De Povos Indígenas no Brasil
Notícias
https://baoba.org.br/home/programa-marielle-franco-apoio-individual/
17/09/2025
Fonte: FSP - https://www1.folha.uol.com.br/
Ativista indígena move juventude amazônida por energia limpa e justa
Natalia Mapuá leva discussão do clima a comunidades isoladas na Amazônia e antecipa pressão na COP30 em Belém
Bacharel em direito é destaque do Prêmio Empreendedor Social 2025 na categoria Jovens Transformadores pelo Clima
17/09/2025
Gabriela Caseff
Quando foi à COP28, em Dubai, Natalia Mapuá, 27, não conseguiu ver estrelas por causa da poluição e da iluminação dos arranha-céus. Era costume seu desde criança, na Ilha do Marajó, território onde parte do seu povo não acessa energia elétrica.
Ainda no Oriente Médio, ela e outros jovens entregaram ao governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), carta pedindo participação na formulação de políticas públicas de combate à crise climática no estado. No mesmo ano, Mapuá esteve na linha de frente de atos contra o marco temporal no Supremo Tribunal Federal.
"Ouvi de uma liderança que mesmo com medo é preciso ter coragem para reivindicar direitos", diz ela, que nasceu em uma reserva extrativista em São Miguel dos Macacos (PA) e mudou-se ainda criança com a família para Belém. Lá, enfrentou diferenças culturais e abraçou o ativismo em defesa de seu povo.
Sexta indígena formada em direito pela Universidade Federal do Pará, está à frente da Aliança de Juventude por Transição Energética Justa, onde usa habilidades ancestrais e jurídicas para lutar contra violações de direitos.
"Para quem foi criança perto do rio e viu avós caçarem e pescarem na floresta, é duro viver na cidade. Depois de todos esses anos em Belém, ainda não me adaptei e às vezes me sinto sufocada.
Tinha 8 anos quando deixei Breves. A situação econômica estava difícil, o desmatamento adentrava e tornava complicado sobreviver do extrativismo.
Meu pai é analfabeto e virou ambulante em Belém. Construiu uma casa de madeira para nós, mas anos depois separou-se da minha mãe, com quem morei em um quarto com banheiro, fogão de segunda mão, sem geladeira.
Eu me descobri ativista no ensino médio, a partir da educação. Escolas eram precárias, e professores, mal pagos. Estava sempre na linha de frente, liderando a turma. Nunca tive incentivo, mas fui primeiro lugar na redação e na Olimpíada de Matemática.
Queria tanto passar na universidade que, aos 18, escolhi ficar sozinha em vez de partir com minha mãe para o interior. E aí a militância parou porque precisava sobreviver. Fui dar aula de informática e servir pizza à noite.
E com muito estudo passei em direito na UFPA, em uma turma quase toda branca, sem professor indígena, em plena Amazônia. Foi ali que tomei contato com violações de direito e questões ambientais. Quando vi já estava no centro acadêmico, em movimentos sociais, em estágio no WWF.
Em 2021, encontrei um grupo de jovens amazônidas que, como eu, acreditava na articulação coletiva e na defesa dos direitos das juventudes. Disso surgiu a Cojovem (Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável), onde fui de assistente a diretora-executiva. Vivi o sonho de fazer ativismo dentro de aldeias e quilombos, fortalecendo jovens como eu.
Em lugares distantes e isolados, mostro como o clima afeta de maneira física, visual e psicológica. A gente começa sentindo calor, vendo árvore ir embora e perde o senso de comunhão. Também orientei jovens a criarem negócios sustentáveis, melhorando a renda dos povos tradicionais, que estão fora de organizações que debatem clima, pois estão ocupados na defesa do território. Isso mostra como o racismo ambiental está posto até no movimento climático, o que é bem contraditório.
Visitei sete países, fui à COP28 e apareci no jornal ao pintar de urucum a bandeira do Brasil em frente ao Congresso Nacional. Ganhei força política. Mas muitas vezes sou a única jovem, a única mulher, a única indígena.
Para fazer acontecer aqui na Amazônia, tem que se dedicar. Sofri burnout porque a causa pulsa forte. Para aliviar, faço aula de tecnobrega, curto festa de aparelhagem e não falo de clima entre amigos. E quando publico foto cozinhando, o pessoal ainda reage com carinha chocada.
Minha geração vai envelhecer diante de cenários bem precários. Por isso jovens vêm com garra para falar de justiça na transição energética, mesmo que isso custe parte de nossa juventude. E o ativismo tem dois caminhos: quem vai no embate faz pressão; quem vai no diálogo consegue propor encaminhamentos.
Agora passei no mestrado da Universidade de Brasília e meu sonho é ser advogada e atuar por direitos indígenas. Mas já perdi oportunidades por não saber inglês. Morei na Bolívia no ano passado e aprendi espanhol, só que não aguentei o frio de -3oC.
Mas o que não tolero mesmo é associar a minha imagem a mineradoras, petroleiras e empresas envolvidas em injustiças socioambientais.
Escutei o medo e a dor de famílias impactadas, vi de perto os efeitos da contaminação da água, da insegurança alimentar, do adoecimento coletivo e do rompimento de modos de vida ancestrais.
Em 2023, fundamos a Aliança pela Juventude, coalizão de organizações que debate direitos na Amazônia. Produzimos artigos e campanhas de comunicação popular, fazemos incidência política, diagnósticos e propostas com jovens do Norte e Nordeste. Exemplo é o cinema flutuante na Ilha do Combú, em agosto, quando reunimos ribeirinhos para ver competição de rabeta e filmes sobre clima.
E assim será até a COP30. Meu papel tem sido o de garantir que outras pessoas participem, porque dessa vez teremos liberdade para fazer pressão. E a pressão popular funciona. Vai ter protesto e marcha todo dia em Belém."
https://www1.folha.uol.com.br/folha-social-mais/2025/09/advogada-indigena-move-juventude-amazonida-por-energia-limpa-e-justa.shtml
Natalia Mapuá leva discussão do clima a comunidades isoladas na Amazônia e antecipa pressão na COP30 em Belém
Bacharel em direito é destaque do Prêmio Empreendedor Social 2025 na categoria Jovens Transformadores pelo Clima
17/09/2025
Gabriela Caseff
Quando foi à COP28, em Dubai, Natalia Mapuá, 27, não conseguiu ver estrelas por causa da poluição e da iluminação dos arranha-céus. Era costume seu desde criança, na Ilha do Marajó, território onde parte do seu povo não acessa energia elétrica.
Ainda no Oriente Médio, ela e outros jovens entregaram ao governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), carta pedindo participação na formulação de políticas públicas de combate à crise climática no estado. No mesmo ano, Mapuá esteve na linha de frente de atos contra o marco temporal no Supremo Tribunal Federal.
"Ouvi de uma liderança que mesmo com medo é preciso ter coragem para reivindicar direitos", diz ela, que nasceu em uma reserva extrativista em São Miguel dos Macacos (PA) e mudou-se ainda criança com a família para Belém. Lá, enfrentou diferenças culturais e abraçou o ativismo em defesa de seu povo.
Sexta indígena formada em direito pela Universidade Federal do Pará, está à frente da Aliança de Juventude por Transição Energética Justa, onde usa habilidades ancestrais e jurídicas para lutar contra violações de direitos.
"Para quem foi criança perto do rio e viu avós caçarem e pescarem na floresta, é duro viver na cidade. Depois de todos esses anos em Belém, ainda não me adaptei e às vezes me sinto sufocada.
Tinha 8 anos quando deixei Breves. A situação econômica estava difícil, o desmatamento adentrava e tornava complicado sobreviver do extrativismo.
Meu pai é analfabeto e virou ambulante em Belém. Construiu uma casa de madeira para nós, mas anos depois separou-se da minha mãe, com quem morei em um quarto com banheiro, fogão de segunda mão, sem geladeira.
Eu me descobri ativista no ensino médio, a partir da educação. Escolas eram precárias, e professores, mal pagos. Estava sempre na linha de frente, liderando a turma. Nunca tive incentivo, mas fui primeiro lugar na redação e na Olimpíada de Matemática.
Queria tanto passar na universidade que, aos 18, escolhi ficar sozinha em vez de partir com minha mãe para o interior. E aí a militância parou porque precisava sobreviver. Fui dar aula de informática e servir pizza à noite.
E com muito estudo passei em direito na UFPA, em uma turma quase toda branca, sem professor indígena, em plena Amazônia. Foi ali que tomei contato com violações de direito e questões ambientais. Quando vi já estava no centro acadêmico, em movimentos sociais, em estágio no WWF.
Em 2021, encontrei um grupo de jovens amazônidas que, como eu, acreditava na articulação coletiva e na defesa dos direitos das juventudes. Disso surgiu a Cojovem (Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável), onde fui de assistente a diretora-executiva. Vivi o sonho de fazer ativismo dentro de aldeias e quilombos, fortalecendo jovens como eu.
Em lugares distantes e isolados, mostro como o clima afeta de maneira física, visual e psicológica. A gente começa sentindo calor, vendo árvore ir embora e perde o senso de comunhão. Também orientei jovens a criarem negócios sustentáveis, melhorando a renda dos povos tradicionais, que estão fora de organizações que debatem clima, pois estão ocupados na defesa do território. Isso mostra como o racismo ambiental está posto até no movimento climático, o que é bem contraditório.
Visitei sete países, fui à COP28 e apareci no jornal ao pintar de urucum a bandeira do Brasil em frente ao Congresso Nacional. Ganhei força política. Mas muitas vezes sou a única jovem, a única mulher, a única indígena.
Para fazer acontecer aqui na Amazônia, tem que se dedicar. Sofri burnout porque a causa pulsa forte. Para aliviar, faço aula de tecnobrega, curto festa de aparelhagem e não falo de clima entre amigos. E quando publico foto cozinhando, o pessoal ainda reage com carinha chocada.
Minha geração vai envelhecer diante de cenários bem precários. Por isso jovens vêm com garra para falar de justiça na transição energética, mesmo que isso custe parte de nossa juventude. E o ativismo tem dois caminhos: quem vai no embate faz pressão; quem vai no diálogo consegue propor encaminhamentos.
Agora passei no mestrado da Universidade de Brasília e meu sonho é ser advogada e atuar por direitos indígenas. Mas já perdi oportunidades por não saber inglês. Morei na Bolívia no ano passado e aprendi espanhol, só que não aguentei o frio de -3oC.
Mas o que não tolero mesmo é associar a minha imagem a mineradoras, petroleiras e empresas envolvidas em injustiças socioambientais.
Escutei o medo e a dor de famílias impactadas, vi de perto os efeitos da contaminação da água, da insegurança alimentar, do adoecimento coletivo e do rompimento de modos de vida ancestrais.
Em 2023, fundamos a Aliança pela Juventude, coalizão de organizações que debate direitos na Amazônia. Produzimos artigos e campanhas de comunicação popular, fazemos incidência política, diagnósticos e propostas com jovens do Norte e Nordeste. Exemplo é o cinema flutuante na Ilha do Combú, em agosto, quando reunimos ribeirinhos para ver competição de rabeta e filmes sobre clima.
E assim será até a COP30. Meu papel tem sido o de garantir que outras pessoas participem, porque dessa vez teremos liberdade para fazer pressão. E a pressão popular funciona. Vai ter protesto e marcha todo dia em Belém."
https://www1.folha.uol.com.br/folha-social-mais/2025/09/advogada-indigena-move-juventude-amazonida-por-energia-limpa-e-justa.shtml
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