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Mães indígenas reclamam de falta de médico

26/02/2005

Fonte: FSP, Brasil, p. A14



Mães indígenas reclamam de falta de médico
Problema foi apontado durante enterro de crianças mortas por desnutrição; Funasa diz que enviará mais 3 médicos

Hudson Corrêa
Da Agência Folha, em Dourados (MS)

Durante o enterro da menina índia Jenifer Duarte Gonçalves, que tinha um ano e três meses e morreu de desnutrição anteontem em Dourados (218 km de Campo Grande), mães indígenas reclamaram da falta de médicos para atender crianças doentes.
No mesmo dia, em outro velório, Luzinete Barbosa, 35, mãe do menino Rosivaldo Barbosa de um ano e 11 meses, também morto por desnutrição, havia dito que foi maltratada por enfermeiras no hospital da Missão Evangélica Caiuá, a 10 km de sua casa.
Já são cinco crianças desnutridas que morreram desde 11 de janeiro deste ano na comunidade indígena em Dourados.
"Às vezes a gente tem que dar uma de louco para ser atendido [no posto de saúde da aldeia]", disse Lidiana Gonçalves, 24. Ela contou que salvou o filho Cleiton, 4, de uma diarréia porque brigou para ser atendida pelo médico. "Alimentação tem, mas falta médico. A gente vai ao posto, a criança com diarréia, e dizem para voltar quando piorar", afirma Mirian Savalo, 27, cujo filho Adriano, de um ano, pesa apenas 7 kg e sofre de desnutrição.
A índia guarani Neuza Duarte, 19, mãe da menina enterrada ontem, afirmou que levou a criança ao posto de saúde, mas não havia vaga para atendê-la. Neuza está grávida de seis meses e é mãe de um menino de 4 anos.
Segundo o pai, Laércio Gonçalves, 21, Jenifer estava com febre e apresentava "feridas em sua garganta", o que a impedia de comer. Por volta das 3h de anteontem, Jenifer chegou morta ao hospital da Missão Evangélica Caiuá.
Rosivaldo foi internado quarta-feira no mesmo hospital. "O médico dizia que ele iria receber alta. Mas as enfermeiras começaram a furar as veias dele. Saiu muito sangue. As enfermeiras mataram meu filho", afirmou Luzinete.
"Ela tem que colocar a culpa [pela morte do menino] em alguém", afirmou o médico Franklin Sayão. Segundo ele, o fato de a criança ter paralisia infantil agravou o estado de saúde.
O diretor nacional de Saúde Indígena da Fundação Nacional de Saúde, Alexandre Padilha, afirma que quatro médicos garantem bem o atendimento a uma população de 11 mil índios das aldeias, mas vai enviar mais três.
O diretor anunciou ainda que ficará, a partir de hoje, por tempo indeterminado em Dourados coordenando o trabalho de assistência aos índios.

Pais enterram filha com ritual guarani em MS
Da Agência Folha, em Dourados

O índio caiuá rezador Agemiro Lopez, 55, vai balançando o chocalho e cantando em guarani na estrada de terra, margeada por matagal e por plantações secas de milho ou mandioca. Na frente dele, quatro mulheres seguram o pequeno caixão branco onde está Jenifer -que, com um ano e três meses, morreu de desnutrição anteontem, em Dourados (MS).
"Tem que pegar [as alças do caixão] alguém estranho. O pai e a mãe não podem", afirmou Lopes, sem explicar o motivo. O pequeno cortejo de menos de 20 índios saiu às 8h da aldeia Bororó, onde Jenifer era velada, rumo ao cemitério, localizado a 2 km.
Lopez não traduz o que diz em guarani. Ele afirma que canta para "os passarinhos levantarem outra vez do corpo da menina". Segundo ele, quando esses pássaros ficam em silêncio, a criança morre.
Jenifer foi enterrada por volta das 9h de ontem em um dos cinco cemitérios da aldeia Bororó.
O caixão de Rosivaldo Barbosa, de um ano e 11 meses, estava numa casa do outro lado da aldeia, sob uma árvore, velado por cinco crianças (seus primos), pela mãe, Luzinete, pela a avó e por uma tia. O pai, Emerson Vera Gonçalves, cavou a 1 km de distância a sepultura do filho, no mato. "Já foi um acontecido. A angústia acabou", disse Gonçalves.

FSP, 26/02/2005, Brasil, p. A14
 

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