentidos pela imprensa. Discutiu com parlamentares em Roraima ameaçando proibi-los de entrar na AI Yanomami, ao mesmo tempo autorizou a visita de diplomatas estrangeiros sem consultar o Itamaraty, além de ter criado um confronto ao declarar que não se subordinaria às orientações do novo ministro extraordinário para a Amazônia, Rubens Ricúpero.

Sidney Ferreira Possuelo
[jul. de 1991 a mai. de 1993]

O sertanista Sidney Ferreira Possuelo chefiava a Coordenadoria de Índios Isolados da Funai quando foi nomeado no dia 28/06/91 pelo presidente Collor, em substituição a Cantídio Guimarães, demitido no dia 21/06. Possuelo recebeu carta branca para fazer alterações administrativas e afirmou como prioridades o caso Yanomami e a demarcação de 266 Terras Indígenas.

Funcionário de carreira da Funai, chefe da Frente de Atração dos Arara(PA), na década de 80, Possuelo reivindicou permanentemente ao presidente Collor a revogação dos Decretos 23, 24, 25 e 26 (de 04/02/91), que tiraram da Funai as responsabilidades pela educação, saúde, projetos produtivos e meio ambiente em áreas indígenas, transferindo-as a outros ministérios.

Realizou uma reforma administrativa, iniciada em 20/01/92, quando exonerou seu superintendente geral, Edívio Batistelli. Desapareceram do organograma não só esse cargo, mas todas as Superintendências Regionais. Todas as atividades, desde o planejamento geral da Funai até o atendimento aos mais remotos Postos Indígenas passaram a se vincular diretamente à Presidência do órgão. As Superintendências passaram à categoria de Administrações Regionais -que somam 46, sem autonomia administrativa ou orçamentária, ligados à Diretoria Geral de Assistência, em Brasília. Foram criadas também as Diretorias Fundiária e de Administração. Em sua gestão, Possuelo distendeu a relação do Órgão com entidades não-governamentais. Ao criar o CDDI, convocou representantes de ONGs para compô-lo e assinou quatro convênios de parceria com essas entidades no âmbito da demarcação de terras indígenas (ver mais detalhes no capítulo Terras indígenas) .Sofreu forte oposição interna por isso. O principal feito da sua gestão foi a demarcação física da terra Yanomami de forma contínua, facilitada pela disposição política do presidente Collor para encaminhar processos de reconhecimento oficial dos direitos territoriais indígenas, com vistas à ECO-92 ( ver Cronologia de um Genocídio Documentado, no capítulo Roraima Mata).

Possuelo acabou demitido no dia 19/05/93, pelo ministro da Justiça Maurício Corrêa, por ordem do presidente Itamar Franco. Na versão do próprio Possuelo, sua cabeça rolou devido a três motivos: conflito aberto com o ministro Henrique Hargreaves, do Gabinete Civil- que fizera indicações para postos de chefia da Funai no Acre e em Goiânia; pressão de militares inconformados com as demarcações de terras na fronteira; e pressão de segmentos econômicos contrariados, como as mineradoras.

Sargento Cantídio Guerreiro Guimarães
[ago. de 1990 a jul. de 1991]
Sub-oficial da reserva da Aeronáutica (onde serviu como Sargento do quadro de manutenção e reparo de aeronaves), amigo pessoal do ex-presidente Romero Jucá, foi superintendente regional da Funai em Cuiabá de 86 a 87. Corre contra os dois um processo no Supremo Tribunal de Justiça por autorização de extração ilegal de madeira na AI Uru-Eu-Wau-Wau. Era assessor do ex-presidente Íris Pedro de Oliveira e foi Chefe de Gabinete do Consultor Geral da República, Clóvis Ferro Costa. Nesta função fez um parecer - aprovado por Ferro - que autorizava o uso da rodovia de 38 km dentro da AI Waimiri-Atroari. Antes de ser nomeado presidente da Funai, era funcionário da representação do estado do Amapá em Brasília.Foi afastado do cargo em meio a acusações dos índios do Xingu -e tornadas públicas pela imprensa - de estar fotografando índias nuas e "molestar moças e adolescentes" do Parque do Xingu (MT).
Coronel Airton Alcântara
[mar. a ago. de 1990]
Entrou na Funai para substituir o Coronel Carneiro, do CSN, que havia sido nomeado Superintendente Geral da Funai na gestão Íris Pedro, mas acabou morrendo no dia da posse. Alcântara tornou-se presidente, respondendo pelo cargo na fase de transição imposta pelo novo presidente da República Fernando Collor de Mello, recém empossado e que, dentre outras medidas, incorporou a Funai ao Ministério da Justiça depois de liquidar o Ministério do Interior. Para se firmar no cargo e tentar sua permanência no órgão, teve alguns gestos simpáticos aos indigenistas e antropólogos, assinando decretos de reintegração das áreas Uru-Eu-Wau-Wau e Kaiabi Gleba Sul. Por outro lado, elaborou uma lista de 880 servidores a serem colocados em disponibilidade, aproveitando o argumento do enxugarnento administrativo para proceder a uma nova "caça às bruxas", incluindo antropólogos e indigenistas entre os "disponíveis".
Íris Pedro de Oliveira
[set. de 1988 a mar. de 1990]
Advogado, entre 1980 e 1983 foi presidente do Grupo de Terras do Araguaia/ Tocantins (Getat), visto como um órgão de repressão e policiamento. Pragmático, apregoava soluções técnicas e operacionais para caracterizar os territórios indígenas: estabelecer áreas a partir de limites naturais, transferir grupos indígenas para "evitar conflitos" com colonos etc. Em 1980, grileiros aceleravam a invasão de terras indígenas dos Xikrirn do Cateté, em Marabá; em 82, o Getat, a Eletronorte e a Funai optaram pela recomposição da área indígena dos Parakanã, "para evitar contatos indiscriminados" entre as famílias que seriam atingidas direta ou indiretamente pelas águas da UHE e estavam sendo reassentadas na variante da Transamazônica". Sua nomeação confirmaria a vinculação da Funai aos desígnios do CSN. Denúncias da própria Funai indicam que utilizava-se das aeronaves do órgão para visitar uma fazenda de sua propriedade em Imperatriz (MA), onde há uma administração regional da Funai; esta, tomou-se recordista em receber visitas de um presidente do órgão no período do mandato do presidente Íris. Renovou o convênio com o Instituto Lingüístico de Verão (SIL) para atuarem em todo território nacional.
Romero Jucá Fº.
[mai. de 1986 a set. de 1988]
Economista, pernambucano, indicado pelo ministro Marco Maciel, seu conterrâneo e chefe da Casa Civil, dirigia o Projeto Rondon. Implantou a descentralização da Funai e retirou os indígenas de Brasília. Tecnocrata modernizador, assinou inúmeros convênios técnicos e de assistência com outros Ministérios. Promulgou um novo regimento interno no órgão. Nos cinco primeiros meses de sua gestão, o quadro de funcionários havia passado de 3.300 funcionários para 4.200. Somente em Recife, sua terra natal, o escritório da FUNAI chegou a ter 400 funcionários vinculados.Tentou tirar a crise do órgão das páginas de jornais, mas acabou sofrendo intervenção do TCU devido às irregularidades financeiras do órgão. Defendia a linha “pragmática” de exploração dos recursos naturais das terras indígenas, e foi acusado de promover inúmeros contratos com madeireiras.Manifestava-se contra a presença de garimpeiros nas áreas indígenas e assinou, em 1987, o convênio Funai/DNPM para exploração mineral empresarial em área indígena. Em maio de 88, assinou portaria criando um GT para avaliar o grau de aculturação dos indígenas. Saiu da Funai para ser governador nomeado de Roraima, carregando consigo um processo no Supremo Tribunal de Justiça por ter autorizado ilegalmente a extração de madeira em área indígena. Já fora da Funai, como governador de Roraima, passou a defender a permanência dos garimpeiros invasores do território Yanomami.
Apoena Meirelles
[nov. de 1985 a mai. de 1986]
Sertanista, nasceu numa aldeia Xavante em Pimentel Barbosa, filho do também sertanista Francisco Meirelles (funcionário do antigo SPI), desde cedo acompanhava o pai nas frentes de atração e trabalho nas aldeias. Autor de um projeto de descentralização da FUNAI, ocupou a presidência com o apoio do Ministro do Interior, Costa Couto, para implantá-lo e esvaziar a crise do órgão.Em maio de 1986, veio o decreto alterando o Estatuto da Funai, criando seis superintendências regionais. Apoena despachou durante boa parte do mandato fora de seu gabinete na Funai - preferindo uma sala no Ministério ou as delegacias regionais -, evitando assim o confronto com o movimento dos indígenas em Brasília, que continuava intenso. Distribuiu muitos recursos para contentar o lobby Xavante e reprimiu os indígenas hospedados em Brasília, cancelando o contrato de hospedagem com os hotéis das cidades satélites. Apoena saiu da presidência do órgão alegando não concordar com a ingerência do Ministro do Interior na indicação de nomes para a superintendência de terras e dos seis superintendentes regionais.
Álvaro Villas Boas
[set. a nov. de 1985]
Indigenista, irmão de Cláudio e Orlando Villas Boas, trabalhou durante anos como delegado da funai em Bauru (SP).Sua indicação teve grande repercussão (negativa) entre os indígenas que se encontravam em Brasília (mais de 300). Mas Raoni, por exemplo, liderança kayapó, reuniu um grupo de indígenas para apoiá-lo.A delegacia de Londrina, fechada por ele, foi ocupada por 120 indígenas que exigiam sua demissão. Fechou a delegacia de Salvador, que fora ocupada por indígenas que queriam ver suas terras demarcadas.Demitiu, logo ao início de sua gestão, os indigenistas empossados em cargos de confiança por Jurandy M. da Fonseca. Em seu curto mandato, reuniu contra si os funcionários demitidos que tinham influência sobre algumas lideranças indígenas e sua atitude de não negociar sob pressão com os indígenas levou-o a ser demitido.
Gerson da Silva Alves
[abr. a set. de 1985]
Assumiu interinamente a presidência da Funai e, em meados de maio, foi empossado oficialmente no cargo, apoiado pelos Xavante e pelo deputado Mario Juruna em meio à “enchente indígena” em Brasília.Sargento reformado do exército, contador, trabalhava na Funai havia 14 anos, em funções burocráticas. Como delegado regional do órgão em Campo Grande e Cuiabá, e diretor do DGO, na sede, em Brasília, acumulou relações de clientela com os Xavante, que contribuíram para sua indicação ao cargo, em meio à crise sucessória que marcou o período.
Ayrton Carneiro de Almeida
[abr. de 1985]
Aquele que foi sem nunca ter sido. Ex-diretor do Incra, foi indicado para presidir interinamente a Funai pelo Ministro Costa Couto, mas impedido de tomar posse por um conjunto de indígenas e funcionários que fizeram uma barreira na entrada do prédio.
Nelson Marabuto
[set. de 1984 a abr. de 1985]
Policial de carreira, antes de assumir a presidência da Funai havia sido chefe da assessoria de segurança e informação do órgão e também o superintendente da Polícia Federal em São Paulo.Permaneceu no cargo durante o período de transição do governo Figueiredo para o governo Sarney, prolongado pela agonia de Tancredo Neves, no qual houve uma intensa disputa pelo cargo entre varias facções do indigenismo, cada qual mobilizando índios em Brasília.
Jurandy Marcos da Fonseca
[mai. a set. de 1984]
Advogado, foi chefe de gabinete da FUNAI nas gestões Bandeira Mello e Ismarth Araújo de Oliveira. O “release” de sua posse informava que havia nascido numa aldeia indígena e que seu pai participara da Comissão Rondon e trabalhara no SPI. Na sua gestão, inaugura a nomeação de indígenas para cargos de chefia na Funai: Marcos Terena para chefe de gabinete e Megaron (Kayapó) para diretor do Parque do Xingu. Readmitiu muitos dos indigenistas e antropólogos, excluídos por Nobre da Veiga, alguns deles como seus assessores diretos e em cargos de direção.Em julho de 84, demite o sertanista Álvaro Villas Boas, delegado da 12a. DR, causando grande tumulto entre os indígenas no interior de São Paulo e Paraná, que exigiam sua readmissão invadindo e ocupando por duas semanas a delegacia de Bauru, com grande repercussão na imprensa. Vários artigos em jornais comentavam que era o fim da velha política indigenistas, que começava uma nova mentalidade, uma maneira nova de agir e tratar os problemas indígenas e, principalmente, que se percebia que os índios já não eram mais os mesmos, o que exigia formas diferentes de relacionamento com eles. Era o “sopro de esperança na Funai”. Jurandy foi demitido em setembro de 1984. Declarou: ”fui demitido porque não assinei a portaria para regulamentar o decreto 88.985” (autorizando a mineração em terras indígenas). Saiu como herói – mas, uma semana depois, foi acusado pelo Procurador Geral da Funai, Irineu de Oliveira, de ter beneficiado 85 fazendeiros no Mato Grosso do Sul, com contratos de arrendamento das terras dos Kadiwéu, e embolsado os Cr$ 150 milhões referentes aos contratos.
Otávio Ferreira Lima
[jul. de 1983 a abr. de 1984]
Economista funcionário do MInistério do Interior, logo que assumiu a presidência da FUNAI convocou as Polícias Militar e Federal para impedir o acesso de lideranças indígenas ao seu gabinete, e suspendeu as entrevistas à imprensa. Demitiu quatro coronéis em cargos de direção (entre eles, o Cel. Hausen).Na sua gestão, foi promulgado o polêmico decreto 88.985, de novembro de 1983, autorizando a entrada de empresas de mineração em terras indígenas.Em dezembro do mesmo ano, assinou um convênio (No. 028/83) com o SIL (Summer Institute of Linguistics), para um período de dois anos, sujeito a prorrogação.Durante uma crise na parte norte do Parque do Xingu - quando os Txucarramãe interditaram a BR-080 e fizerem alguns funcionários como reféns para obtenção de uma faixa de terra adicional -, Ferreira é demitido pelo seu desempenho desastroso como negociador.
Paulo Moreira Leal
[out. de 1981 a jul. de 1983]
Coronel da Aeronáutica, trabalhou no Conselho de Segurança Nacional (CSN). Assumiu a presidência da FUNAI falando em reestruturação administrativa; solicitou ao Ministério do Interior a contratação de 4 mil novos funcionários e afirmou que sua grande aspiração era ver o maior número possível de indígenas ocupando cargos de direção da Fundação.Demitiu alguns militares assessores do órgão sob pressão dos Xavantes.Assinou um convênio com o Projeto Rondon, para atendimento nas áreas de saúde educação e com a Petrobrás, estabelecendo normas gerais a serem observadas nos trabalhos de pesquisa e lavra mineral em terras indígenas.Encomendou estudos a funcionários do órgão, visando emancipação dos Guarani (da região sul do País) e Tembé (PA/ MA), com base em “critérios de indianidade”. No final de sua gestão, um decreto interministerial (No. 88.118, de 23.02.83) criou o chamado “Grupão”, para a regularização das Terras Indígenas, retirando tal atribuição do âmbito decisório da FUNAI e alçando-a formalmente ao nível ministerial e do CSN.
João Carlos Nobre da Veiga
[nov. de 1979 a out. de 1981]
Coronel da reserva, assume o cargo falando em “disciplina” e demitindo 39 indigenistas e antropólogos, porque haviam encaminhado carta ao Ministro do Interior com criticas à política da FUNAI. Incrementa o projeto de emancipação compulsória, criando os famosos “critérios de indianidade” e declarando que o indígena “estará emancipado em cinco gerações”; mas recua e não encaminha o processo ao Ministério do Interior (Minter). Reestrutura a Funai para fortalecer as unidades regionais. Numa reunião da SUDAM, afirma que ”há reservas demais”. A 15/12/1980, sai uma Portaria Interministerial (Minter/ Min. das Minas e Energia) facilitando a exploração mineral em terras indígenas por empresas estatais. Com base no parecer do Conselho Indigenista da Funai, o Ministro do Interior, Mario Andreazza, proíbe Mário Juruna, liderança indígena do povo Xavante, de participar do Tribunal Russel, na Holanda.Juruna lidera 40 índios que, na sede da Funai em Brasília, exigem a demissão do Presidente da FUNAI e mais dois coronéis da direção: Ivan Zanoni Hausen (DGPC) e Jose Rodriges Godinho (DGO).
Adhemar Ribeiro da Silva
[mar. a nov. de 1979]
Engenheiro de profissão, ex-diretor-geral do Departamento Nacional de Estradas e Rodagem (DNER), na sua curta gestão extinguiu a COAMA (Coordenação da Amazônia) e concedeu alvarás de pesquisa mineral na AI Waimiri-Atroari (AM).
Ismarth Araújo de Oliveira
[mar. de 1974 a mar. de 1979]
General da Reserva, antes de ser nomeado presidente havia sido superintendente da FUNAI. Na sua posse, o Ministro do Interior, Rangel Reis, anunciou “a política de integração em ritmo acelerado”, o que viria a desembocar no projeto de emancipação dos indígenas, contra o qual ele se opôs publicamente. Mas incrementa os chamados “projetos de desenvolvimento comunitário”, dentro de uma política de “espíritos desarmados” com antropólogos, indigenistas e missionários. Na sua gestão, aumentam substancialmente as demarcações de Terras Indígenas.
Oscar Jeronymo Bandeira de Mello
[jun. de 1970 a mar. de 1974]
General da Reserva, ex-chefe da Divisão de Segurança e informação da Funai e ex-agente do SNI, participou do inquérito que extinguiu o SPI. Na sua gestão, consolidou-se a política da Funai atrelada ao binômio “segurança e desenvolvimento”, que marcou o período mais duro do regime autoritário - o governo Médici. Seu lema era: “Integrar os índios rapidamente”, sobretudo para que não obstaculizassem a ocupação e colonização da Amazônia, em consonância com o Ministro do Interior, Costa Cavalcante, que anunciou o “boi como grande bandeirante da década”. No bojo do Plano de Integração Nacional, lançado em 1970, estabeleceu um convenio com a SUDAM “para pacificar 30 grupos arredios” ao longo da Transamazônica. Participou de um churrasco com fazendeiros na abertura da BR-080, rodovia que cortou o norte do Parque do Xingu e excluiu boa parte do território dos indígenas Txukarramãe (sub-grupo Kayapó).Durante sua gestão, foi promulgado o Estatuto do Índio, aprovado pelo Congresso Nacional, e criada, na FUNAI, a Divisão de Desenvolvimento Comunitário (subordinada à Coordenação de Programas de Desenvolvimento de Comunidades, do Ministério do Interior). Relacionada a essa divisão desenvolvimentista e integracionista das populações indígenas, reintroduziu a chamada “renda indígena”, conceito chave para viabilizar o projeto de “emancipação econômica” dos grupos indígenas.
José de Queiroz Campos
[dez. de 1967 a jun. de 1970]
Coordenou a implantação do órgão, tendo que se defrontar – juntamente com o Ministro do Interior, Gal. Albuquerque Lima – com a avalanche de denúncias de genocídio contra o governo no exterior, sobretudo a partir da divulgação do Relatório Jader Figueiredo (março de 1968), que trazia os resultados de uma devassa no SPI (Serviço de Proteção aos Índios, órgão governamental antecessor à Funai).Na sua gestão, foram ampliada a área do Parque do Xingu e criados outros três parques indígenas. Criou a GRIN, Guarda Rural Indígena, transformando índios em policiais nas suas próprias aldeias. Assinou convênio com o SIL (Summer Institute of Linguistics) em 1969 e, no mesmo ano, realizou o 1o. Simpósio FUNAI - Missões Religiosas. Jornalista de profissão, escreveu livros a respeito de fatos ocorridos na sua gestão (como a famosa expedição do Pe. Calleri, chacinada durante as tentativas de contatar os Waimiri–Atroari, no Amazonas), mas que nunca chegou a publicar, por recomendação dos órgãos de segurança.

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