De Povos Indígenas no Brasil
The printable version is no longer supported and may have rendering errors. Please update your browser bookmarks and please use the default browser print function instead.

Notícias

Falta de contato com natureza afeta crianças em comunidades tradicionais na amazônia

17/05/2025

Fonte: FSP - https://www1.folha.uol.com.br/



Falta de contato com natureza afeta crianças em comunidades tradicionais na amazônia
Projetos que buscam reconexão com a floresta destacam papel do ambiente no desenvolvimento infantil em territórios indígenas e quilombolas

17.mai.2025 às 23h00

Catarina Ferreira
São Paulo

Degradação ambiental, eventos climáticos extremos e grandes construções no meio da floresta estão afastando crianças do convívio com a natureza, mesmo em áreas com biodiversidade rica, como a amazônia.

Em comunidades tradicionais, a aproximação com a natureza não é apenas parte da rotina de crianças e adolescentes, mas um elemento essencial para a sobrevivência e para o desenvolvimento de laços sociais e culturais. Por estarem em maior contato maior com o ambiente, crianças indígenas e quilombolas sofrem mais rápida e diretamente os impactos das mudanças climáticas.

Esse foi o tema da pesquisa da pedagoga e cientista social Eliana Pojo, que passou dois anos com os moradores do quilombo Tauerá-Açú, em Abaetetuba, no Pará, para entender o papel dos rios e dos cursos d'água no desenvolvimento infantil em territórios ribeirinhos.

Paraense, a pesquisadora conta que cresceu tomando banho nos mesmos rios em que hoje realiza seu trabalho acadêmico. Durante a pesquisa, ela percebeu que as atividades em ambientes aquáticos eram importantes para fortalecer os vínculos comunitários e ajudar a preservar conhecimentos tradicionais passados entre gerações.

"Existe um enorme potencial ecológico e cultural na amazônia, mas, em contrapartida, existe uma desigualdade muito forte que os moradores desse local enfrentam." Além de dificuldades como a falta de estrutura para um transporte escolar adequado, Eliane destaca que o modo de vida de toda a comunidade está ameaçado pela degradação ambiental na região.

As crianças são observadoras, percebem a preocupação dos familiares, a diminuição de peixes e de outros alimentos à mesa e reclamam quando são impedidas de se banhar nos rios. O que acontece, afirma Eliane, "porque as mães têm se preocupado com a saúde dos filhos, caso surja uma alergia ou uma doença decorrente da água."

"O rio não é só um elemento de trabalho ou de transporte, e também não é só um elemento da paisagem, mas tudo isso cria um cenário sociocultural que é parte da identidade daquela comunidade e de quem aquela criança está se tornando."

Afastar uma criança do meio ambiente impacta o desenvolvimento integral dela, afirma Paula Mendonça, especialista em educação, natureza e cultura do Instituto Alana.

A saúde física, emocional e a garantia de direitos básicos ficam comprometidas quando suas comunidades são expostas a situações como secas, enchentes, calor extremo. E a situação é ainda mais delicada quando territórios tradicionais são afetados, diz a especialista.

"A saúde da natureza é considerada vital em muitas cosmovisões indígenas e quilombolas, as mudanças afetam não apenas o ambiente, mas toda a comunidade."

Em Altamira, também no Pará, a ativista Daniela Silva, 31, compartilha da mesma visão. Ela é uma das criadoras do Projeto Aldeias, uma iniciativa que funciona no contraturno escolar e recebe crianças e adolescentes, entre 3 e 15 anos, para oficinas e atividades de imersão na floresta.

"Cresci num bairro que era povoado por indígenas, ribeirinhos e pescadores e nós tínhamos uma vivência comunitária muito forte com essa diversidade de povos e com a natureza."

Porém, devido à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, inaugurada em 2016, a comunidade foi retirada da região e instalada em outro bairro, mais distante do rio Xingu, que banhava a vizinhança de Daniela, prejudicando os laços comunitários e a relação com a floresta, que era característica do local.

O projeto surge em 2019, como uma proposta de intervenção socioambiental. "Nosso foco mesmo é trabalhar o pertencimento, o território, a amazônia", afirma a gestora do projeto. Ela conta que as áreas residenciais e de periferia têm pouca área verde, os brinquedos para as crianças são feitos de ferro e isso desestimula o contato delas com o território em que vivem.

"As crianças da periferia aqui de Altamira são completamente esquecidas das pautas ambientais, são elas que sofrem com racismo ambiental e antes [da de a comunidade ser retirada das margens do rio] seus familiares tinham uma ligação muito forte com a região, eram pescadores, ribeirinhos, agricultores."

Hoje, Aldeias funciona como uma espécie de rede de apoio para as famílias do local, mas nasceu para atender uma necessidade da família de Daniela. O irmão da ativista morreu em 2019, deixando dois filhos, Neymar e Maria Antônia, na época com 9 e 5 anos respectivamente.

A mãe dela foi quem assumiu o cuidado das crianças. Preocupada, ela começou a pensar em formas de não deixar a mãe sozinha na criação dos sobrinhos e resgatar a rede comunitária que viveu em sua infância.

A aproximação com a natureza foi o caminho que escolheu. "Elas não tinham um sentimento de pertencimento com o território. Hoje, acho que se sentem mais seguras, têm mais vontade de falar o que pensam, dar ideias." Daniela conta também que queria que elas pudessem ver a importância da amazônia e da floresta local, não apenas a violência crescente na cidade.

"Todo mundo fala 'vamos defender a amazônia', mas a gente só defende aquilo que a gente ama e conhece."

Neymar, o sobrinho de Daniela, participa do projeto desde o início e hoje, aos 14 anos, faz parte da equipe de monitores. A equipe do Aldeias tem cerca de 15 pessoas e as atividades são financiadas por doações de pessoas físicas e jurídicas.

https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2025/05/falta-de-contato-com-natureza-afeta-criancas-em-comunidades-tradicionais-na-amazonia.shtml
 

As notícias publicadas no site Povos Indígenas no Brasil são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos .Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.