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Projeto apoiado por Alcolumbre flexibiliza controle ambiental e contraria decisões do STF

20/05/2025

Fonte: FSP - https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/



Projeto apoiado por Alcolumbre flexibiliza controle ambiental e contraria decisões do STF
Ruralistas dizem haver amparo em entendimentos da Corte sobre simplificações e restrições a direitos indígenas

20.mai.2025 às 8h00

João Gabriel
Brasília

O projeto de lei que flexibiliza e simplifica o licenciamento ambiental no Brasil, em trâmite no Senado, traz pelo menos três dispositivos que contrariam decisões do STF (Supremo Tribunal Federal).

Dentre eles está a LAC (Licenciamento por Adesão e Compromisso), centro da proposta, e também a dispensa de autorização para atividades ligadas à agropecuária e a limitação às Terras Indígenas e Territórios Quilombolas que devem ser considerados na análise de empreendimentos.

Como mostrou a Folha, Alcolumbre vê no projeto uma forma de pressionar a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que é contrária à exploração de petróleo na Foz do Amazonas -ele é grande interessado na atividade.

Tanto o presidente Lula (PT) quanto o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) defendem essa exploração.

A extração na Margem Equatorial, mostra reportagem da Folha, está entre as atividades que podem ser beneficiadas caso o projeto do licenciamento ambiental seja aprovado. A proposta também pode impulsionar o desmatamento no Brasil, incentivar a mineração e eliminar quase 20 milhões de áreas protegidas da análise ambiental das obras do Novo PAC.

A expectativa é que o texto seja analisado pelo plenário do Senado até quarta-feira (21). Se aprovado, ele volta à Câmara.

"Não tenho dúvida de que o Congresso vai corrigir até a votação final. Tem pontos muito preocupantes e que podem ensejar inclusive a inconstitucionalidade de todo o texto", afirma o presidente do Ibama (Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis), Rodrigo Agostinho.

O principal fiador do projeto é a bancada ruralista, que deve conseguir aprová-lo, aplicando mais uma derrota sobre Marina Silva.

A aprovação de uma lei em conflito com visões do Supremo não a invalida automaticamente, mas abre espaço para que ela seja contestada.

"Em caso de aprovação no Congresso, a gente vai se juntar a outras organizações que estão nesse front para judicializar", afirma Maíra Pankararu, coordenadora do departamento jurídico da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

Em geral, a lógica do projeto é simplificar e acelerar o licenciamento ambiental, ampliando possíveis punições. Um dos principais instrumentos para isso é a LAC.

Neste procedimento, o empreendedor recebe o aval para iniciar sua atividade por se comprometer a cumprir exigências ambientais previamente estabelecidas, sem passar por uma análise individualizada.

Estariam aptos a conseguir autorização por meio da LAC iniciativas de até médio porte e potencial poluente.

Duas vezes em 2020, porém, o STF entendeu que esse tipo de licença pode ser usado exclusivamente "para atividades e empreendimentos de pequeno potencial de impacto ambiental".

Na ocasião, o Supremo analisou a validade de LACs instituídas por estados. O projeto federaliza esse mecanismo.

A FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), representante da bancada ruralista, argumenta que há respaldo em posições da Corte.

"Nas ocasiões em que o STF tratou da matéria, deixou explicitado que é justamente a falta de lei federal geral de licenciamento que constitui fator de insegurança jurídica. Ou seja, a insegurança jurídica atualmente existente decorre diretamente do fato de não haver lei federal editada pelo Congresso", afirma a FPA.

Em outra ação, em 2022, o Supremo entendeu ser inconstitucional a emissão de licença ambiental sem análise humana.

O projeto também restringe as áreas protegidas que devem ser consideradas na análise ambiental apenas às Terras Indígenas homologadas (fase final da demarcação) e Territórios Quilombolas titulados (oficializados), excluindo processos de regularização em andamento.

Porém, quando julgou o Código Florestal, em 2018, a maioria do Supremo decidiu "declarar a inconstitucionalidade" de um dispositivo que criava exatamente esta mesma limitação.

A FPA argumenta que o projeto apenas traz para a lei o que já é uma prática consolidada, dando assim maior segurança jurídica sobre o tema.

Segundo dados do Incra (Instituto Nacional de Reforma Agrária), mais de 1.500 dos quase 2.000 processos de territórios quilombolas estão em andamento -e, portanto, seriam desconsiderados na análise ambiental, pela regra proposta.

Das mais de 800 Terras Indígenas do Brasil, 259 seriam ignoradas, segundo dados do ISA (Instituto Socioambiental).

O projeto também isenta do licenciamento ambiental atividades relacionadas à agropecuária extensiva e de pequeno impacto ambiental, mas em 2015 e 2020 o STF derrubou leis estaduais (no Tocantins e no Ceará) que iam nesta mesma direção.

"A atividade agropecuária é submetida às leis vigentes, como Código Florestal e legislação sanitária, que já determinam o cumprimento de uma série de condicionantes. Além disso, a dispensa de licenciamento não desobriga o cumprimento da legislação ambiental", diz a FPA.

Além de excluir do processo os territórios indígenas e quilombolas não completamente regularizados, o projeto também reduz a participação dos órgãos representativos, como Incra e Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), estabelecendo regras e prazos para a manifestação destes.

O Observatório do Clima elaborou um dossiê de mais de 100 páginas sobre o projeto, no qual vê uma brecha para que os órgãos ambientais publiquem licenças sem a concordância de seus pares representativos, ou até com a discordância destes.

Para o Observatório do Clima, essa possibilidade desrespeita o princípio da Constituição de proteção e garantia dos direitos das comunidades tradicionais.

"As manifestações técnicas da Funai, Incra ou outros órgãos com atribuições legais não são vinculantes, mas têm peso relevante na análise do processo e influenciam diretamente a decisão do órgão ambiental", rebate a FPA.

"O texto apenas define critérios técnicos de manifestação, sem retirar a participação dos órgãos envolvidos. A manifestação técnica permanece obrigatória nos casos em que houver impacto direto sobre territórios reconhecidos", completa.


https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2025/05/projeto-apoiado-por-alcolumbre-flexibiliza-controle-ambiental-e-contraria-decisoes-do-stf.shtml
 

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