De Povos Indígenas no Brasil

Notícias

Apoio aos índios da tribo Panará possibilita crescimento populacional

14/04/2004

Fonte: Setor 3



Apoio aos índios da tribo Panará possibilita crescimento populacional

Daniele Próspero

A luta pela garantia dos direitos indígenas e para o desenvolvimento de suas comunidades marca a história do Instituto Socioambiental e se mostra como um dos marcos de sua fundação. A organização não governamental foi constituída em 1994 por meio de uma fusão de diversas entidades que já tinham uma larga experiência na questão indígena, como o Núcleo de Direitos Indígenas, o Centro Ecumênico de Documentação e Formação, a antiga Fundação Mata Virgem, e o um grupo da Fundação SOS Mata Atlântica. Neste cenário, vários projetos passaram a ser constituídos voltados para esta parcela da população, ainda alvo de massacres, conflitos e interesses da classe dominante.
O instituto conta hoje com dois grandes programas indigenistas: o Programa Rio Negro e o Programa Xingu, que englobam diversos projetos locais. As ações realizadas se baseiam em quatro eixos principais: a proteção e fiscalização dos territórios, a formação de professores bilíngües, apoio a associações e manejo de recursos naturais. Todas as atividades são realizadas em conjunto com organizações indígenas. "Qualquer coisa que se faça de fora para dentro, sem ter uma relação orgânica com eles é coisa que se esvai rapidamente no tempo, não tem consistência. O que tem consistência é aquilo que eles acabam incorporando, assumindo e levando adianta pelas próprias mãos", comenta o diretor do ISA, Márcio Santilli.
Uma das ações desenvolvidas pelo Programa Xingu é o apoio aos índios Panará, tema da exposição "Panará, depois da volta dos índios gigantes", do fotógrafo Pedro Martinelli, no Memorial da América Latina, em São Paulo. Essa comunidade foi marcada por um processo brutal de contato com os brancos. Na década de 70, os índios perderam suas terras para a construção da BR-163, a Rodovia Cuiabá-Santarém, para ligar o Mato Grosso ao Pará e quase foram extintos, vítimas de doenças. Dos 400 indivíduos que eram em 1973, estavam reduzidos a 70, dois anos depois. Durante 20 anos permaneceram no Parque Indígena do Xingu, onde viveram em condições precárias.
Com a ajuda do ISA e de outras organizações, os índios resolveram lutar pelo seu território, quase todo destruído. Expedições realizadas no local descobriram uma área ainda intacta, às margens do Rio Iriri, na fronteira norte do Mato Grosso com o sul do Pará. Neste local, os Panará construíram uma nova aldeia, a Nãsepotiti, e começaram a se mudar para o local a partir de 1995. O instituto ajudou a elaborar ação de indenização contra a União e a Funai e, em setembro de 2000, os Panará ganharam o processo. A indenização foi entregue no final de julho de 2003.
Santilli aponta este caso com um modelo de sucesso, pois os índios estão conseguindo se recompor como povo. "É o exemplo de reversão da lógica colonial e do encontro de um caminho pelo qual cada povo indígena possa olhar para frente e trazer a sua contribuição ao país", aponta. Hoje, os Panará contam com 257 membros. Eles recebem apoio do ISA para a gestão financeira dos recursos da ação, no desenvolvimento de atividades como a apicultura, formação de viveiros, comercialização de artesanato e treinamento para a comercialização de sementes, como a do mogno.
Segundo André Villas-Bôas, coordenador do Programa Xingu, todas as ações visam criar condições para a sustentabilidade da comunidade no futuro, sendo projetos de médio a longo prazo. "Eles estão muito bem na gestão dos recursos e estão criando mecanismos para superar entraves que surgem e novas formas de se remanejar. Mas o processo é lento, pois é algo totalmente novo para eles. As coisas devem ser realizadas no ritmo deles", explica o indigenista, que acredita que a grande preocupação é o entorno, como o desmatamento das matas e dos rios, os conflitos externos, entre outros problemas locais.
Programas procuram desenvolver comunidades indígenas remanescentes
Desde 1995 o ISA desenvolve, em parceria com a Associação Terra Indígena Xingu (Atix), o Programa Xingu, que reúne uma série de projetos com comunidades do Parque Indígena do Xingu, localizado no norte do estado do Mato Grosso, além da Terra Indígena Panará. Atualmente, vivem no Parque cerca de 4 mil habitantes de 14 etnias - Kuikuro, Kalapalo, Matipu, Nahukuá, Mehinaku, Waurá, Aweti, Kamaiurá, Trumai, Yawalapiti, Suiá, Kaiabi, Ikpeng e Yudjá -, distribuídas em 40 aldeias, numa área de 2,8 milhões de hectares.
O programa reúne esforços em várias frentes de atuação, como o projeto de capacitação e fortalecimento da Atix e da Associação Yakiô Panará, que engloba acompanhamento, assessoria e formação dos integrantes das associações no planejamento e gestão das atividades por elas desenvolvidas. Já o Projeto de Manejo de Recursos Naturais e Desenvolvimento de Alternativas Econômicas Sustentáveis tem como principal objetivo ampliar a autonomia política e gerencial das comunidades na gestão econômica e cultural dos recursos naturais existentes.
As ações buscam trabalhar com a economia de subsistência, segurança alimentar e a caracterização e manejo participativo destes recursos. O projeto incentiva também a comercialização de produtos, sempre com agregação de valor ambiental e cultural, como o "mel dos índios do Xingu", o artesanato e óleos vegetais. Para preservar o conhecimento local e as técnicas tradicionais, o programa oferece formação de agentes indígenas de manejo de recursos naturais, do qual participam atualmente 27 agentes indígenas de quatro etnias da região norte do parque.
Na área educacional, o programa oferece formação de professores bilíngües dos 14 povos do parque. O projeto prepara e acompanha professores que já ensinam em quarenta escolas e atendem cerca de 1.358 alunos. A idéia é valorizar as línguas e culturas dos povos indígenas da região, relacionando-as com os conhecimentos científicos acadêmicos ocidentais e tendo em vista a profissionalização em áreas que contribuam para o desenvolvimento regional indígena sustentado. São ainda elaborados materiais didáticos em línguas indígenas e língua portuguesa.
Até o ano passado, foram realizados 19 cursos de formação de professores, sendo que 39 professores indígenas concluíram o Curso de Magistério. Dos formados, quatro foram incluídos na equipe pedagógica do projeto, lecionando como professores auxiliares para os professores novatos. Outros 19 professores xinguanos, formados em 2000, ingressaram no ano seguinte no Curso de Licenciatura de 3º Grau, promovido pela Universidade do Estado do Mato Grosso.
Amazônia
Outro campo de ação do Instituto Socioambiental é a Bacia do Rio Negro, a maior bacia de águas pretas do mundo e uma das mais importantes da Amazônia. O Programa Rio Negro pretende criar condições e colaborar para a implantação de um programa de desenvolvimento sustentável na região, que engloba 23 povos indígenas, a maioria da população. A parceira do ISA na região é a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), que reúne mais de 50 associações indígenas locais.
As atividades desenvolvidas na bacia são similares as do Programa Xingu, como proteção e sustentabilidade das terras demarcadas, segurança alimentar, geração de renda, educação escolar, saúde, fortalecimento organizacional e expressão e afirmação cultural. O projeto de educação e cultura atua por meio de três diferentes componentes: experiências escolares, valorização de línguas e culturas por meio de atividades educativas e oficinas de capacitação técnica.
O Programa de Manejo Sustentável também procura desenvolver e multiplicar modelos de aproveitamento de recursos agroflorestais e aquáticos aliando conhecimentos tradicionais e técnicos adaptados. As principais atividades implantadas em parceria com as associações são piscicultura e manejo agroflorestal nos altos rios Tiquié, Uaupés, Içana e no entorno da cidade de S. Gabriel da Cachoeira. De 1999 até ano passado, foram implantadas três estações de piscicultura e manejo agro-florestal. Algumas produções já conquistaram seu espaço no mercado, como a cestaria Baniwa, desenvolvida pela Organização Indígena da Bacia do Içana, filiada a Foirn, que é comercializada pela rede de lojas Tok Stok.
Luta pela causa ganha mais apoio
Na opinião do diretor do ISA, o segmento indigenista, formado pelas organizações de apoio, como é o caso do ISA, é ainda pequeno no contexto geral do Terceiro Setor, mas as organizações indígenas têm aumentado gradativamente nos últimos 15 anos. Santilli acredita que hoje existam cerca de mil organizações nesta causa, que representam aldeias, professores, agentes de saúde e determinados povos, terras ou regiões.
Mas, apesar das ONGs de apoio não serem um número expressivo no contexto geral, a questão indigenista passa a ter um novo grau de importância para todos os segmentos que atuam, por exemplo, com a proteção ao meio ambiente. "Percebe-se que as terras indígenas constituíram uma verdadeira barreira para a expansão do desmatamento. Nas regiões de maior pressão, elas são mais representativas e extensas do que as unidades de conservação ambiental. Hoje, está se valorizando a importância destas terras para a preservação da floresta e dos recursos naturais a longo prazo para o país. Isso permite a criação de novos espaços para outras alianças e parcerias", opina.

Serviço: Exposição: "Panará, depois da volta dos índios gigantes". Fotos: Pedro Martinelli
Data: até dia 16 de maio
Local: Pavilhão da Criatividade - Memorial da América Latina
Endereço: Av. Auto Soares de Moura Andrade, 664, portão 12, Barra Funda, São Paulo
Entrada gratuita
Site: www.memorial.org.br

Instituto Socioambiental - Endereço: Av. Higienópolis, 90, São Paulo, Cep: 01238-001-Telefone: (11) 3660-7949 - Fax: (11) 3660-7941- Site: http://www.socioambiental.org

Setor 3, 14/04/2004.
 

As notícias publicadas no site Povos Indígenas no Brasil são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos .Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.