De Povos Indígenas no Brasil
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Notícias

O faroeste brasileiro

27/02/2007

Fonte: OESP, Notas e Informações, p. A3



O faroeste brasileiro

O desmatamento desenfreado de matas nativas no sul do Maranhão, com a derrubada de jatobás, ipês, cedros e outras árvores centenárias, expõe em toda a sua inadmissível exuberância a ausência do Estado nessa região do País. Ali, nenhum braço do poder público se exibe procurando coibir a desbragada exploração ilegal de madeiras nobres. Na cara das autoridades, como mostra reportagem de Dida Sampaio, publicada no Estado de domingo, ex-trabalhadores rurais, posseiros e grileiros invadem fazendas sem serem incomodados pela polícia. Fazendeiros inescrupulosos estimulam o desflorestamento de reservas ecológicas por aventureiros, sem que o Ibama faça qualquer coisa para contê-los. E tribos indígenas se tornam cúmplices de serrarias e madeireiras na afronta sistemática à legislação de proteção ambiental.

A ilegalidade campeia nessas terras arrasadas. Somente uma das fazendas, a Citema, localizada entre os municípios de Grajaú e Arame, a 500 quilômetros de São Luís, tem mais de 23 mil hectares - uma extensão superior à da cidade do Recife. Ao todo, são cerca de 3 mil pessoas, entre serradores, atravessadores e madeireiros, atuando no local. Um verdadeiro exército de predadores. A área, que pertence a uma construtora maranhense, começou a ser devastada há três anos e é um exemplo marcante do processo típico de destruição florestal que vem ocorrendo na Amazônia.

Primeiro, a mata nativa é derrubada sem contemplação por exploradores de madeiras nobres. Um simples madeireiro corta diariamente, em média, cinco árvores de mais de 30 anos e as vende por menos de R$ 170 cada uma. Uma vez processada, a tora é revendida por mais de R$ 1 mil pelas serrarias. Em seguida, vem o corte das árvores menos nobres pelos fornecedores de matéria-prima para carvoarias, que produzem o carvão vegetal que alimenta os fornos de siderúrgicas de ferro-gusa nos Estados do Maranhão e do Pará.

O que sobra são árvores queimadas, restos de toras apodrecidas e poucas espécies vegetais rasteiras. Com a floresta devastada, finalmente é a vez da empresa proprietária da área entrar com projeto de reflorestamento com eucalipto, fechando-se assim o ciclo destrutivo.

As autoridades não intervêm em nenhuma das etapas desse clamoroso processo de destruição da floresta. O superintendente da Polícia Federal no Maranhão, Gustavo Ferraz Gominho, alega não dispor de dinheiro e estrutura para coibir a ação criminosa de madeireiros, atravessadores e serrarias. Os patrulheiros da Polícia Rodoviária Federal se limitam a trabalhar de dia e apenas nas rodovias principais, o que permite aos caminhões carregados de toras extraídas ilegalmente trafegarem livremente durante a noite.

E o escritório do Ibama, que está a apenas 200 quilômetros da área devastada, conta com somente dois técnicos em atividade - um terceiro está afastado por motivo de doença. Eles alegam que falta dinheiro para combustível e que as verbas pedidas para que possam deslocar a "equipe" aos locais do desmatamento jamais são liberadas. Por ironia, a cúpula do órgão, em Brasília, dispõe de imagens de satélite mostrando as áreas mais atingidas pelo desflorestamento desenfreado no sul do Maranhão.

A situação não é diferente em terras indígenas. Não muito distante da Fazenda Citema, a comunidade Bela Vista, uma reserva situada próximo à BR-226, ocupada pelos índios guajajaras, também vem sendo desmatada criminosamente. Em troca da autorização para a entrada de grileiros, madeireiros, carvoeiros, serradores e até plantadores de maconha, os índios pedem dinheiro.

Os índios também proíbem a entrada da Polícia Militar na área, o que a tornou um refúgio para delinqüentes. Em 2006, os guajajaras puseram fogo numa viatura da Polícia Rodoviária Federal. "Aqui inexiste o poder público. Tudo é feito como se fosse um faroeste. Com um pouco de dinheiro e mínimo de coragem, eles (índios, grileiros, madeireiros e bandidos) reinam", diz o padre Marcos Bassani, pároco de Grajaú.

Esse é o aspecto mais trágico do faroeste brasileiro. Embora disponha de uma legislação ambiental considerada moderna e severa, o País não conta com um Estado capaz de aplicá-la para valer impondo a presença do poder público nas áreas onde ele é mais necessário.

OESP, 27/02/2007, Espaço Aberto, p.A2
 

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