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Às vésperas de sediar COP30, Brasil vê resistência do Congresso a temas ambientais aumentar
18/03/2025
Fonte: O Globo - https://oglobo.globo.com/
Às vésperas de sediar COP30, Brasil vê resistência do Congresso a temas ambientais aumentar
Presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta e Davi Alcolumbre estão entre os parlamentares mais refratários à pauta
Luis Felipe Azevedo
18/03/2025
Sede da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP) neste ano, o Brasil tem, na legislatura atual, uma composição da Câmara dos Deputados menos alinhada às pautas ambientais do que a anterior. É o que mostra o Índice de Convergência Ambiental Total (Icat), produzido pela Virada Parlamentar Sustentável com base nas principais votações em plenário relacionadas ao tema em 2023 e 2024. Enquanto a média foi de 43% no período entre 2018 e 2022, o índice caiu para 29,1% no mandato atual - valor inferior aos 42% previstos pelos pesquisadores logo após o resultado da eleição passada, em 2022.
A Virada Parlamentar Sustentável é coordenada pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) em parceria com a Rede de Advocacy Colaborativo (RAC) e mais de 60 ONGs. O Icat é produzido a partir da comparação do voto de cada deputado e senador com o posicionamento do líder da Frente Parlamentar Ambientalista, hoje comandada por Nilton Tatto (PT-SP)
A chegada do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) à presidência da Câmara reforça o movimento de afastamento da Casa das ideias ambientalistas. Com média de 8%, Motta teve a atuação como parlamentar classificada como "péssima". Entre as pautas em que o deputado teve voto contrário ao do líder da Frente estão os projetos de lei que tratam sobre o marco temporal da ocupação de terras por povos indígenas e o que reconhece a rodovia BR-319 como "infraestrutura crítica, indispensável à segurança nacional".
Com cerca de 900 quilômetros de extensão, a estrada conecta Manaus, no coração da Floresta Amazônica, a Porto Velho, no "arco do desmatamento". Ambientalistas avaliam que, caso o trecho do meio da via seja repavimentado, como defende o governo estadual e parlamentares alinhados ao agronegócio, há risco de destruição da biodiversidade em uma das áreas mais bem preservadas do bioma.
No Senado, a convergência ambiental na atual legislatura é ainda menor: 25,49%. Novo presidente da Casa, o senador Davi Alcolumbre (União) marca 0% no Icat. Assim como Motta, o parlamentar se posicionou de maneira divergente em relação ao presidente da Frente Ambientalista na votação que tratou sobre o marco temporal.
Dos 81 senadores, mais da metade (47) têm, assim como Alcolumbre, a pontuação de 0% no Icat. Se somados os parlamentares com índice considerado "péssimo" (até 25%), o número chega a 55 e ultrapassa os dois terços da composição da Casa. O cenário é similar na Câmara, onde 66,2% dos deputados estão na categoria mais baixa da avaliação.
Para Marcos Woortmann, cientista político e diretor adjunto do IDS, a pauta ambiental "foi sequestrada pela polarização". O pesquisador avalia também que "há uma miopia de parlamentares de centro e da direita sobre o tema".
- As pautas ambientais seguirão tendo opositores à frente do Senado e da Câmara dos Deputados. O cenário é muito problemático, porque as Casas estarão à frente de alguns dos mais importantes debates ambientais que marcarão as próximas décadas, a partir das decisões legislativas que serão tomadas. Temos hoje um Congresso virado de costas para a realidade - pontua Woortmann.
Os partidos de Alcolumbre e Motta estão entre as siglas com menor pontuação no Icat em ambas as Casas Legislativas. O União Brasil tem 15,68% de convergência ambiental na Câmara e 7,5% no Senado. Já o Republicanos aparece com 14,10% e 4,17%, respectivamente. Na média das duas Casas, as legendas do Centrão só estão posicionadas acima do PL, sigla da direita com mais assentos no parlamento, do Novo e do PSDB.
No campo da esquerda, o PSOL lidera o índice na Câmara, com 98,9% de convergência ambiental. O PT de Lula, por sua vez, é a sigla com melhor resultado no Senado: 78,54%. Nomes do partido como o deputado federal Lindbergh Farias (88%) e o senador Fabio Contarato (83%) têm uma atuação mais alinhada ao ambientalismo do que a média da legenda.
No entanto, não é apenas o posicionamento de partidos de direita e de centro que preocupa ambientalistas. O movimento recente do presidente Lula para se aproximar de Alcolumbre - o senador é apontado, por exemplo, como um dos principais fiadores da guinada no Planalto a favor da pesquisa para exploração de petróleo na Margem Equatorial - é visto como uma contradição na gestão petista, que, ao mesmo tempo, se coloca como antagônica ao viés antiambiental observado no governo de Jair Bolsonaro (PL). Alcolumbre tem um desempenho no Icat inferior até mesmo ao do deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), líder da bancada ruralista, que soma 6% no índice.
Parlamentares do núcleo duro do ex-presidente, todos do PL, estão entre os nomes com menor convergência ambiental. Estão nessa lista os senadores Flávio Bolsonaro (0%) e Magno Malta (0%), além dos deputados federais Eduardo Bolsonaro (6%), Mario Frias (6%), Nikolas Ferreira (9%) e Ricardo Salles (17%), que foi ministro do Meio Ambiente na gestão de Bolsonaro. Com exceção de Nikolas, os parlamentares votaram favoravelmente em pauta ligado ao marco temporal. O deputado mineiro, por sua vez, se posicionou favorável ao projeto sobre a BR-319, assim como Motta.
Ao lado de Lula, Alcolumbre afirmou, durante viagem conjunta ao Amapá, no mês passado, que ninguém "pode impor nada" de preservação ambiental ao seu estado. A declaração ocorreu em meio aos debates dentro do governo sobre a intenção da Petrobras de atuar na região da Margem Equatorial no Amazonas. O petista chegou a afirmar que o Ibama "parece" jogar contra o país ao ficar em um "lenga-lenga" sobre a pauta.
Lula chegou a discutir, inclusive, a troca do presidente do órgão ambiental, Rodrigo Agostinho, para destravar a pesquisa - criticada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Na semana passada, Agostinho afirmou que "não tem condições" de afirmar se a decisão dele sobre a licença sai ainda no mês de março. Em outra sinalização a favor do investimento em energias não renováveis, o Brasil aceitou o convite para ingressar no fórum da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep+) em fevereiro.
Ambientalistas ouvidos pelo GLOBO avaliam a existência de uma "ruptura com o compromisso ambiental" do governo, às vésperas da COP30, a ser sediada em Belém (PA) em novembro. O investimento na indústria de petróleo, segundo os pesquisadores, desrespeita acordos internacionais de descarbonização e contribui para o aquecimento global. Antes da mudança de tom recente, Lula chegou a defender na COP28, em Dubai, que era "hora de enfrentar o debate sobre o ritmo lento da descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis".
- A exploração de petróleo na Margem Equatorial e na bacia Amazônica é economicamente inviável, pois ocorreria em um momento em que o mundo caminha para abandonar o petróleo como fonte energética, impulsionado pelo agravamento da crise climática. Além disso, essas explorações ameaçam territórios habitados por povos tradicionais e ecossistemas de alta biodiversidade - afirma Lucas Ferrante, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
O posicionamento de Lula é contestado abertamente por membros da Frente Parlamentar Ambientalista, formada, em sua maioria, por integrantes da base do governo. Para o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), o apoio do petista ao avanço da pesquisa na Margem Equatorial faz com que ele "se aproxime" do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que reiterou a intenção de investir na exploração de petróleo nos EUA.
- Não dá para o Brasil, que tem diversidade fantástica, investir nessa energia não renovável. Até a pesquisa pode afetar o meio ambiente. Não é lenga-lenga. É cautela. É muito equivocado o Lula falar que o Ibama é contra o governo. A discussão vai seguir, e o presidente deve ouvir também as partes que são contra a iniciativa. Quem sabe ele se aproxime mais da Marina e do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, e não do Alcolumbre e do Trump - pontua Alencar, que aparece com 100% de convergência ambiental no Icat.
Já o deputado federal Nilton Tatto (PT-SP), atual coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, avalia que a aproximação de Lula com Alcolumbre "não muda o quadro difícil dos últimos dois anos", já que a gestão é de coalização e a maior parte do Congresso é composta por membros do Centrão.
- O presidente Lula precisa fazer uma coalizão para ter governabilidade. Temos clareza da importância da pauta ambiental do governo - pontua Tatto.
https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2025/03/18/as-vesperas-de-sediar-cop30-brasil-ve-resistencia-do-congresso-a-temas-ambientais-aumentar.ghtml
Presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta e Davi Alcolumbre estão entre os parlamentares mais refratários à pauta
Luis Felipe Azevedo
18/03/2025
Sede da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP) neste ano, o Brasil tem, na legislatura atual, uma composição da Câmara dos Deputados menos alinhada às pautas ambientais do que a anterior. É o que mostra o Índice de Convergência Ambiental Total (Icat), produzido pela Virada Parlamentar Sustentável com base nas principais votações em plenário relacionadas ao tema em 2023 e 2024. Enquanto a média foi de 43% no período entre 2018 e 2022, o índice caiu para 29,1% no mandato atual - valor inferior aos 42% previstos pelos pesquisadores logo após o resultado da eleição passada, em 2022.
A Virada Parlamentar Sustentável é coordenada pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) em parceria com a Rede de Advocacy Colaborativo (RAC) e mais de 60 ONGs. O Icat é produzido a partir da comparação do voto de cada deputado e senador com o posicionamento do líder da Frente Parlamentar Ambientalista, hoje comandada por Nilton Tatto (PT-SP)
A chegada do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) à presidência da Câmara reforça o movimento de afastamento da Casa das ideias ambientalistas. Com média de 8%, Motta teve a atuação como parlamentar classificada como "péssima". Entre as pautas em que o deputado teve voto contrário ao do líder da Frente estão os projetos de lei que tratam sobre o marco temporal da ocupação de terras por povos indígenas e o que reconhece a rodovia BR-319 como "infraestrutura crítica, indispensável à segurança nacional".
Com cerca de 900 quilômetros de extensão, a estrada conecta Manaus, no coração da Floresta Amazônica, a Porto Velho, no "arco do desmatamento". Ambientalistas avaliam que, caso o trecho do meio da via seja repavimentado, como defende o governo estadual e parlamentares alinhados ao agronegócio, há risco de destruição da biodiversidade em uma das áreas mais bem preservadas do bioma.
No Senado, a convergência ambiental na atual legislatura é ainda menor: 25,49%. Novo presidente da Casa, o senador Davi Alcolumbre (União) marca 0% no Icat. Assim como Motta, o parlamentar se posicionou de maneira divergente em relação ao presidente da Frente Ambientalista na votação que tratou sobre o marco temporal.
Dos 81 senadores, mais da metade (47) têm, assim como Alcolumbre, a pontuação de 0% no Icat. Se somados os parlamentares com índice considerado "péssimo" (até 25%), o número chega a 55 e ultrapassa os dois terços da composição da Casa. O cenário é similar na Câmara, onde 66,2% dos deputados estão na categoria mais baixa da avaliação.
Para Marcos Woortmann, cientista político e diretor adjunto do IDS, a pauta ambiental "foi sequestrada pela polarização". O pesquisador avalia também que "há uma miopia de parlamentares de centro e da direita sobre o tema".
- As pautas ambientais seguirão tendo opositores à frente do Senado e da Câmara dos Deputados. O cenário é muito problemático, porque as Casas estarão à frente de alguns dos mais importantes debates ambientais que marcarão as próximas décadas, a partir das decisões legislativas que serão tomadas. Temos hoje um Congresso virado de costas para a realidade - pontua Woortmann.
Os partidos de Alcolumbre e Motta estão entre as siglas com menor pontuação no Icat em ambas as Casas Legislativas. O União Brasil tem 15,68% de convergência ambiental na Câmara e 7,5% no Senado. Já o Republicanos aparece com 14,10% e 4,17%, respectivamente. Na média das duas Casas, as legendas do Centrão só estão posicionadas acima do PL, sigla da direita com mais assentos no parlamento, do Novo e do PSDB.
No campo da esquerda, o PSOL lidera o índice na Câmara, com 98,9% de convergência ambiental. O PT de Lula, por sua vez, é a sigla com melhor resultado no Senado: 78,54%. Nomes do partido como o deputado federal Lindbergh Farias (88%) e o senador Fabio Contarato (83%) têm uma atuação mais alinhada ao ambientalismo do que a média da legenda.
No entanto, não é apenas o posicionamento de partidos de direita e de centro que preocupa ambientalistas. O movimento recente do presidente Lula para se aproximar de Alcolumbre - o senador é apontado, por exemplo, como um dos principais fiadores da guinada no Planalto a favor da pesquisa para exploração de petróleo na Margem Equatorial - é visto como uma contradição na gestão petista, que, ao mesmo tempo, se coloca como antagônica ao viés antiambiental observado no governo de Jair Bolsonaro (PL). Alcolumbre tem um desempenho no Icat inferior até mesmo ao do deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), líder da bancada ruralista, que soma 6% no índice.
Parlamentares do núcleo duro do ex-presidente, todos do PL, estão entre os nomes com menor convergência ambiental. Estão nessa lista os senadores Flávio Bolsonaro (0%) e Magno Malta (0%), além dos deputados federais Eduardo Bolsonaro (6%), Mario Frias (6%), Nikolas Ferreira (9%) e Ricardo Salles (17%), que foi ministro do Meio Ambiente na gestão de Bolsonaro. Com exceção de Nikolas, os parlamentares votaram favoravelmente em pauta ligado ao marco temporal. O deputado mineiro, por sua vez, se posicionou favorável ao projeto sobre a BR-319, assim como Motta.
Ao lado de Lula, Alcolumbre afirmou, durante viagem conjunta ao Amapá, no mês passado, que ninguém "pode impor nada" de preservação ambiental ao seu estado. A declaração ocorreu em meio aos debates dentro do governo sobre a intenção da Petrobras de atuar na região da Margem Equatorial no Amazonas. O petista chegou a afirmar que o Ibama "parece" jogar contra o país ao ficar em um "lenga-lenga" sobre a pauta.
Lula chegou a discutir, inclusive, a troca do presidente do órgão ambiental, Rodrigo Agostinho, para destravar a pesquisa - criticada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Na semana passada, Agostinho afirmou que "não tem condições" de afirmar se a decisão dele sobre a licença sai ainda no mês de março. Em outra sinalização a favor do investimento em energias não renováveis, o Brasil aceitou o convite para ingressar no fórum da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep+) em fevereiro.
Ambientalistas ouvidos pelo GLOBO avaliam a existência de uma "ruptura com o compromisso ambiental" do governo, às vésperas da COP30, a ser sediada em Belém (PA) em novembro. O investimento na indústria de petróleo, segundo os pesquisadores, desrespeita acordos internacionais de descarbonização e contribui para o aquecimento global. Antes da mudança de tom recente, Lula chegou a defender na COP28, em Dubai, que era "hora de enfrentar o debate sobre o ritmo lento da descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis".
- A exploração de petróleo na Margem Equatorial e na bacia Amazônica é economicamente inviável, pois ocorreria em um momento em que o mundo caminha para abandonar o petróleo como fonte energética, impulsionado pelo agravamento da crise climática. Além disso, essas explorações ameaçam territórios habitados por povos tradicionais e ecossistemas de alta biodiversidade - afirma Lucas Ferrante, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
O posicionamento de Lula é contestado abertamente por membros da Frente Parlamentar Ambientalista, formada, em sua maioria, por integrantes da base do governo. Para o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), o apoio do petista ao avanço da pesquisa na Margem Equatorial faz com que ele "se aproxime" do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que reiterou a intenção de investir na exploração de petróleo nos EUA.
- Não dá para o Brasil, que tem diversidade fantástica, investir nessa energia não renovável. Até a pesquisa pode afetar o meio ambiente. Não é lenga-lenga. É cautela. É muito equivocado o Lula falar que o Ibama é contra o governo. A discussão vai seguir, e o presidente deve ouvir também as partes que são contra a iniciativa. Quem sabe ele se aproxime mais da Marina e do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, e não do Alcolumbre e do Trump - pontua Alencar, que aparece com 100% de convergência ambiental no Icat.
Já o deputado federal Nilton Tatto (PT-SP), atual coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, avalia que a aproximação de Lula com Alcolumbre "não muda o quadro difícil dos últimos dois anos", já que a gestão é de coalização e a maior parte do Congresso é composta por membros do Centrão.
- O presidente Lula precisa fazer uma coalizão para ter governabilidade. Temos clareza da importância da pauta ambiental do governo - pontua Tatto.
https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2025/03/18/as-vesperas-de-sediar-cop30-brasil-ve-resistencia-do-congresso-a-temas-ambientais-aumentar.ghtml
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