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BR-319: desmatamento cai, queimadas crescem
26/02/2025
Autor: Waldick Júnior
Fonte: A Critica - https://www.acritica.com
Em dois anos de governo Lula, o desmatamento nos 13 municípios sob influência da rodovia BR-319 (Manaus - Porto Velho) caiu 76%, a maior variação em mais de uma década. O dado faz parte da 'Retrospectiva 2024', do Observatório da BR-319, rede de organizações da sociedade civil que atua na área de influência na estrada. Se o desflorestamento caiu, por outro lado, as queimadas atingiram seu segundo pior nível desde o início da série histórica.
No entanto, apesar da queda do desmatamento no acumulado do ano, especialistas alertam que a situação na BR-319 segue delicada. Entre setembro e dezembro de 2024, logo após o presidente Lula defender a pavimentação da rodovia, o desmatamento disparou 85% na região, conforme noticiado por A CRÍTICA. O aumento foi atribuído à especulação fundiária e à abertura de novos ramais, o que levanta questionamentos sobre os desafios de manter a floresta preservada diante do avanço das obras e das pressões econômicas na área de influência da estrada.
Conforme o levantamento, em 2010, os 13 municípios na área de influência da BR-319 haviam registrado 22,5 mil hectares de desmatamento. O número subiu pouco a pouco nos anos seguintes até disparar de 2017 (36,5 mil hectares) para 2018 (73,5 mil hectares), no fim do governo Michel Temer.
O índice deu saltos ainda maiores na gestão Bolsonaro, de 78,6 mil hectares para 168,9 mil hectares - nível nunca antes alcançado. Em 2023, já no primeiro ano de governo Lula, o número na casa das centenas caiu para 49.156 hectares desmatados. No ano passado desceu mais ainda, registrando 40,1 mil hectares.
A queda do desmatamento no entorno da BR-319 segue o ritmo da redução em toda a Amazônia. Em 2024, foram 358,5 mil hectares desflorestados, 11,08% menos do que no ano anterior. O mesmo aconteceu no estado do Amazonas, que registrou 72,8 mil hectares desmatados, uma queda de 16,9% em comparação a 2023.
Retomada
"Esse dado está no contexto de retomada das políticas ambientais da região, do fortalecimento do Ibama e de outras instituições de monitoramento, de controle e combate ao desmatamento. Isso é muito importante não só para o entorno da BR-319, mas para a Amazônia toda", afirma Heitor Pinheiro, especialista em geoprocessamento e analista do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam). A entidade integra o Observatório da BR-319.
Os municípios na área de influência da BR-319 são: Autazes, Beruri, Borba, Canutama, Careiro, Careiro da Várzea, Humaitá, Lábrea, Manaquiri, Manaus, Porto Velho e Tapauá.
Queimadas
Se o desmatamento está em queda na região, o mesmo não pode ser dito sobre as queimadas. No ano passado, foram registrados 13.616 focos de calor nos 13 municípios do entorno da BR-319, o pior número em 14 anos da série histórica. Foi um crescimento de 58% desde 2010, quando haviam sido 8.594 focos de calor.
Exemplo disso são as nuvens de fumaça que encobriram cidades da Amazônia em 2023 e 2024, tornando a qualidade do ar uma das piores do mundo. Nos dois casos, o cenário se somou à seca histórica e os recordes de calor que atingiram a região.
"Viemos de um período de seca muito forte, o que impactou muito a vegetação. Com a diminuição da umidade na floresta, ela ficou mais suscetível a focos de calor e a queimadas. Tivemos recordes em 2023 e em 2024, principalmente, pelas condições climáticas", pontua Heitor.
Dado é bom, mas estrada é complexa
Questionado sobre se a notícia da redução do desmatamento pode ser um sinal de que é possível recuperar a BR-319 e ter, ainda assim, o controle dos crimes ambientais, o especialista Heitor Pinheiro destaca que o debate é mais complexo.
"Acredito que com políticas públicas específicas para a região, com o fortalecimento das unidades de conservação, das áreas protegidas, terras indígenas, o fortalecimento da gestão via implementação dessas áreas, a gente consegue, sim, ter um controle maior na região do interflúvio Madeira-Purus", afirma.
"A gente sabe que a BR-319 é uma discussão política. É preciso fazer o processo legal de consultas públicas com as populações afetadas e pensar outras estratégias de implementação. Tem áreas com asfalto, onde é mais acessível, na região de Humaitá, em Lábrea, e o aumento do desmatamento é muito grande, o surgimento de ramais", comenta.
Exemplo disso é que, conforme o relatório, Lábrea foi um dos dois municípios do entorno da BR-319 que viu o desmatamento aumentar em 2024. Enquanto foram 9.653 hectares desflorestados em 2023, o mesmo número subiu para 12.651 no ano passado. O outro município foi Manicoré, que variou de 6.140 (2023) para 6.162 (2024).
Um levantamento feito pelo Observatório e divulgado em 2023 apontou que, até aquele momento, a rede de ramais nos municípios de Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá (todos da área de influência) era de 5 mil quilômetros, quase seis vezes a extensão total da própria BR-319 (889 quilômetros).
Lula quer estrada modelo; entidades pedem debate
Ainda na campanha à presidência da República, Lula prometeu atuar para recuperar a BR-319 sem aumentar os crimes ambientais na região. Após eleito, fez uma recomposição de R$ 550 milhões no orçamento do meio ambiente só no primeiro ano de governo, além de realizar novos concursos para renovação de quadros.
Por outro lado, ainda há receio de ambientalistas na maneira como o governo pode levar a ideia de recuperar a estrada à frente. No ano passado, Lula determinou a criação de um grupo de trabalho (GT) no Ministério dos Transportes, para tratar do tema. A iniciativa foi criticada por entidades que integram o Observatório da BR-319, pois não incluía representantes da sociedade civil e nem de órgãos ambientais do próprio governo.
Embora tenham ocorrido escutas em reuniões e audiências, esses atores não participaram diretamente da elaboração do relatório.
Ainda em 2024, a Advocacia-Geral da União (AGU), órgão jurídico do governo Lula, recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para reverter uma liminar que suspendia a licença prévia do trecho central da BR-319. A autorização, concedida pelo Ibama em meio à campanha de Bolsonaro à reeleição, foi contestada por entidades como o Observatório da BR-319, que apontaram a ausência de dados técnicos e pareceres dos órgãos ambientais no processo.
A pedido da União, do Ibama e do DNIT, o desembargador Flávio Jaime de Moraes Jardim suspendeu a decisão, restabelecendo a validade da licença para o trecho que vai do km 50 ao 655 - da ponte sobre o rio Jordão até o entroncamento com a BR-230 (Transamazônica).
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é o principal alvo de vozes favoráveis à recuperação da BR-319. O governador do Amazonas, Wilson Lima (União), e os três senadores do estado, Omar Aziz (PSD), Eduardo Braga (MDB) e Plínio Valério (PSDB) vêem nela uma pedra no caminho da estrada - uma das bandeiras políticas dos quatro.
Marina já disse que a obra de recuperação precisa passar por um estudo baseado em dados e evidências científicas. "Os atalhos que foram feitos durante todos esses anos não levaram a nada. O governo Bolsonaro, em quatro anos, não fez a estrada e, no apagar das luzes, na saída, deu uma licença que não levou em conta a posição dos técnicos", disse, se referindo à licença que a AGU de Lula recuperou um mês depois, em outubro de 2024.
https://www.acritica.com/geral/br-319-desmatamento-cai-queimadas-crescem-1.365497
No entanto, apesar da queda do desmatamento no acumulado do ano, especialistas alertam que a situação na BR-319 segue delicada. Entre setembro e dezembro de 2024, logo após o presidente Lula defender a pavimentação da rodovia, o desmatamento disparou 85% na região, conforme noticiado por A CRÍTICA. O aumento foi atribuído à especulação fundiária e à abertura de novos ramais, o que levanta questionamentos sobre os desafios de manter a floresta preservada diante do avanço das obras e das pressões econômicas na área de influência da estrada.
Conforme o levantamento, em 2010, os 13 municípios na área de influência da BR-319 haviam registrado 22,5 mil hectares de desmatamento. O número subiu pouco a pouco nos anos seguintes até disparar de 2017 (36,5 mil hectares) para 2018 (73,5 mil hectares), no fim do governo Michel Temer.
O índice deu saltos ainda maiores na gestão Bolsonaro, de 78,6 mil hectares para 168,9 mil hectares - nível nunca antes alcançado. Em 2023, já no primeiro ano de governo Lula, o número na casa das centenas caiu para 49.156 hectares desmatados. No ano passado desceu mais ainda, registrando 40,1 mil hectares.
A queda do desmatamento no entorno da BR-319 segue o ritmo da redução em toda a Amazônia. Em 2024, foram 358,5 mil hectares desflorestados, 11,08% menos do que no ano anterior. O mesmo aconteceu no estado do Amazonas, que registrou 72,8 mil hectares desmatados, uma queda de 16,9% em comparação a 2023.
Retomada
"Esse dado está no contexto de retomada das políticas ambientais da região, do fortalecimento do Ibama e de outras instituições de monitoramento, de controle e combate ao desmatamento. Isso é muito importante não só para o entorno da BR-319, mas para a Amazônia toda", afirma Heitor Pinheiro, especialista em geoprocessamento e analista do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam). A entidade integra o Observatório da BR-319.
Os municípios na área de influência da BR-319 são: Autazes, Beruri, Borba, Canutama, Careiro, Careiro da Várzea, Humaitá, Lábrea, Manaquiri, Manaus, Porto Velho e Tapauá.
Queimadas
Se o desmatamento está em queda na região, o mesmo não pode ser dito sobre as queimadas. No ano passado, foram registrados 13.616 focos de calor nos 13 municípios do entorno da BR-319, o pior número em 14 anos da série histórica. Foi um crescimento de 58% desde 2010, quando haviam sido 8.594 focos de calor.
Exemplo disso são as nuvens de fumaça que encobriram cidades da Amazônia em 2023 e 2024, tornando a qualidade do ar uma das piores do mundo. Nos dois casos, o cenário se somou à seca histórica e os recordes de calor que atingiram a região.
"Viemos de um período de seca muito forte, o que impactou muito a vegetação. Com a diminuição da umidade na floresta, ela ficou mais suscetível a focos de calor e a queimadas. Tivemos recordes em 2023 e em 2024, principalmente, pelas condições climáticas", pontua Heitor.
Dado é bom, mas estrada é complexa
Questionado sobre se a notícia da redução do desmatamento pode ser um sinal de que é possível recuperar a BR-319 e ter, ainda assim, o controle dos crimes ambientais, o especialista Heitor Pinheiro destaca que o debate é mais complexo.
"Acredito que com políticas públicas específicas para a região, com o fortalecimento das unidades de conservação, das áreas protegidas, terras indígenas, o fortalecimento da gestão via implementação dessas áreas, a gente consegue, sim, ter um controle maior na região do interflúvio Madeira-Purus", afirma.
"A gente sabe que a BR-319 é uma discussão política. É preciso fazer o processo legal de consultas públicas com as populações afetadas e pensar outras estratégias de implementação. Tem áreas com asfalto, onde é mais acessível, na região de Humaitá, em Lábrea, e o aumento do desmatamento é muito grande, o surgimento de ramais", comenta.
Exemplo disso é que, conforme o relatório, Lábrea foi um dos dois municípios do entorno da BR-319 que viu o desmatamento aumentar em 2024. Enquanto foram 9.653 hectares desflorestados em 2023, o mesmo número subiu para 12.651 no ano passado. O outro município foi Manicoré, que variou de 6.140 (2023) para 6.162 (2024).
Um levantamento feito pelo Observatório e divulgado em 2023 apontou que, até aquele momento, a rede de ramais nos municípios de Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá (todos da área de influência) era de 5 mil quilômetros, quase seis vezes a extensão total da própria BR-319 (889 quilômetros).
Lula quer estrada modelo; entidades pedem debate
Ainda na campanha à presidência da República, Lula prometeu atuar para recuperar a BR-319 sem aumentar os crimes ambientais na região. Após eleito, fez uma recomposição de R$ 550 milhões no orçamento do meio ambiente só no primeiro ano de governo, além de realizar novos concursos para renovação de quadros.
Por outro lado, ainda há receio de ambientalistas na maneira como o governo pode levar a ideia de recuperar a estrada à frente. No ano passado, Lula determinou a criação de um grupo de trabalho (GT) no Ministério dos Transportes, para tratar do tema. A iniciativa foi criticada por entidades que integram o Observatório da BR-319, pois não incluía representantes da sociedade civil e nem de órgãos ambientais do próprio governo.
Embora tenham ocorrido escutas em reuniões e audiências, esses atores não participaram diretamente da elaboração do relatório.
Ainda em 2024, a Advocacia-Geral da União (AGU), órgão jurídico do governo Lula, recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para reverter uma liminar que suspendia a licença prévia do trecho central da BR-319. A autorização, concedida pelo Ibama em meio à campanha de Bolsonaro à reeleição, foi contestada por entidades como o Observatório da BR-319, que apontaram a ausência de dados técnicos e pareceres dos órgãos ambientais no processo.
A pedido da União, do Ibama e do DNIT, o desembargador Flávio Jaime de Moraes Jardim suspendeu a decisão, restabelecendo a validade da licença para o trecho que vai do km 50 ao 655 - da ponte sobre o rio Jordão até o entroncamento com a BR-230 (Transamazônica).
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é o principal alvo de vozes favoráveis à recuperação da BR-319. O governador do Amazonas, Wilson Lima (União), e os três senadores do estado, Omar Aziz (PSD), Eduardo Braga (MDB) e Plínio Valério (PSDB) vêem nela uma pedra no caminho da estrada - uma das bandeiras políticas dos quatro.
Marina já disse que a obra de recuperação precisa passar por um estudo baseado em dados e evidências científicas. "Os atalhos que foram feitos durante todos esses anos não levaram a nada. O governo Bolsonaro, em quatro anos, não fez a estrada e, no apagar das luzes, na saída, deu uma licença que não levou em conta a posição dos técnicos", disse, se referindo à licença que a AGU de Lula recuperou um mês depois, em outubro de 2024.
https://www.acritica.com/geral/br-319-desmatamento-cai-queimadas-crescem-1.365497
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